Uma das frutas mais consumidas pelos brasileiros, o tomate pode se tornar uma fonte poderosa de vitamina D. Por meio de edição genética, cientistas do Reino Unido transformaram um tomate simples em um fruto com níveis do nutriente equivalentes ao de dois ovos de tamanho médio. A técnica, ainda experimental, poderá ajudar a combater a carência do composto — um problema que acomete mais de 1 bilhão de pessoas no planeta — e enriquecer dietas baseadas em alimentos de origem vegetal.
"Os tomates enriquecidos (...) oferecem uma fonte vegetal muito necessária da vitamina do Sol. Essa é uma ótima notícia para as pessoas que adotam uma dieta rica em vegetais, vegetariana ou vegana e para o número crescente de pessoas em todo o mundo que sofrem com o problema de insuficiência de vitamina D", enfatiza, em nota, Jie Li, pesquisadora do John Innes Centre e líder do estudo, publicado na edição de ontem da revista Nature Plants.
Os autores do artigo explicam que as folhas dos tomates e os tomates verdes contêm, naturalmente, a provitamina D3, um dos blocos de construção da vitamina D3. Porém, a quantidade é baixa, e essa provitamina, também chamada de 7-desidrocolesterol (7-DHC), vai se perdendo à medida que a fruta amadurece. A técnica de edição de genes CRISPR-Cas9 foi usada justamente para fazer com que o 7-DHC também se acumulasse nas frutas maduras.
Para isso, o grupo britânico analisou pesquisas anteriores que mostraram a via bioquímica do 7-DHC na fruta e descobriram que a enzima Sl7-DR2 é responsável por convertê-lo em moléculas diversas, incluindo a vitamina D. A técnica de edição genética desligou essa enzima no tomate comum para que o 7-DHC passasse a se acumular no fruto. E deu certo: a tesoura genética aumentou o nível da provitamina tanto nas folhas quanto na fruta, e o 7-DHC se acumulou tanto na polpa quanto na casca dos tomates.
Em uma segunda etapa, os cientistas testaram se o 7-DHC nas plantas editadas poderia ser convertido em vitamina D3 pela exposição à luz UVB, o raio emitido pelo Sol que, em contato com a pele humana, faz naturalmente esse processo. O experimento mostrou que uma hora de exposição em folhas e frutas fatiadas foi suficiente para aumentar a quantidade do nutriente.
Após o tratamento com luz UVB para transformar o 7-DHC em vitamina D, um tomate continha níveis do nutriente equivalentes ao de dois ovos médios e ao de 28g de atum — que são fontes dietéticas recomendadas de vitamina D. Segundo o grupo, em tomates maduros, a quantidade do nutriente pode ser aumentada ainda mais durante a secagem ao Sol, quando ocorreria uma exposição mais prolongada aos raios UVB.
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Também as folhas
Coautora do estudo, Cathie Martin chama a atenção para o fato de a técnica melhorar as propriedades nutricionais das folhas do tomate, que geralmente são consideradas resíduos. Há a possibilidade, por exemplo, de usá-las para a fabricação de suplementos de vitamina D3 amigáveis aos veganos ou para a fortificação de alimentos.
"Não estamos apenas abordando um enorme problema de saúde, mas também ajudando os produtores, porque as folhas de tomate que atualmente são desperdiçadas podem ser usadas para fazer suplementos a partir das linhagens editadas por genes", enfatiza Martin. Os suplementos produzidos atualmente vêm da da lanolina, que é extraída da lã de ovelha, o que restringe o uso por veganos.
Embora a vitamina D seja criada pela exposição à luz solar, sua principal fonte são os alimentos, especialmente laticínios e carnes. O nutriente está relacionado a processos importantes para o funcionamento do corpo, como a regulação de cálcio, que é essencial para a mineralização dos ossos e dos dentes.
Estudos têm mostrado ligação entre a baixa taxa de vitamina D e uma maior vulnerabilidade a cânceres e demência, como o Alzheimer. "A pandemia de covid-19 ajudou a destacar a questão da insuficiência de vitamina D e seu impacto em nossa função imunológica e saúde geral", enfatiza Jie Li.
Segundo a pesquisadora, um tomate fortificado com edição genética é suficiente para obter entre 20% e 30% da vitamina D diária de que os humanos precisam. Além disso, a técnica não interferiu no crescimento, no desenvolvimento ou no rendimento das plantas. O sabor das frutas praticamente não foi alterado, garante Jie Le. E a expectativa do grupo britânico é turbinar outros alimentos que têm a mesma via bioquímica, como berinjela, batata e pimenta.
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