Depois da idade avançada, a deficiência intelectual (Leia Para saber mais) é o maior fator de risco de mortalidade em decorrência da covid-19, segundo mostra um estudo americano. No artigo, publicado na última edição da revista especializada New England Journal of Medicine, os investigadores revisaram dados médicos de mais de 120 mil indivíduos com esse tipo de limitação e observaram taxas maiores relacionadas à infecção pelo novo coronavírus e aos desdobramentos da doença, incluindo o óbito. De acordo com os pesquisadores, os resultados sinalizam a necessidade de ampliar os cuidados preventivos voltados a essa parcela da população.
“Investigações anteriores mostram que a expectativa de vida desses pacientes é inferior à da população em geral, mas essa questão ainda não é bem compreendida. Por causa dessas lacunas e do momento tão desafiador em que vivemos, fomos motivados a analisar os efeitos da pandemia nesse grupo”, relatam os autores do artigo.
Para isso, foram analisados dados de 547 instituições coletados entre janeiro de 2019 e novembro de 2020. Ao todo, os cientistas utilizaram registros de 64.858.460 indivíduos, dos quais 128.074 apresentavam alguma deficiência intelectual e 64.730.386 não tinham esse tipo de limitação, formando o grupo de controle.
O estudo mostrou que integrantes do primeiro grupo tinham 2,5 vezes mais risco de serem infectados pelo novo coronavírus, 2,7 vezes mais risco de serem internados no hospital e 5,9 vezes mais risco de morrerem por causa da infecção, considerando a população em geral.
As taxas também foram maiores quando os cientistas compararam os dados com os de pacientes que apresentavam comorbidades diversas. “Os riscos de morrer de covid-19 são maiores para pessoas com deficiência intelectual do que para aquelas com insuficiência cardíaca congestiva, doença renal ou pulmonar, entre outras. Apenas a idade avançada apontou um risco maior de óbito em nossas análises comparativas. Essa é uma percepção profunda que não tínhamos e que é muito importante para a comunidade médica”, enfatiza, em comunicado, Jonathan Gleason, médico e pesquisador da Universidade Thomas Jefferson, nos Estados Unidos.
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Os autores levantaram algumas hipóteses ligadas ao comportamento desses indivíduos com deficiência intelectual na tentativa de explicar as diferenças. Isso porque essa parcela da população costuma ter maior dificuldade para cumprir estratégias que reduzem o risco de infecção, como o uso constante de máscaras e o distanciamento social.
Apesar disso, os especialistas defendem que o tema precisa ser melhor estudado. “Mesmo antes da pandemia, os indivíduos com deficiência intelectual apresentavam um risco maior de sofrer com outros problemas de saúde, mas esse é um tema ainda pouco estudado. Precisamos entender melhor o perfil desse grupo específico”, afirma Gleason.
Segundo a equipe, a criação de um sistema de atendimento médico voltado especialmente para esse grupo é a melhor estratégia para cumprir esse objetivo. “Nosso fracasso em proteger esses pacientes profundamente vulneráveis é de partir o coração. Eu acredito que, se pudermos projetar ferramentas seguras e acessíveis, isso beneficiará a todos nós. Devemos refletir sobre por que falhamos com essa população e como podemos atendê-la melhor durante essa crise de saúde e no futuro”, afirma Wendy Ross, médica e pediatra da universidade americana.
No momento atual, de pandemia, os cientistas defendem que pessoas com deficiência intelectual façam parte do grupo prioritário das campanhas de vacinação. “Eu acredito que esses pacientes e seus cuidadores devem ir para a frente dessa fila, junto com os idosos. O risco alto de óbito que vimos no estudo é um ótimo argumento a ser usado para justificar essa mudança”, afirma Gleason.