"Estar no Brasil neste momento parece estar preso no meio de um caótico campo de batalha, um cerco de 14 meses, sem ninguém no comando do seu lado das trincheiras", começa o artigo do neurocientista e pesquisador Miguel Nicolelis publicado pela revista Scientific American nesta sexta-feira (7/5). A revista, que é uma das maiores publicações sobre ciência do mundo e a mais prestigiada dos Estados Unidos, chegou a colocar o texto na manchete por algumas horas ao longo da manhã.
O neurocientista usou a metáfora "Fukushima biológica", em referência ao acidente nuclear que ocorreu no Japão em 2011, para falar do caos vivido no Brasil ao longo do primeiro semestre deste ano. O texto descreve como a situação do país pirou drasticamente em abril deste ano, chegando ao número recorde de 4.211 mortes em um único dia.
"Um tsunami tão constante de pacientes gravemente doentes levou a um colapso sem precedentes de todo o sistema de saúde do país e ao estabelecimento de mais um par de registros mundiais em termos de profissionais de saúde infectados e falecidos", afirmou o pesquisador.
Nicolelis falou ainda dos desafios que o país enfrenta ao ter que lidar com a variante P.1 do coronavírus, identificada pela primeira vez em Manaus. "Pelo menos 2,5 vezes mais transmissível que o vírus original, a variante P.1 deu o empurrão final para transformar a segunda onda em um verdadeiro tsunami que colocou o país inteiro de joelhos e desencadeou a maior e mais devastadora crise humanitária da história brasileira", relatou.
O cientista lembrou que novas variantes podem surgir e que prever os danos que elas causarão — tanto para o Brasil, quanto para os países vizinhos — é difícil. "E com um número tão explosivo de mutações ocorrendo em todo o Brasil, a oportunidade de fabricar todo tipo de variantes do vírus, incluindo as mais infecciosas e ainda mais letais, continua", escreveu.
Ele terminou argumentando que o governo brasileiro precisa ser advertido diante das atitudes que vem adotando durante a pandemia. "O governo brasileiro deveria ser severamente advertido que a falta de cooperação neste esforço global para controlar a pandemia poderia levar a um maior isolamento do país da comunidade internacional e até mesmo à imposição de duras sanções econômicas. Por mais que me custe escrever estas linhas sobre o país que tanto amo, não vejo outra maneira de lidar com um presidente e um governo que voluntariamente levou o Brasil à maior crise humanitária de toda a história do país, ignorando totalmente o enorme sofrimento que esta tragédia já impôs ao povo brasileiro. A mensagem de e para a comunidade internacional deve ser clara e forte: ou saímos disto juntos, ou não sairemos de forma alguma”, concluiu.