A idade biológica de um ser humano é contabilizada com base em mudanças identificadas em seu organismo — como alterações no DNA e inflamações — e não apenas pelo passar dos anos, o que ocorre com a idade cronológica. Esse desgaste do corpo se tornou um tema bastante estudado por cientistas, que buscam formas de contorná-lo e, dessa forma, impedir o surgimento de algumas enfermidades relacionadas ao envelhecimento. Pesquisas recentes mostram que mudanças na alimentação, melhora do sono, realização de exercícios físicos, além de alterações na microbiota do intestino, podem ajudar nessa tarefa. Há ainda indícios de que se achar mais velho pode estar relacionado a ter um organismo mais abatido fisiologicamente.
“A idade avançada é o maior fator de risco para a deficiência mental e a física e para muitas doenças não transmissíveis, incluindo câncer, neurodegeneração, diabetes tipo 2 e enfermidades cardiovasculares. Estudar o envelhecimento biológico, que chamamos também de epigenético, pode nos ajudar a lutar melhor contra esses problemas de saúde”, enfatiza, em comunicado, Kara Fitzgerald, pesquisadora do Instituto de Medicina Funcional, nos EUA, e líder do estudo, divulgado na revista Aging.
Fitzgerald e sua equipe selecionaram um grupo de 43 homens adultos saudáveis, com idade entre 50 e 72 anos, que foram incluídos em um programa de tratamento de oito semanas. Todos os participantes fizeram atividades para melhorias na dieta (uso de probióticos e fitonutrientes) e na qualidade do sono, além da prática de exercícios físicos e relaxamento. Antes e depois do experimento, os cientistas contabilizaram a idade biológica dos participantes por meio da análise da saliva.
Ao comparar os dados, constatou-se que os participantes apresentaram redução da idade biológica em 3,23 anos, quando comparados ao grupo controle, que não foi submetido às intervenções. Os cientistas adiantam que mais pesquisas precisam ser feitas, em um número maior de pacientes , mas acreditam que as mudanças de dieta e de estilo de vida podem ser uma boa alternativa para reverter o envelhecimento epigenético. “Defendemos essas medidas. Elas parecem ser o caminho mais correto a ser seguido para reduzir os danos biológicos acumulados pelo corpo ao longo do tempo”, afirma Fitzgerald.
Para Agostinho Moreira, ginecologista com atuação em ciências da longevidade humana da clínica Viva Mais, em Brasília, os dados do trabalho americano são interessantes, pois mostram como um fator que passa despercebido durante o cotidiano pode ser extremamente prejudicial à saúde. “É interessante observar que os ganhos observados nesse estudo estão relacionados ao controle do estresse, pois é algo que obtemos com a melhora do sono, a realização de exercícios físicos e a reposição de nutrientes importantes”, pontua.
O especialista lembra que a influência do estilo de vida na genética tem se mostrado a melhor estratégia para prevenir problemas de saúde. “Após o estudo do genoma humano, as investigações nessa área cresceram bastante. Temos buscado conhecimento relacionado ao envelhecimento para que os seres humanos vivam mais e de forma mais saudável”, diz. “Esses resultados nos mostram como esses fatores externos interagem com os nossos genes. É o que reflete a redução da idade biológica vista pelos cientistas e o que também temos reforçado para nossos pacientes. Mudar a forma como você vive pode alterar o seu DNA e provocar outras atividades benéficas ao organismo, como a produção regular de hormônios importantes.”
Fator psicológico
O envelhecimento biológico também pode ser influenciado pela idade que uma pessoa acredita ter, segundo cientistas da França e dos EUA. “Em vários estudos, mostramos que uma idade subjetiva mais avançada está associada a sedentarismo, obesidade, risco de demência, hospitalização e mortalidade. Resolvemos, agora, avaliar se essa relação existe também com o envelhecimento epigenético”, conta ao Correio Antonio Terracciano, pesquisador da Universidade da Flórida, nos Estados Unidos, e um dos autores do artigo, publicado na revista Psychology and Aging.
Para a investigação, feita em parceria com especialistas da Universidade de MontPellier, na França, foram recrutados 2.253 adultos, com 30 a 70 anos, que responderam a um questionário com perguntas relacionadas à idade que eles acreditavam ter. Em seguida, os cientistas realizaram testes de análise do DNA e do perfil inflamatório a fim de avaliar a idade biológica dos participantes. A comparação dos dados mostrou que os indivíduos que se sentiam mais velhos do que a idade cronológica que tinham eram biologicamente mais velhos.
Antonio Terraciano pondera que mais pesquisas precisam ser conduzidas para entender os fatores relacionados à relação observada no estudo. Ele acredita que os dados atuais devem ser considerados por outros investigadores do tema. “Essa percepção pessoal de envelhecimento pode ter uma influência na idade biológica junto com fatores como condições socioeconômicas, comportamentos de saúde, características psicológicas e vulnerabilidades genéticas. Seria interessante incluir uma pergunta sobre a idade subjetiva em encontros médicos e observar o efeito das respostas dos pacientes com seus perfis clínicos”, sugere.
Vladimir Melo, psicólogo, avalia que a pesquisa internacional é interessante, apesar de não apontar para a raiz da ligação entre a percepção da idade e o envelhecimento epigenético. “O estudo confirma teorias antigas que associam o que pensamos e sentimos com manifestações somáticas, propondo uma interação entre esses fatores. Contudo, não afirma que um causa o outro”, justifica. Melo também acredita que os dados podem ser aprofundados em estudos futuros. “É interessante observar essa subjetividade influenciando processos físicos, e vice-versa. É um tema relevante. Sendo assim, seria algo muito válido verificar mais a fundo essa relação entre aspectos subjetivos e epigenéticos do envelhecimento.”