Com uma extensão territorial de 139,7 hectares, o Jardim Zoológico de Brasília abriga, atualmente, cerca de 600 animais, distribuídos entre 184 espécies de aves, artrópodes, mamíferos e répteis. Entre a bicharada, porém, há aqueles que, dentro de seus aspectos peculiares, chamam mais atenção do público, destacando-se e cativando o coração dos brasilienses. O Correio inicia, hoje, uma série de reportagens que vai contar as histórias e detalhar a rotina dos queridinhos do Zoo.
Pelagem macia, cauda longa, olhar marcante e miados de som suave. Esta descrição pode até parecer a de um gato doméstico, mas refere-se, na verdade, ao segundo maior felino das Américas, atrás somente da onça-pintada — a onça-parda, também conhecida como puma e suçuarana. No Zoo de Brasília, a espécie pode ser vista de perto. O trio — Cristal, Fred e Nala — é considerado uma das estrelas do espaço.
Embaixadores da fauna brasileira, as pumas foram resgatadas em épocas diferentes, mas, agora, vivem juntas em um mesmo recinto. Hellen Cristina de Sousa, médica veterinária e chefe do núcleo de mamíferos, detalha que Fred foi resgatado pelo Batalhão da Polícia Militar do Distrito Federal (BPMDF) com o apoio do Corpo de Bombeiros Militar de GO (CBMGO), em Planaltina de Goiás, em janeiro de 2012. Nala foi resgatada pelo Ibama de Goiás em 2013, e Cristal, pelo Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de Goiás, em junho de 2014.
À época que foram encontrados, Cristal e Fred ainda eram filhotes, tinham entre um e dois anos. No caso de Nala, não é possível saber sua idade exata, mas a especialista avalia que os três têm entre 14 e 17 anos, sendo que a expectativa de vida da espécie beira os 20. No entando, de acordo com o supervisor do setor de mamíferos, o biólogo Raphael Camargo, no Zoo, há diversos animais que superaram a média da espécie. "Estimamos um tempo e eles viveram por muito mais", conta.
A estimativa de vida para animais que vivem na natureza é diferente da estipulada aos que estão em conservação. Raphael Camargo explica que, no caso das pumas, isso pode acontecer principalmente porque, quando estão idosos, se os animais estivessem em vida livre poderiam ser vítimas de algum outro predador, além de encontrarem dificuldades para conseguir alimentos.
De volta ao lar
No fim de 2022, as pumas tiveram de ser retiradas do recinto visível ao público após fortes chuvas comprometerem o espaço que estava ao lado do local onde ficavam. Com o isolamento da área, para a segurança dos animais, tratadores e visitantes, foi necessário remanejar os bichos ao Hospital Veterinário do Zoo. Lá, eles ficaram por cerca dois anos. Retornaram ao recinto exposto somente em outubro do ano passado. Agora, reabilitados e familiarizados com o espaço, brilham novamente.
Perspicazes, Cristal, Fred e Nala têm aulas de condicionamento, em média, três vezes na semana. E aprendem rápido, os gatinhos selvagens já sabem dar a patinha, mostrar a barriguinha e a cauda para que a sedação seja aplicada. Os treinamentos possibilitam que, quando necessárias, as transferências ocorram de forma tranquila.
A gerente de bem-estar, a médica veterinária Camila Rocha, é uma das responsáveis pelos treinamentos. Ela define as três pumas como extremamente inteligentes. "Cada dia que passa, nós avançamos mais com eles, que já dão a pata e permitem toques no corpo. Agora, estamos treinando para que abram a boca para conseguirmos ver as arcadas dentárias", afirma.
Cristal, com seu focinho preto charmoso, tem uma personalidade exploradora. Gosta de desbravar o recinto, deitar escondida nas touceiras, em cima dos estábulos e na toca do habitat. Fred, o macho do trio, é o maior e mais pesado. Tranquilo, é o mais preguiçoso, além de ser tímido. Não gosta tanto dos holofotes, prefere ficar dentro do cambiamento (local de descanso dos animais), parte mais escondida e fresca do habitat. Nala, a menor do grupo, encanta a todos com seu focinho cor-de-rosa. Arteira, é exibida, quase que a protagonista. Gosta de deitar na cama de areia, entre as touceiras, e quase sempre está em pé no topo dos troncos.
"Entre si, eles deitam e se lambem, como os gatos. Eles têm um carinho mais contido, com lambeduras, que chamamos de banho, e descanso perto um do outro", conta a chefe do núcleo de mamíferos, Hellen Cristina de Sousa. Outra semelhança com o gatos domésticos que as pumas apresentam é que, diferentemente da onça-pintada, que tem a capacidade de rugir graças a uma modificação no osso hióide, as onças-pardas miam e ronronam.
Acolhimento
Não há informações concretas do que aconteceu com Cristal Fred e Nala antes de serem encontrados pelas equipes. Sabe-se que foram resgatados ainda filhotes ou jovens e estavam longe da mãe. "Quando o animal é encontrado, o Cetas faz uma avaliação e somente a partir do momento que chega à conclusão de que não há maneiras de reabilitar o animal, para que sobreviva na vida livre, é que ele é encaminhado ao Zoo", ensinou Raphael Camargo .
Ao chegar no Zoológico, o animal é catalogado e passa a integrar o plano de conservação da espécie. No caso das espécies ameaçadas de extinção, é feito um trabalho de reprodução, para que sejam reintegrados a natureza. Contudo, esse não é a situação das onças-pardas, que no Brasil, não estão ameaçadas, mas são consideradas vulneráveis. "É importante deixar claro que o Zoo não compra ou retira animais da natureza", frisa o supervisor do setor de mamíferos.
O biólogo lembra, ainda, que animais silvestres não são domesticáveis. "Os felinos têm os seus instintos. Eles são predadores e carnívoros. Não é possível criá-los em sua residência, chácara ou fazenda, por exemplo. Eles podem até crescer juntos aos cachorros e aos gatos, sem vê-los como presa, mas pode ocorrer do animal se tornar agressivo. Quando as onças atingem a maturidade sexual, elas buscam parceiros, e nesse período tornam-se agressivas", detalha. Raphael alerta que, ao encontrar um animal silvestre, o correto é ligar para o BPMDF ou Ibama.