Enquanto nós dormimos, seres microscópicos estão em frenética atividade nos folículos pilosos de nossos rostos e mamilos, e em nosso cílios. À noite, eles se movem de folículo em folículo, em busca de acasalamento. Nossa pele é o ambiente perfeito por fornecer alimento farto: eles comem o sebo liberado naturalmente pelas células. Ao contrário do que se supunha, esses animais invisíveis aos olhos humanos têm ânus. Essas e outras descobertas sobre os ácaros foram reveladas pelo primeiro sequenciamento genético da espécie Demodex follicurum, feito por cientistas da University of Reading e da Bangor University, no Reino Unido, com o auxílio da Universidade de Valencia (Espanha), da Universidade de Viena (Áustria) e da Universidade Nacional de San Juan (Porto Rico). O estudo foi publicado pela revista Molecular Biology and Evolution.
Professora de biologia dos invertebrados na universidade britânica e coautora da pesquisa, Alejandra Perotti explicou ao Correio a importância do sequenciamento. “Nós conseguimos compreender, com maior detalhe, ao desenterrar o DNA dos ácaros, como eles interagem com a espécie humana dia a dia. Por exemplo, agora sabemos que são bem ativos enquanto dormimos”, afirmou, em entrevista por e-mail.
Segundo Perotti, a conclusão mais importante do estudo diz respeito à sincronização entre ácaros e o homem. “Eles parecem estar usando nossa melatonina, e não podem produzir a sua própria. Isso permite que sejam ativos e se reproduzam durante o nosso sono. O hormônio é secretado ao entardecer pela pele e nos faz dormir. Em pequenos animais, como os ácaros, o efeito é exatamente o contrário”, observou a especialista.
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Adaptação
Ainda de acordo com Perotti, a pesquisa mostrou que os ácaros não têm proteção contra raios ultravioletas. “Isso porque eles de adaptaram para ficarem dentro de nossos poros, durante a luz solar. São os animais com o menor número de genes de proteínas, com um genoma muito reduzido”, acrescentou. Isolados dentro de nossos poros, esses seres não se expõem a ameaças externas, nem precisam competir para infestar o hospedeiro. Por isso, se tonaram organismos extremamente simples, dotados de pernas minúsculas abastecidas por apenas três músculos de células únicas.
Os cientistas descobriram também que um dos genes dos ácaros se inverteu. A adaptação lhes deu um arranjo particular de apêndices bucais mais salientes para coletar animais. Esses animais têm muito mais células em idades mais jovens em comparação com aqueles em estágio adulto — o que contraria a suposição anterior de que parasitas reduzem o número de células no início de seu desenvolvimento. “Os ácaros foram culpados por muitas coisas. A longa associação com humanos pode sugerir que eles também podem ter papéis benéficos simples, mas importantes, por exemplo, em manter os poros do nosso rosto desobstruídos”, declarou Henk Braig, também coautor da pesquisa, ao site Eureka Alert.