As fortes chuvas que atingiram o Distrito Federal no último fim de semana deixaram um rastro de destruição. Em Águas Claras, o muro de um condomínio desabou, danificando veículos que estavam estacionados no local. Em Arniqueira, ruas cederam, transformando avenidas em crateras e dificultando a passagem de carros e motocicletas.
No Guará, no Sol Nascente e no Pôr do Sol, as precipitações causaram transtornos e perda de bens materiais, além de danos às pistas das cidades. A tendência é que a chuva se mantenha nos próximos dias e os moradores de áreas de risco reforçaram que estão com medo do que pode acontecer.
Moradora do Pôr do Sol, em Ceilândia, Rosalina Silva Nascimento, 50 anos, está na região há 11 e conta que vive um drama quando começa a chover. "Ninguém passa, porque a chuva carrega tudo. Eles tinham colocado uma pista nova, mas veio a chuva e arrancou tudo. Não temos conseguido nem pegar o ônibus, porque ele não consegue mais passar aqui", disse.
Rosalina sente medo de sair de casa, pois o trecho onde mora fica completamente interditado quando chove forte. "Tentamos nos proteger e guardar as nossas coisas do jeito que podemos, mas o receio é constante porque, se a enxurrada vier, não conseguimos fazer nada. Várias vezes meu marido precisa me pegar no colo para conseguir chegar em casa e não ser carregada pela água. Sempre que começa a chover ficamos em alerta e enquanto essa situação não for normalizada ficarei com medo", ressaltou.
De acordo com um levantamento da Subsecretaria do Sistema de Defesa Civil (Sudec), o Distrito Federal tem 36 áreas de risco para ameaças e vulnerabilidades geotécnicas, estruturais e ambientais, distribuídas por 19 regiões administrativas.
"Elas são monitoradas no DF devido a ameaças de erosões, deslizamentos e inundações, com destaque para regiões como Sol Nascente/Pôr do Sol, Fercal, Vicente Pires, Sobradinho II e Arniqueira. Cada uma dessas áreas apresenta características específicas de risco e demanda ações diferenciadas para mitigação. É importante destacar que o relatório sobre áreas de risco é entregue ao GDF, para orientar os trabalhos das equipes técnicas dos órgãos envolvidos", informou a Sudec, por meio de nota.
De acordo com o secretário de Obras e Infraestrutura, Valter Casimiro, além das intervenções emergenciais, o GDF manterá um monitoramento constante ao longo da semana, com equipes em prontidão para agir de forma imediata caso novas chuvas ou situações de risco surjam. Segundo ele, a infraestrutura de drenagem do DF, apesar dos desafios impostos pela quantidade de chuva, está funcionando adequadamente.
"Quando a chuva diminui, o sistema de drenagem capta o excesso de água rapidamente. Isso demonstra que as redes pluviais estão respondendo de forma eficiente ao volume de água, apesar de algumas sobrecargas temporárias", explicou. "Nossas equipes estão intensificando as ações de limpeza e manutenção para garantir que as vias fiquem livres de obstruções, permitindo a rápida drenagem das águas pluviais e a volta à normalidade", acrescentou Casimiro.
O secretário de Governo (Segov), José Humberto Pires, afirmou que toda a equipe está fazendo acompanhamento diário. "Em relação ao período chuvoso, os órgãos estão em alerta permanente, de forma que as ações necessárias sejam tomadas com brevidade", pontuou. "Desde a madrugada de ontem, equipes atuam de forma intensiva, limpando ruas, desobstruindo bocas de lobo, fazendo recuperação asfáltica e outras iniciativas para restabelecer a normalidade", garantiu o gestor.
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Desabamento
Na tarde do último domingo, o muro de um residencial localizado na Rua das Carnaúbas, em Águas Claras, foi derrubado devido às chuvas que atingiram a capital. O síndico Paulo de Tarso explicou ao Correio que o desabamento foi causado pelo represamento das águas pluviais. "As águas vieram do único terreno vazio da região, formaram uma bacia e acabaram pressionando o muro até ele ceder. A estrutura caiu sobre os carros que estavam estacionados no local", afirmou.
