ANIVERSÁRIO DE BRASÍLIA

Crônica: Eu, morador do Plano Piloto

Muita gente que pensava igual a mim veio de todas as partes do Brasil participar da construção desse futuro sonhado

Minha Brasília -  (crédito: Maurenilson Freire)
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Minha Brasília - (crédito: Maurenilson Freire)

Por Climério Ferreira - Quando cheguei aqui, em minha primeira viagem de avião, o medo foi suplantado pela minha crença no futuro do nosso país, uma crença firmemente representada pela ideia de centralização da capital, pela ousadia arquitetônica e pelo planejamento humano dos espaços urbanos. Além disso tudo, havia o irresistível sonho de cursar a Universidade de Brasília, com seu currículo moderno e presença dos professores mais significativos do pensamento brasileiro da época.

Muita gente que pensava igual a mim veio de todas as partes do Brasil participar da construção desse futuro sonhado. Como vim em 1962, a cidade tinha apenas dois anos, com muita coisa sendo construída, o que possibilitou a convivência de diferentes classes sociais, com diversos sotaques regionais do nosso imenso país, num cenário no qual tudo estava coberto por uma poeira vermelha e povoado de habitações, igrejas, lojas, farmácias, bancos, cinemas de madeira. Pouco tempo depois que cheguei, veio toda minha família, e eu saí do Núcleo Bandeirante e fui morar em Taguatinga.

 Depois que terminei meu segundo grau, passamos ao mesmo tempo, eu e meu irmão Clésio, no vestibular da UnB. O golpe militar de 1964, dois anos depois da minha chegada, deu início à destruição do nosso futuro, demitindo e prendendo professores, invadindo várias vezes a universidade, que a transformou numa real aula de defesa permanente da democracia.

Foi no correr desses anos trágicos que eu e meus irmãos Clodo e Clésio decidimos compor canções, participar de festivais e imaginar discos. Pessoalmente, acho que a cidade não deveria sofrer a tragédia tão violenta e cruel das armas contra a democracia. A beleza dos palácios, do teatro, das igrejas sempre indicava um futuro novo de convivência humana, e há na sua arquitetura uma ideia de harmonia e igualdade.

Desde quando pude vir morar no Plano Piloto, senti-me feliz de poder viver quase tudo de que precisava indo a pé. Os prédios residenciais de seis andares permitem aos moradores nas janelas uma vista livre do encantador céu do Planalto Central. Ao sair de casa, a gente anda sob árvores frondosas, algumas frutíferas, nas quais os mais variados tipos de pássaros constroem seus ninhos e cantam seus cantos.

Há calçadas para uma ligeira caminhada, e nos fins de semana e feriados as pessoas podem usar o Eixão para exercitar-se, andar de bicicleta, passear com a família, fazer churrascos — e ouvir grupos musicais de diversos tipos de repertórios, ler ou simplesmente encontrar amigos. Afora isso, nas superquadras encontramos bons restaurantes, pequenos e aconchegantes barzinhos. Toda minha experiência existencial de Brasília resume-se ao Plano Piloto, mais precisamente na Asa Norte.

Por Opinião
postado em 21/04/2025 03:49