O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) solicitou à Justiça, nesta quinta-feira (9/1), a suspensão do pagamento de uma gratificação retroativa aos conselheiros do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). O benefício foi aprovado durante a última sessão de 2024.
A manifestação do Ministério Público ocorreu após um pedido da juíza Bruna Araújo Coe Bastos, da 8ª Vara da Fazenda Pública. O pagamento é referente aos cinco anos anteriores a 1º de janeiro de 2023, representando um adicional de 1/3 sobre os salários dos beneficiados — aproximadamente R$ 14 mil mensais. O valor, retroativo desde 2018, pode resultar em valores milionários para alguns conselheiros, que trocaram a nomenclatura da função para "desembargadores". Promotores do Ministério Público de Contas (MPC-DF) também estão entre os beneficiários.
A justificativa para o benefício seria a compensação pelo acúmulo de acervo processual (conjunto de processos judiciais a serem analisados) por parte dos conselheiros e membros do MPC-DF. No entanto, os promotores do MPDFT Alexandre Sales de Paula e Sérgio Bruno Cabral Fernandes argumentaram que a decisão do TCDF viola princípios constitucionais, como o da simetria, que exige a aplicação de normas da União aos estados e demais entes federativos.
De acordo com os procuradores, normas de outros órgãos, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Supremo Tribunal Federal (STF), estabeleceram efeitos retroativos apenas a partir de 1º de janeiro de 2023. A decisão do TCDF, ao retroagir o pagamento até 2018, estaria, segundo o MPDFT, desalinhada desses precedentes.
“A ausência de precedentes normativos que fundamentassem a retroação dos efeitos da concessão do benefício aos últimos cinco anos demonstram, à evidência, que não houve aplicação correta do princípio constitucional da simetria por parte do TCDF ao autorizar o pagamento retroativo da compensação por acúmulo de jurisdição/acervo a conselheiros (desembargadores) e membros do Ministério Público de Contas para além do dia 1º/01/2023”, explicaram os promotores Sales de Paula e Cabral Fernandes.
Os promotores do MPDFT também ressaltaram o risco de danos ao patrimônio público caso os pagamentos retroativos sejam realizados. “O periculum in mora encontra-se evidenciado nos danos concretos e irreparáveis ao patrimônio público do Distrito Federal com a continuidade dos pagamentos retroativos. Neste ponto, estima-se a enorme dificuldade que o Estado terá para conseguir ao final reaver os recursos que vierem a ser transferidos a conselheiros (desembargadores) e membros do Ministério Público de Contas, em caso de procedência da ação popular”, afirmaram.
Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular
Aprovação em meio minuto
A gratificação retroativa foi aprovada em 11 de dezembro de 2024, de forma unânime, em apenas 30 segundos. O TCDF justificou que o benefício é concedido aos integrantes do Poder Judiciário e, por simetria, deveria ser estendido aos membros da Corte de Contas.
Diante de uma ação popular, a juíza Bruna Bastos deu 48 horas para que o TCDF apresentasse explicações. Na manifestação, o tribunal alegou que a medida não afronta a moralidade administrativa ou o patrimônio público. Segundo o então presidente da Corte, Márcio Michel, a decisão foi embasada em pareceres técnicos e na legislação vigente.
“Como será demonstrado, o ato combatido não possui nenhum vício, tendo sido fundamentado exaustivamente pelas Unidades Técnicas que instruíram o feito, aplicando-se a legislação e o entendimento jurisprudencial e administrativo sobre o tema, inexistindo motivo idôneo a justificar a anulação da decisão”, argumentou Michel.
O presidente do TCDF destacou, ainda, que a decisão foi tomada de forma pública, durante uma sessão transmitida pelo canal oficial do tribunal no YouTube. “Além disso, ao contrário do que quer fazer acreditar a parte autora, não houve intenção de ocultar a publicidade da Decisão nº 98/2024. Nesse sentido, a Sessão Administrativa nº 1211, de 11/12/2024, foi presenciada por aproximadamente 2.000 pessoas, que estavam na sede do Tribunal de Contas e acompanharam a votação de todos os processos, bem como a eleição da nova Mesa Diretora do TCDF. O ato também foi acompanhado pela imprensa local, a convite do Tribunal”, acrescentou. Ele também citou que o Tribunal de Contas de Rondônia aprovou benefício semelhante.
O caso aguarda agora uma decisão da juíza Bruna Araújo Coe Bastos.