ASTRONOMIA

Sagitário A*: conheça o buraco negro localizado no centro da Via Láctea

Consórcio de cientistas faz o registro inédito da silhueta de um buraco negro supermassivo localizado no centro da Via Láctea

Pela primeira vez, astrônomos conseguiram fotografar um buraco negro supermassivo localizado no coração da Via Láctea. Batizado de Sagitário A*, esse objeto apresenta uma massa equivalente a 4 milhões de estrelas do tamanho do Sol e está a cerca de 26 mil anos-luz da Terra. A imagem histórica foi apresentada, ontem, em várias conferências de imprensa simultâneas. Também está detalhada em seis estudos científicos publicados na revista especializada Antrophysical Journal. Com base nas descobertas, especialistas acreditam que mais segredos espaciais poderão ser revelados.

A equipe internacional que detalhou a estrutura de Sagitário A* faz parte do projeto Event Horizon Telescope (EHT), composto por mais de 300 cientistas de 80 institutos. Há três anos, o mesmo grupo conseguiu capturar imagens de outro buraco negro supermassivo, o M87*, com massa equivalente a 6 bilhões de estrelas como o Sol e localizado a 55 milhões de anos-luz de distância. Apesar do uso da mesma técnica, a descoberta recente gerou mais trabalho, já que a nova região cósmica é muito menor e está rodeada por nuvens de poeira.

Tecnicamente, um buraco negro não pode ser examinado diretamente, já que o objeto é tão denso e sua atração gravitacional é tão poderosa que nem mesmo a luz pode escapar de sua força de atração. Mas é possível detectar a matéria que circula ao seu redor, antes de ser engolida. "É como se você quisesse tirar uma foto nítida de um cachorro que quer pegar seu rabo", ilustra, em comunicado, Chi-Kwan Chan, pesquisador na Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, e um dos responsáveis pelo trabalho.

A busca pelas imagens inéditas teve início em 2017 e contou com oito telescópios, que precisaram trabalhar na mesma sintonia para aproveitar uma brecha de apenas 12 minutos, período em que a nuvem de gás que envolve Sagitário A* dá uma volta completa e se afasta, revelando a silhueta do buraco negro. Em conjunto, os aparelhos formaram um telescópio virtual do tamanho da Terra. "Foi preciso que todos esses equipamentos capturassem a mesma frente de onda de luz", explica, em nota, Antxón Alberdi, do Instituto de Astrofísica de Andalucía, na Espanha, e integrante do consórcio de cientistas.

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Leis da física

A partir dos dados, os investigadores conseguiram comparar a estrutura de M87* e Sagitário A* e, por meio de uma série de cálculos, constataram que eles se comportam de maneira semelhante. Os cientistas acreditam que isso prova que os mesmos princípios da física operam no coração de dois sistemas de tamanhos muito diferentes. "Temos dois tipos completamente diferentes de galáxias e duas massas muito diferentes de buracos negros, mas, quando você os examina mais a fundo, eles são notavelmente parecidos", diz Sera Markoff, copresidente do Conselho de Ciência do EHT, astrofísica na Universidade de Amsterdam, na Alemanha, e uma das autoras do estudo.

Elcio Abdalla, professor de Física da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do BINGO, projeto de construção do radiotelescópio brasileiro, avalia que o projeto internacional conseguiu dados notáveis graças a um trabalho de anos de pesquisa e aos avanços tecnológicos. "Basicamente, esses cientistas usaram equações de Einstein e analisaram as órbitas de estrelas ao redor do candidato a buraco negro. Após os cálculos, verificaram que estavam corretos. A observação de tudo isso é um problema técnico difícil, e as tecnologias andam a par dos passos da ciência nesses casos. Certamente, não se poderia fazer essas observações muitos anos atrás. A tecnologia tem avançado muito", afirma.

Novas descobertas

A próxima questão a ser respondida é o que está dentro da escuridão do buraco. Os pesquisadores responsáveis pelo estudo esperam também, como novas investigações, desvendar quem surgiu primeiro: as galáxias ou os buracos negros, uma dúvida antiga dentro da astronomia. Abdalla acredita que respostas a esses e outros mistérios da área poderão surgir. "Deveremos, através de outras observações, tirar conclusões sobre matéria e energia escuras. Sabendo mais sobre o Universo, podemos contemplar mais detalhes da Terra", justifica.

