O risco de ser infectado pelo Sars-CoV-2, causador da covid-19, depende da quantidade de partículas virais inaladas e da região do trato respiratório em que elas se alojam, segundo um estudo da Universidade Estadual de Dakota do Sul, nos Estados Unidos. A pesquisa, divulgada na plataforma de publicação on-line medRxiv e, atualmente, sob revisão dos pares para sair na revista Plos One, teve como objetivo estudar os padrões de contágio para o desenvolvimento de uma máscara reutilizável que captura e mata o patógeno, antes que ele consiga entrar no organismo.
Saikat Basu, pesquisador do Departamento de Engenharia Mecânica da instituição, desenvolveu um modelo que analisa o tamanho das gotas dos aerossóis para rastrear a trajetória do vírus e também investigar a carga viral necessária para uma pessoa ser infectada. “Para ser contaminado, o indivíduo deve, primeiramente, inalar o vírus. Por isso, é importante entender os padrões inalatórios”, afirma Basu.
Entre outras coisas, a simulação revelou que os modelos de máscara utilizados atualmente, que cobrem o nariz e a boca, são eficazes para bloquear gotas com tamanho suficiente para alcançar a região em que o vírus inicia sua trajetória infecciosa. Basu também descobriu que o clima seco aumenta o potencial de contágio. “O Brasil, que é um país com alta umidade relativa do ar em quase toda sua extensão, pode se beneficiar disso”, diz o pesquisador.
Basu conta que um estudo da Universidade da Carolina do Norte demonstrou que a parte superior da garganta, logo atrás das fossas nasais e acima do esôfago e da laringe, a nasofaringe, é a principal zona de acesso do vírus ao organismo humano. Pesquisas subsequentes, como uma da Universidade de Oxford, confirmaram a descoberta. As células ciliadas que revestem a nasofaringe, localizadas atrás da cavidade nasal anterior, têm um receptor conhecido como ACE2, que o vírus usa para entrar no núcleo celular. A infecção, então, se espalha desse local inicial para os pulmões por meio da aspiração dos fluidos nasofaríngeos carregados de vírus.
Inalação de ar
Para determinar quais tamanhos de gotas têm maior probabilidade de atingir a nasofaringe, Basu desenvolveu modelos baseados na tomografia computadorizada da região nasal de dois adultos saudáveis e simulou quatro taxas de inalação de ar: 15, 30, 55 e 85 litros por minuto. “A taxa de 15 litros por minuto refere-se, por exemplo, a quando você está sentado e respirando suavemente. Já de 30 por minuto corresponderia aproximadamente a sua taxa de respiração durante uma caminhada”, explicou. Ao cheirar e inspirar com força, um adulto inala de 60 a 75 litros de ar por minuto.
“Quando calcula-se a média da transmissão viral em diferentes taxas de respiração, as gotículas de 2,5 a 19 mícrons de tamanho são as que atingem a nasofaringe com maior sucesso”, diz o pesquisador. “A maioria das máscaras bloquearia gotículas desses tamanhos. Então, usá-las é muito útil. Esses também são os tamanhos de gota que precisamos para garantir que o modelo de máscara que estamos desenvolvendo seja eficaz.” De acordo com Basu, além de fornecer dados que auxiliarão no design do produto, a modelagem desenvolvida por ele pode ser útil para a fabricação de terapias antivirais inalatórias ou vacinas intranasais.
Altamente contagioso
Basu, então, procurou estudos que calculam a taxa de transmissão da covid-19 entre pessoas que estão próximas umas das outras — uma dessas pesquisas foi feita com dados de um coral em que um único membro passou a doença para 52 dos 61 cantores. Com essas informações, ele calculou que são necessárias pelo menos 300 partículas virais para iniciar uma infecção.
“O fato de que o número de partículas de vírus necessário para originar a infecção está na faixa das centenas é muito notável e mostra o quão contagioso esse vírus é”, diz. Normalmente, uma infecção viral inalada, como a gripe, requer 1.950 a 3 mil virions (partículas de vírus). Para estimar a probabilidade de uma gota conter pelo menos uma partícula, o pesquisador usou um estudo sobre a quantidade de Sars-CoV-2 presentes na expectoração e no muco de pacientes com covid-19 e, em seguida, levou em conta a desidratação das gotículas, quando entram em contato com o ar.
Uma redução de um terço no tamanho significa que a probabilidade de uma gotícula de 10 mícrons conter pelo menos um vírion aumenta de 0,37% para 13,6%. No caso de gota de 15 mícrons, essa probabilidade aumenta para 45,8%. Isso acontece porque as substâncias que compõem as gotículas contendo vírus não são voláteis. Quando elas evaporam, a concentração de partículas virais aumenta significativamente. “Isso pode ter um impacto significativo na transmissão da covid-19 no Hemisfério Norte neste inverno, já que a umidade relativa cai e, subsequentemente, desencadeia uma taxa maior de desidratação para as gotículas respiratórias ejetadas. Além disso, o sistema de ventilação em ambientes fechados nos meses de inverno pode aumentar o risco de transmissão aérea.”