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Câncer de mama ultrapassa o de pulmão e se torna o mais prevalente

Para especialistas, o aumento está associado a envelhecimento populacional, a mudanças no estilo de vida e ao acesso a métodos diagnósticos

Pela primeira vez desde que as estatísticas globais do câncer começaram a ser divulgadas, o tumor de mama feminino ultrapassou o de pulmão e, em 2020, foi o mais incidente em 159 de 185 países, inclusive no Brasil, com mais de 2,26 milhões de casos novos. Isso equivale a 11,7% dos diagnósticos oncológicos no ano passado. O relatório Cancer Statistics, produzido pela Sociedade Norte-Americana de Câncer (ACS) e pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (Iarc), também mostra que um em cada cinco homens e mulheres desenvolvem a doença em algum ponto da vida, e que um em cada oito deles e uma em 11 pacientes morrem em decorrência de algum tipo de tumor maligno.

Com significativas diferenças socioeconômicas, o câncer de pulmão é o que mais mata, com 18% das mortes pela doença associada a ele. O segundo tipo mais letal, em 2020, foi o de estômago, seguido pelo de mama feminino.

Os autores do relatório destacam que países onde as taxas do câncer de mama feminino são historicamente mais baixas estão aumentando a incidência. É o caso de Japão e Coreia do Sul. Na África, na América do Sul e em países asiáticos em desenvolvimento, há uma tendência de crescimento observada desde o início dos anos 2000.

“Mudanças dramáticas no estilo de vida e no ambiente tiveram um impacto na prevalência de fatores de risco de câncer de mama, como excesso de peso corporal, inatividade física, consumo de álcool, adiamento da gravidez, menos partos e menos amamentação”, observam os autores.

De acordo com Bruno Ferrari, oncologista do Grupo Oncoclínicas, a tendência é que a incidência continue aumentando. “A população está envelhecendo e a idade é, talvez, o principal fator de risco para uma pessoa desenvolver câncer, incluindo de mama”, assinala.

Detecção precoce

Ferrari destaca outro aspecto no aumento de casos: o acesso maior ao diagnóstico. “Não tanto nesse ano de pandemia, que foi um grande problema, pois tivemos uma queda enorme no número de diagnósticos”, diz, ressaltando a importância de se detectar o câncer o mais cedo possível. “Quanto mais precoce, mais chances de cura. E o movimento das mulheres de autocuidado, de buscar o diagnóstico, é muito intenso; um exemplo é a campanha mundial do outubro rosa.” O impacto da covid-19 não aparece, ainda, no relatório de 2020, pois o documento baseia-se em dados de 2017, 2018 e 2019.

A incidência do câncer de mama é maior em países com IDH alto (caso do Brasil) ou muito alto: chega a ser 88% maior, comparado aos mais pobres. O relatório credita essa grande diferença ao acesso ao diagnóstico. Com menos casos detectados, as nações em transição econômica têm as maiores taxas de mortalidade.

“Como o mau resultado nesses países é, em grande parte, atribuível ao diagnóstico no estágio final, os esforços para promover a detecção precoce, seguida de tratamento oportuno e apropriado, são urgentemente necessários por meio da implementação de diretrizes baseadas em evidências e estratificadas por recursos”, afirma Hyuna Sung principal autor do relatório e integrante da Sociedade Norte-Americana de Câncer.

De uma forma geral, o relatório projeta 28,4 milhões de novos casos de câncer em 2040, um aumento de 47% em relação ao documento divulgado ontem. Os autores alertam que a taxa crescente de incidência pode sobrecarregar os sistemas de saúde, se não for controlada. “A carga da incidência e mortalidade por câncer está crescendo rapidamente em todo o mundo e reflete o envelhecimento e o crescimento da população, bem como as mudanças na prevalência e distribuição dos principais fatores de risco para o câncer, vários dos quais estão associados ao desenvolvimento socioeconômico”, informa, em nota, Freddie Bray, chefe da Seção de Vigilância do Câncer do Iarc. Ele enfatiza a necessidade de diminuir a distância entre os países com alto IDH e as nações em transição.

Ranking

10 tipos mais incidentes e com maior número de óbitos

Número de novos casos / Número de mortes

Mama feminino 2.261.419 (11,7%) / 684.996 (6,9%)
Pulmão 2.206.771 (11,4%) / 1.796.144 (18%)
Próstata 1.414.259 (7,3%) / 375.304 (3,8%)
Pele não-melanoma 1.198.073 (6,2%) / 63.731 (0,6%)
Cólon 1.148.515 (6%) / 576.858 (5,8%)
Estômago 1.089.103 (5,6%) / 768.793 (7,7%)
Fígado 905.677 (4,7%) / 830.180 (8,3%)
Reto 732.201 (3,8%) / 339.022(3,4%)
Colo do útero 604.127 (3,1%) / 341.831 (3,4%)
Esôfago 604.100 (3,1%) / 544.076 (5,5%)

Fonte: American Cancer Society

Sobrevida reduzida

Os dados do relatório Cancer Statistics, produzido pela Sociedade Norte-Americana de Câncer (ACS) e pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (Iarc), mostram que o câncer de pulmão continua sendo a principal causa de morte pela doença, com uma estimativa de 1,8 milhão de óbitos anuais. As taxas de mortalidade por esse tipo de tumor são três a quatro vezes mais altas em países com economia em transição, comparadas às nações com índice de desenvolvimento (IDH) alto e muito alto.

A sobrevida dos pacientes com câncer de pulmão, cinco anos após o diagnóstico, é de apenas 10% a 20% na maioria dos países, embora as taxas sejam maiores no Japão (33%), Israel (27%) e na Coreia do Sul (25%). “O rastreamento com tomografia computadorizada (TC) de baixa dose para indivíduos de alto risco (fumantes e ex-fumantes pesados) pode ajudar a diagnosticar o câncer precocemente, aumentando a probabilidade de um tratamento bem-sucedido”, destaca o relatório.

As taxas de incidência e mortalidade são particularmente altas no leste asiático. Segundo o documento, é provável que isso seja um reflexo da alta poluição do ar e da exposição a agentes inaláveis, como a queima doméstica de combustíveis sólidos para aquecimento e cozinha.

No restante do mundo, a Sociedade Norte-Americana de Câncer atribui a maior parte dos casos da doença ao hábito de fumar. “Com cerca de dois terços das mortes por câncer de pulmão em todo o mundo atribuíveis ao tabagismo, a doença pode ser amplamente prevenida por meio de políticas e regulamentos eficazes de controle do tabaco.”