Segundo William Shakespeare, um dos poetas mais famosos da história, manter lembranças é uma tarefa fácil para a memória humana. Esquecer, porém, se torna difícil para "quem tem coração". A citação do escritor inglês pode ser usada para explicar os desafios enfrentados pelas pessoas que sofrem com o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), um problema de saúde em que recordações traumáticas nunca vão embora. Pesquisadores têm se dedicado a estudos focados em melhores formas de lidar com essa complicação. Uma das frentes que têm avançado é a voltada para o desenvolvimento de novas técnicas de diagnóstico.
Geralmente, os testes de identificação do TEPT são feitos por meio de um questionário composto por perguntas relacionadas ao passado do paciente. Apesar de eficaz, o método, segundo profissionais da área, pode ser melhorado. "As escalas atuais avaliam os efeitos mais comumente conhecidos da exposição ao estresse traumático. Isso limita a avaliação do paciente e pode levar a diagnósticos errados e a tratamento ineficaz", explica Aviva Goral, pesquisadora da Escola de Saúde Pública da Universidade de Negev, em Israel. "Nossa pesquisa foi conduzida para abordar essa lacuna desenvolvendo uma ferramenta de avaliação abrangente, chamada Escala de Resposta ao Estresse Traumático Contínuo (CTSR)", conta.
A CTSR tem um número maior de questões, que não estão relacionadas apenas às lembranças traumáticas, tentando, dessa forma, acessar mais detalhes sobre a saúde mental do paciente. Goral e sua equipe testaram os dois métodos — o tradicional e o experimental — em um grupo de 313 adultos. Parte dos voluntários havia sido exposta a ameaças contínuas à segurança entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, na Faixa de Gaza. A outra parcela não tinha passado por uma experiência do tipo. Ao comparar os resultados, a equipe descobriu que a CTSR revelou dados mais ricos relacionados ao trauma, como níveis de desconfiança, exaustão mental, retraimento social, sensação de vazio, desesperança, estranhamento e sensação de estar constantemente ameaçado.
Os cientistas avaliam que os resultados obtidos podem contribuir para o desenvolvimento de melhores abordagens contra o TEPT, tanto no diagnóstico do transtorno quanto na escolha de terapias. "Esse estudo e a ferramenta de diagnóstico que ele produz poderiam beneficiar Israel e pessoas ao redor do mundo que sofrem de traumas contínuos e sintomas relacionados. Também podemos indicar ao paciente com retraimento social maior que participe de atendimentos psicológicos em grupo, por exemplo, para tratar essa limitação", afirma Doug Seserman. Segundo o coautor do estudo, novas pesquisas estão em andamento com um número maior de voluntários e em populações mais amplas.
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Outra alternativa, que pode ajudar no diagnóstico do TEPT com mais acurácia, é a divisão do transtorno em subgrupos. A estratégia é defendida por cientistas americanos. "Um grande obstáculo na compreensão e no tratamento do TEPT é sua heterogeneidade clínica e neurobiológica. A fim de melhor tratar a condição e abordar essa barreira, muitos pesquisadores, como nós, têm buscado identificar subtipos dessa enfermidade com base na disfunção em redes neurais específicas", explica Audreyana Jagger-Rickels, pesquisadora do Laboratório de Atenção e Aprendizagem de Boston, nos Estados Unidos.
Jagger-Rickels e colegas submeteram 271 veteranos de guerra dos EUA a exames de ressonância magnética, além de testes que mediram o nível do transtorno e o funcionamento cognitivo (neuropsicológico). Os resultados mostram que os veteranos com um quadro mais grave do transtorno apresentaram alta interrupção na comunicação entre duas redes do cérebro: a de controle cognitivo e a de processamento emocional. "Graças a uma combinação de assinaturas cognitivas e cerebrais, esse estudo fornece evidências preliminares para um subtipo 'neurocognitivo' de TEPT", diz Michael Esterman, também autor do estudo.
Os pesquisadores esperam que os resultados ajudem a identificar indivíduos que poderão se beneficiar de tratamentos específicos para o TEPT e também levem a novos tratamentos. "O nosso principal objetivo é diagnosticar e tratar um indivíduo com base no seu perfil clínico e biológico, em vez de simplesmente usar um diagnóstico geral e extremamente amplo", afirma Esterman. "Esses pacientes podem responder melhor a estratégias de tratamento específicas e também encontrar dificuldade em se envolver em terapias que requerem altos níveis de regulação emocional e funcionamento executivo. Podemos, com base nesses dados, direcioná-los para o melhor caminho", acrescenta.