A "completa inépcia” do poder público em gerenciar a crise sanitária que pode levar a economia nacional a uma “crise sem precedentes”, avalia o neurocientista e pesquisador da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, Miguel Nicolelis. Em entrevista à jornalista Denise Rothenburg, no CB.Poder — parceria entre o Correio e a TV Brasília — desta quarta-feira (24/3), ele destacou o impacto negativo da postura do Brasil em relação à covid-19 para os negócios.
“Essa falta de controle da pandemia pode vir a ser um fator de comprometimento do comércio exterior de todos os produtos brasileiros, não só do agronegócio. Países que são os maiores parceiros (comerciais) brasileiros vão aumentar dramaticamente a fiscalização e a monitoração dos produtos que vêm do Brasil. E, se por acaso, algum tipo de contaminação for detectada, os bloqueios ou o bloqueio econômico que pode surgir como resultado, e vai ser extremamente prejudicial para o Brasil”, detalhou.
Morte de CNPJ
Em maio do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) liderou uma caminhada do Palácio do Planalto até o Supremo Tribunal Federal (STF) para interceder pelo afrouxamento das medidas restritivas adotadas pelos estados, municípios e Distrito Federal. Na época, Synésio Batista da Costa, da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), chegou a prever a “morte de CNPJ” caso o Brasil seguisse as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para Nicolelis, o contraste entre essas opiniões contrárias a um lockdown e a realidade provocada pelo alastramento da doença deve ficar evidente, em termos financeiros, em um futuro próximo. “A ironia da situação é que várias pessoas aqui no Brasil tentam usar a economia como justificativa para não fazer um combate apropriado da pandemia. No final, no frigir dos ovos, o descontrole completo da pandemia pode levar a economia, que é baseada na exportação de comodities nesse momento (produtos vendidos internacionalmente com o preço cotado em dólar, como grãos e minério), a uma crise sem precedentes”, detalhou.
Essa visão é corroborada por economistas e banqueiros que, nesta semana, enviaram uma carta ao Palácio do Planalto pedindo a implantação de novas medidas para o combate à pandemia da covid-19.
Medicamentos
Em resposta a uma espectadora, Miguel Nicolelis explicou que pesquisadores estudaram os remédios que compõem o chamado “kit covid”, mas os resultados foram negativos e os efeitos colaterais prejudicam a saúde de centenas de pessoas.
“Não existe eficácia comprovada para nenhuma dessas coisas, ivermectina, cloroquina... Pelo contrário. O que existe são pessoas que tomaram indevidamente esse medicamento que agora estão internadas precisando de transplante hepático porque fritaram seus fígados tomando doses tóxicas desses medicamentos sem nenhum critério e, agora, estão doentes, não pelo coronavírus, mas pelos efeitos colaterais”, enfatizou.