
O sentimento de inquietação e a busca por pertencimento foram a faísca para a idealização de uma organização sem fins lucrativos que luta para proteger e valorizar o Cerrado, um dos ecossistemas mais ricos em biodiversidade do mundo. Concebida durante a pandemia, a associação A Vida no Cerrado (Avinc) iniciou sua atuação na internet, com a divulgação científica sobre o bioma, até então pouco mencionado em discussões acerca da conservação ambiental no país.
Biólogo e vice-diretor da Avinc, Bruno Camargos, 27 anos, conta que é comum ouvir as pessoas reduzirem o Cerrado às suas árvores retorcidas ou se referirem ao bioma como um local meramente desértico. "É muito difícil falar de biomas não florestais, como o Cerrado, em um país que tem Mata Atlântica e Amazônia. Em 2020, conheci o trabalho de Cayo Alcântara, diretor-executivo da Avinc, que fazia divulgação científica exaltando esse tipo de bioma e me interessei. Com Vitor Senna (também voluntário), participamos do processo seletivo para integrar a associação e fomos aprovados", diz o ativista.
Aos poucos, a Avinc se expandiu e, hoje, conta com 46 voluntários, dos quais 20 vivem no Distrito Federal. Além da divulgação científica, o grupo trabalha com educação socioambiental, promovendo ações em escolas, parques, feiras e demais espaços de ensino, e incidência política, contribuindo para a formulação de políticas públicas em defesa do Cerrado, com a criação e monitoramento de projetos de lei.
"A virada de chave ocorreu quando saímos das redes e começamos a levar nossas ações para os territórios, que se estendem a várias outras Unidades da Federação enquadradas no bioma", acrescenta Bruno. Para Wanderson Costa, 24, mobilizar-se junto a outros jovens pela proteção e valorização do Cerrado significa pertencimento e identificação. "Queremos todos adiar o fim do mundo", diz, aos risos. "Além de incentivar as pessoas a se reconhecerem como parte de um território", completa.
Para Laís Menezes, 24, e Maria Alice dos Santos, 24, o sentimento é semelhante. "Ser parte da organização é um reconexão com as minhas raízes, que brotaram deste contato com o bioma", pontua Laís. "Estamos em um espaço que instiga a transformação e a participação da juventude nos processos de tomada de decisão em prol da conservação desse ecossistema", sustenta Maria Alice.
Parques ecológicos
"Brasília, além de ser o centro das decisões do país, é o coração do Cerrado que, por sua vez, é o coração do Brasil", afirma o biólogo Vitor Sena, 28, ao explicar que o quadradinho é a única Unidade da Federação composta somente por Cerrado. O ativista lembra, ainda, que a capital é conhecida como o local onde é possível ver o horizonte de qualquer ponto da cidade. Segundo Vitor, a característica, que garante ainda mais beleza a Brasília, deve-se aos planaltos do bioma.
"A cerca de 50km do Plano Piloto, temos a Estação Ecológica Águas Emendadas, unanimidade no mundo por unir as três bacias hidrográficas mais importantes do país — Tocantins-Araguaia, Platina e São Francisco —, das quais duas vertem em destinos opostos", ressalta o biólogo, lembrando que, para além dos monumentos, são as cachoeiras e os parques ecológicos que engradecem e harmonizam a cidade.
O estudante de medicina veterinária Luiz Trindade, 20, menciona também a excelência da Universidade de Brasília (UnB) no desenvolvimento de estudos sobre o Cerrado. "Conheço pessoas que vêm de todos os pontos do país para estudar na UnB, pois temos os principais polos de pesquisa do Brasil. O setor do Hospital Veterinário (da universidade) que cuida de animais silvestres, por exemplo, é referência no Brasil", conta o jovem, que, desde cedo, sonhou em trabalhar com os bichos do Cerrado. "Me chamavam de amigo dos animais na infância", diz.
Apesar de desafiador, o ativismo tem gerado frutos e conquistado mais voluntários. Prova disso é que, a fim de expandir o conhecimento sobre o Cerrado, a Avinc propôs um projeto de lei que incluísse a Semana do Cerrado no calendário escolar em setembro, mês em que é celebrado o Dia Nacional do
Cerrado e, em 2022, a lei foi aprovada pela Câmara Legislativa do DF (CLDF). A ação contribui para que as instituições promovam iniciativas voltadas para informar e conscientizar sobre o bioma, por meio de painéis, seminários, palestras e outras ações educativas.
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"Acredito muito que toda política pública nasce de um sonho. Houve um tempo em que eu acordava depois de sonhar toda a noite com o Cerrado. E, foi dessa inquietação, que decidi entrar para a Avinc e tentar fazer a diferença", pontua o estudante Davi Paes, 26. Em concordância, o estudante de ciências ambientais Lucas Dias, 26, conta que, por meio da militância em defesa do bioma, conseguiu unir duas áreas que tanto aprecia, a ecologia e a educação, tornando-se coordenador do Núcleo de Educação Socioambiental da Avinc. "Eu me sinto contemplado no projeto", diz.
Saiba Mais
Processo seletivo aberto
O processo seletivo para integrar a associação A Vida no Cerrado está aberto. As vagas são direcionadas para o Núcleo de Comunicação e Divulgação (NuCom), Núcleo de Advocacy e o Núcleo de Educação Socioambiental. Para saber mais, acesse o Instagram da Avinc ou o site https://www.avidanocerrado.com/processo-seletivo