Um levantamento do Conselho Federal de Farmácia (CFF), por meio da Consultoria IQVIA, aponta um crescimento de 17% nas vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor em 2020, quando comparado com 2019. O Distrito Federal ocupa a 22ª posição no ranking das unidades da Federação (veja tabela abaixo), com aumento de 13% no comércio de estabilizadores de humor. Em se tratando de anticonvulsivantes e antiepiléticos, a capital cai para o 26º lugar, com crescimento de apenas 5%. Além disso, os brasileiros nunca pesquisaram tanto na internet sobre ansiedade quanto em 2020.
Os primeiros 365 dias de pandemia no Brasil foram marcados pelo medo, incertezas, mudanças de rotina, isolamento social, que segundo o conselho, foram alguns dos fatores determinantes para a deterioração da saúde mental dos Brasileiros e a busca por drogas que amenizem os sintomas depressivos.
O Amazonas lidera com incremento de 29%. Na sequência, estão Ceará (29%) e Maranhão (27%). Entre 2018/2019 as vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor aumentaram 12%, e entre 2017/2018, 9%. A curva não deixa dúvidas de que as vendas dispararam no país no último ano. Em 15 estados, o crescimento foi ainda maior, beirando os 30% em algumas unidades da Federação. No Ceará, havia uma tendência de queda até 2019, mas as vendas ganharam impulso no ano da pandemia. Enquanto entre 2018 e 2019 foi registrado um aumento de 7%, no período de 2019 a 2020 a variação foi de 29%, três vezes maior.
Sergipe, conforme exposto no gráfico, registrou o dobro de aumento, com 12% entre 2018/2019 e 24% entre 2019/2020. Apesar de ser o 11º estado no ranking, com 23% de aumento no período de 2019/2020, no Amapá as vendas estão em queda, em comparação com o período de 2018/2019, quando houve aumento de 29%.
"Quando você olha para os 10 estados que lideram o ranking, você vai ver uma predominância dos estados no Norte e Nordeste. Isso não está aí à toa. Existe, muito provavelmente, uma relação que se estabelece entre as condições de acesso aos serviços de saúde, as condições epidemiológicas de disseminação do vírus, a estrutura de acesso ao serviço de saúde e as condições socioeconômicas das pessoas que vivem nessas regiões. Muitas delas são regiões que tem problemas sociais e econômicos crônicos. (...) A determinação social uma vez mais mostrando o seu impacto e o quanto que isso acaba influenciando na questão de saúde mental das pessoas numa situação de pandemia", observa Wellington Barros, consultor do CFF e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
O professor cita, ainda, que não é coincidência, por exemplo, o estado do Amazonas liderar o levantamento. “Manaus foi a capital brasileira que mais padeceu, mais sofreu com essa situação emergencial e de calamidade”, se referindo ao colapso dos hospitais na região devido à falta de oxigênio.
A pesquisa não leva em conta os medicamentos adquiridos por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
Medicação controlada
Considerando que os medicamentos são controlados, o aumento estaria relacionado a um crescimento no número de pacientes com adoecimento mental. E o grande desafio seria garantir o melhor custo-benefício dos tratamentos, com o diagnóstico correto pelo médico e o uso seguro e racional, acompanhado pelo farmacêutico. Porém, é preciso analisar outros aspectos. "Um deles é que vivemos em uma sociedade culturalmente marcada pela tendência à medicalização", comenta Barros.
Ele explica que há um comportamento das pessoas no ocidente, de frequentemente recorrer ao uso medicamentos para tentar sanar todo tipo condição decorrente do convívio societal como se tudo se reduzisse a um problema de saúde.
“Está claro que a quarentena expôs as pessoas a situações de estresse muito extremas, e também é evidente que essa condição pode, sim, ter efeitos sobre a saúde mental das pessoas, levando ao surgimento de quadros de depressão e ansiedade, por exemplo. Mas nem toda alteração no sono, nem todo sentimento de tristeza ou solidão, ou mesmo o estresse gerado pela exposição ao risco, no caso dos trabalhadores da saúde e das atividades essenciais, que não pararam durante a pandemia, constituem a priori um transtorno em saúde mental passível de ser tratado com um medicamento. E mesmo que haja uma indicação da ocorrência de sofrimento psíquico que caracterize um transtorno ou problema de saúde, isso não significa que será necessário, de imediato, o uso de algum medicamento. A abordagem mais segura e que implica em maior benefício, na maioria absoluta dos casos, terá que ser sempre ampliada, centrada nas pessoas e não nos medicamentos”.
Anticonvulsivantes
Também foi levantado o aumento das vendas de anticonvulsivantes e antiepiléticos, que foi ainda maior no país. Em 2020, houve um acréscimo de 12% nas vendas em comparação com 2019. O índice corresponde a 8 pontos porcentuais a mais do que o registrado no período de 2018 a 2019, de 4%. O crescimento no período anterior, de 2017 a 2018, foi de apenas 2%. Nos estados do Amazonas e da Bahia (que registrava tendência de queda) a variação foi de 25% e 21% respectivamente, entre 2019 e 2020. Porém, nestes dois casos, o agravante é que, em relação ao período anterior, 2018 a 2019, o aumento foi de 20 pontos porcentuais. Embora tenha registrado índice de 23% de crescimento nas vendas entre 2019 e 2020, o Amapá apresentou tendência à estabilização.
"Os medicamentos em questão são disponibilizados no mercado sob um rígido controle da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A venda é feita com apresentação de prescrição médica, retenção da primeira via da receita e mediante lançamento no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados, o SNGPC", explica o conselheiro federal de Farmácia pelo estado de Rondônia, Jardel Teixeira de Moura, que atua no varejo e tem observado, na ponta, o aumento das vendas. "De fato, há uma maior procura por esses medicamentos, principalmente entre jovens e idosos”, comenta o conselheiro, que é proprietário de farmácia em seu estado, que curiosamente foi o que registrou o menor aumento nas vendas.
Comportamento mundial
O aumento de problemas psiquiátricos em consequência da pandemia de covid-19 já era previsto não só no Brasil, mas em todo o mundo. Pesquisa online de março de 2020, realizada a partir de uma amostra de mais de mil pessoas nos Estados Unidos, apontou que 36% dos americanos sentiram que a nova pandemia de coronavírus estava tendo um sério impacto em sua saúde mental. Outras duas pesquisas feitas também pela internet com cerca de 2,4 mil indivíduos da China, em janeiro e fevereiro de 2020, descobriram que a depressão moderada a grave estava presente em 9 a 17% da população.
Com informações do Conselho Federal de Farmácia
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