O especialista da USP enfatiza, também, que revelar mistérios do Universo é uma tarefa árdua e vagarosa, mas que rende resultados importantes. "Claro que isso ficará para gerações que ainda não nasceram. Mas sem um início, não chegaremos a esse ponto. A ciência nos ensina a compartilhar com os outros e com gerações que ainda nem estão aqui."

Décadas de espera

Há suspeitas sobre a existência de Sagittarius A* desde 1974, quando uma fonte de rádio incomum foi detectada no centro da galáxia pelo americano Robert Brown. Mas foi apenas na década de 1990 que os astrônomos Reinhard Genzel, da Alemanha, e Andrea Ghez, dos EUA, confirmaram a presença do buraco negro, o que rendeu um Prêmio Nobel de Física em 2020 à dupla. A imagem que foi revelada ontem representa a primeira prova visual desse objeto.

Não é uma foto

“Temos que ter em mente a diferença entre foto e imagem. Essa não é uma fotografia. É uma representação visual de um conjunto de dados de rádio. Não é resultado de luz visível nem de um dispositivo óptico. Esse resultado surgiu graças a combinação de várias antenas em diversas partes da Terra, como se fosse uma única antena colossal. Na verdade, não se pode ver esse elemento cósmico: as manchas claras são material estelar que emite radiação pouco antes de entrar no chamado horizonte de eventos, a partir daí nada mais escapa do buraco negro. A vantagem desse tipo de imagem é sua alta resolução. Sagitário A* é uma extensa fonte de rádio bem conhecida dos astrofísicos, mas essa técnica permitiu ver detalhes que nenhum instrumento até hoje conseguiu.”

Naelton Mendes de Araújo, astrônomo e professor da Fundação Planetário do Rio de Janeiro (RJ)

Plantas crescem em solo lunar

O solo da Lua é fértil, mostram cientistas dos Estados Unidos. Em um experimento laboratorial, aqui na Terra, eles conseguiram cultivar plantas em amostras do solo lunar colhidas nas missões Apollo 11, 12 e 17. O estudo pioneiro também investigou como as plantas respondem biologicamente a esse habitat inusitado. Detalhes do trabalho foram apresentados na revista Communications Biology.

No experimento, foram realizadas as funções básicas desse tipo de cultivo. A equipe plantou sementes no solo lunar, adicionou água e nutrientes e expôs o local à luz. Havia apenas 12g — cedidos pela Nasa — de solo para os testes. Apesar dessa dificuldade, os resultados foram positivos: quase todas as sementes usadas brotaram. "Ficamos maravilhados. Esses resultados nos mostram que o solo lunar não atrapalhou os hormônios e os sinais envolvidos na germinação das plantas", afirma, em comunicado, Anna-Lisa Paul, uma das autoras do estudo e pesquisadora da Universidade da Flórida.

Com o passar do tempo, porém, os pesquisadores observaram diferenças entre as plantas cultivadas em solo lunar e no da Terra (amostra de controle). Algumas plantas do primeiro grupo eram menores, cresceram mais lentamente ou apresentaram variações em sua forma. Todos esses sinais físicos indicam que elas estavam "trabalhando" para lidar com a composição química e estrutural do solo da Lua.

Lugar estressor

O fenômeno foi confirmado quando os pesquisadores analisaram os padrões de expressão gênica dessas plantas. "No nível genético, elas estavam ativando as ferramentas normalmente usadas para lidar com elementos agressores, como sal e metais ou estresse oxidativo. Isso nos mostrou que elas percebem o ambiente do solo lunar como um ambiente estressor", explica Paul.

A equipe planeja fazer testes no próprio satélite. "Para futuras missões espaciais mais longas, podemos usar a Lua como um ponto de auxílio aos astronautas. Faz sentido que queiramos usar o solo que já existe na região para cultivar plantas", diz Rob Ferl, também autor do estudo.