A expressão "sem sal" remete a algo insosso e sem graça. Mas, se é verdade que esse nutriente deixa a comida mais saborosa, em excesso ele pode causar sérios problemas de saúde. Enquanto a associação do cloreto de sódio com males cardiovasculares está bem estabelecida, também há evidências científicas da sua associação com câncer, osteoporose e doença renal crônica. Recentemente, um estudo com dados de mais de 501 mil pessoas demonstrou uma relação estatística entre uma quantidade maior do nutriente à mesa com o risco de morte prematura (antes dos 75 anos) por qualquer causa.
A pesquisa foi publicada no European Heart Journal e conduzida pela Escola de Saúde Pública e Medicina Tropical da Universidade de Tulane, nos Estados Unidos. Os dados demonstraram que, em comparação às pessoas que nunca ou raramente adicionavam sal à comida — previamente temperada no preparo —, as que colocavam uma porção extra apresentaram risco 28% maior de morrer prematuramente. O professor Lu Qi, principal autor, alerta que, em termos populacionais, o hábito pode matar um em cada 100 pessoas na faixa dos 40 a 69 anos.
"Até onde eu sei, esse é o primeiro estudo a avaliar a associação entre a adição de sal aos alimentos e a morte prematura", ressalta Qi. "Os resultados fornecem novas evidências para apoiar as recomendações sobre modificação de comportamentos alimentares para melhorar a saúde. Mesmo uma redução modesta na ingestão de sódio, adicionando menos ou nenhum sal aos alimentos à mesa, provavelmente resultará em benefícios substanciais para a saúde", observa.
Os dados, coletados de um grande estudo populacional britânico, incluíram informações de 501.379 pessoas. Ao entrarem na pesquisa, entre 2006 e 2010, elas foram questionadas sobre a frequência da adição do sal à comida já temperada: nunca/raramente, às vezes ou sempre. Para determinar a influência específica do nutriente no risco de morte precoce, os pesquisadores ajustaram a análise, levando em conta fatores como idade, sexo, índice de massa corporal, tabagismo, ingestão de álcool, nível de atividade física, hábitos dietéticos e comorbidades, como diabetes, câncer e doenças cardiovasculares. Os voluntários foram acompanhados, em média, por nove anos.
Além de descobrir que adicionar sal aos alimentos estava associado a um risco maior de morte prematura por todas as causas e a uma redução na expectativa de vida (1,5 ano para homens e 2,28 anos para mulheres), os pesquisadores concluíram que ele tendia a ser ligeiramente reduzido em pessoas que consumiam as maiores quantidades de frutas e vegetais. "Não ficamos surpresos com essa descoberta, pois frutas e vegetais são as principais fontes de potássio, que tem efeitos protetores e está associado a um menor risco de morte prematura", diz Qi.
De acordo com o pesquisador, avaliar a ingestão geral de sódio é muito difícil, pois muitos alimentos, principalmente os pré-preparados e processados, têm altos níveis do elemento adicionados antes de chegarem à mesa. Os estudos que investigam a ingestão de sal por meio de exames de urina geralmente consideram apenas uma amostra e, de acordo com Qi, "não refletem necessariamente o comportamento usual".
Por isso, os cientistas optaram por verificar se as pessoas adicionavam ou não sal aos alimentos, independentemente de o tempero ter sido colocado durante o cozimento. "Na dieta ocidental, a adição de sal à mesa representa de 6% a 20% da ingestão total de sódio e fornece uma maneira única de avaliar a associação entre a ingestão habitual deste elemento e o risco de morte. Mas, como nosso estudo é o primeiro a relatar uma relação entre a adição de sal aos alimentos e a mortalidade, são necessárias mais análises para validar as descobertas antes de fazer recomendações", reconhece.
O estudo é observacional, ou seja, não faz uma relação entre causa e efeito. Contudo, diversas pesquisas encontraram a associação entre excesso de sal e riscos de danos à saúde. Uma delas, publicada na revista Archives of Internal Medicine, descobriu que pessoas em dietas ricas em sódio e com baixo teor de potássio têm uma probabilidade 20% maior de morrer por qualquer causa. Além disso, aquelas com a proporção mais alta de sódio para potássio na alimentação apresentam o dobro de risco de morrer por ataque cardíaco. "O sódio e o potássio estão intimamente próximos, mas têm efeitos contrários no organismo", esclarece o autor correspondente do estudo, Quanhe Yang, da divisão de prevenção de derrame e doença cardiológica dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos. "Ambos são nutrientes essenciais, que podem desempenhar papéis centrais na manutenção do balanço fisiológico e ambos já foram associados ao risco de doenças crônicas. O excesso de consumo de sal aumenta a pressão arterial, que pode levar a doenças cardiovasculares, enquanto o alto consumo de potássio pode ajudar a relaxar os vasos sanguíneos e a excretar o sódio, baixando a pressão."
Segundo Lu Qi, além da relação com doenças cardiovasculares, devido ao aumento da pressão arterial, o excesso de sódio já foi associado a outras alterações que podem levar ao desenvolvimento de enfermidades diversas. "Há muitos estudos sugerindo a relação entre o sal e a inflamação crônica e outros padrões que podem afetar o risco de câncer, como a promoção da proliferação de células", diz. Agora, ele pretende aprofundar as análises sobre a associação entre o ingrediente e vários males crônicos, como diabetes. Também está no foco do cientista um teste clínico para verificar se a redução do nutriente pode melhorar diversos aspectos da saúde.