As geleiras nas cordilheiras tropicais estão sofrendo um impacto das mudanças climáticas semelhante ao que ocorre no Polo Norte. Um estudo publicado na revista Nature é o primeiro a mostrar que os impactos dos gases de efeito estufa e de outros fatores associados à temperatura prejudicam essas grandes massas de gelo ao sul do globo, no mesmo ritmo que no hemisfério oposto. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores usaram depósitos sedimentares do Lago Junín, no alto dos Andes peruanos, criando um registro de mudanças glaciais que remontam a 700 mil anos.
"À medida que tentamos entender como o clima funciona em todo o mundo, precisamos de mais registros, além do Hemisfério Norte", diz Robert Hatfield, professor da Universidade da Flórida e um dos autores do estudo. Ele explica que muito do que os cientistas sabiam sobre as mudanças glaciais passadas veio de registros de crescimento e decaimento do gelo que ocorreram no Hemisfério Norte.
"O que torna nossas descobertas únicas é que fomos capazes de obter um registro contínuo e datado de forma independente da glaciação alpina tropical, pela primeira vez. A principal conclusão foi que os trópicos seguem a mesma batida e o mesmo ritmo do que está acontecendo no Hemisfério Norte", assinala Hatfield.
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Concentrações
Apesar das variações na radiação solar entre os dois hemisférios, o estudo mostrou que as alterações nas geleiras nas duas regiões ocorreram ao mesmo tempo. Isso sugere que o aumento das concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa associados às mudanças no volume das camadas de gelo do norte está influenciando todo o planeta simultaneamente.
"Quando as geleiras eram extensas no alto dos Andes, elas erodiam as montanhas ao seu redor, enviando sedimentos contidos na água do degelo para o Junín. Em tempos mais quentes, quando os grandes blocos gelados estavam ausentes, o carbonato foi depositado no lago", revela o pesquisador. Durante sete semanas, os cientistas recuperaram 100m de sedimentos da bacia lacustre. Com o material, eles passaram os próximos anos desenvolvendo um modelo de idade.
"Os cientistas sabem há quase um século que o aumento dos gases de efeito estufa afetará o clima em todos os cantos do mundo, mas temos menos certeza sobre a rapidez com que as mudanças no volume de gelo nos polos se propagarão para o resto do mundo", disse Christine Y. Chen, cientista do Laboratório Nacional Lawrence Livermore e coautora do artigo. "As montanhas de alta altitude nos trópicos estão essencialmente o mais longe possível dos pólos. Agora, mostramos que o gelo em ambas as regiões vem crescendo e decaindo de forma síncrona por quase um milhão de anos, o que destaca ainda mais a interconexão do nosso planeta."