Morador do quarto andar do prédio, Tiago Augusto Aniceto, tecnólogo, presenciou o momento do desabamento e disse que a queda era uma "tragédia anunciada". "Por volta das 16h30, a água acumulada no muro fez com que ele desabasse. Eu desci correndo para ajudar os vizinhos a retirar os carros atingidos. Todos ficaram em choque, porque ainda estava chovendo muito na hora, mas todo mundo se ajudou. Fico feliz por ninguém ter se machucado", disse.
A Construtora Direcional, responsável pelo condomínio em Águas Claras, informou que as chuvas intensas sobrecarregaram o sistema de drenagem da rua externa ao condomínio, o que gerou o represamento e a queda do muro. A empresa declarou que já está averiguando os danos e permanece à disposição dos moradores por meio de seus canais oficiais.
Buracos e transtornos
Na região de Arniqueiras, o cenário não foi diferente. O asfalto cedeu em diversos pontos, transformando as ruas em grandes buracos que impossibilitam o tráfego. Morador de um residencial localizado no Conjunto 5, Regis Maciel, 43, afirmou que os problemas na região são recorrentes.
"Quando chove, o asfalto não aguenta. As ruas ficam como uma cachoeira, e mesmo depois da chuva é impossível passar em alguns trechos. Isso acontece porque as obras de recapeamento são mal feitas. Toda vez eles vêm aqui e jogam uma camada superfina de asfalto, só para cobrir. Então, quando chove, sai tudo novamente", contou o empresário.
Um motociclista que passava pelo local resumiu a situação de forma irônica. "Isso aqui está parecendo a lua, de tanto buraco", disse.
No Guará Park, o atleta paralímpico Estevão Lopes, 46, morador do condomínio Cecília Meireles há mais de 20 anos, contou que sofreu as consequências das fortes chuvas pela segunda vez. "Em 3 de janeiro de 2024, a gente teve a infelicidade de acontecer um transbordamento do córrego Vicente Pires, que fica a uns 40 metros da nossa casa. A enchente inundou e a gente perdeu tudo. Desta vez a água chegou a um metro e meio de altura e todos os nossos móveis foram atingidos", lamentou.
"Sabemos que a chuva não vai acabar e que vai chover até março. Vamos conseguir recuperar os bens materiais, limpar a casa, mas será que vai acontecer tudo novamente? Estamos à mercê e contamos com os nossos governantes para ter uma sensibilidade, um olhar aqui para o Guará Park", desabafou.
Conscientização
Engenheiro civil especialista em infraestrutura de transportes, Érick Luiz de Freitas ressaltou que a principal ação a ser tomada é a manutenção tempestiva do sistema de drenagem. "É necessário que haja, além do melhoramento do sistema atual, adoção de políticas de zoneamento urbano sustentável que levem em consideração as características do solo e os riscos de inundações e deslizamentos", explicou.
Outro ponto indispensável, segundo Freitas, é a cooperação entre o GDF e a comunidade, no sentido de realizarem programas de conscientização do descarte de lixo e entulho que, com certeza, estão atrelados à dificuldade de o sistema de drenagem operar. "O sistema de drenagem, por si só, às vezes, a depender da magnitude da chuva, principalmente se for uma que ultrapasse a vazão do sistema, vai saturar, mas, com os bueiros limpos, o impacto é, com certeza, menor", argumentou.
Em relação a viadutos e tesourinhas, o engenheiro civil disse que é importante avaliar se o dimensionamento do sistema de drenagem está adequado aos estudos hidrológicos, visto que há uma constante alteração dos tempos de recorrência de chuvas em todo o país. "Aliado a isso, para que o sistema de drenagem seja eficiente, é importante que haja manutenções preventivas, para garantir que os sistemas estejam livres de obstruções", alertou o especialista.
Grau de emergência
Em nota enviada ao Correio, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) informou que todas as regiões administrativas estão recebendo atendimento conforme solicitações e, na manhã de ontem, equipes da Divisão de Manutenção de Águas Pluviais da Novacap estavam em atendimento a demandas em Arniqueira, no Viaduto da EPTG que dá acesso ao Guará e na DF-075, em apoio ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF) — pontos que sofreram alagamento após as fortes chuvas.
Ainda segundo a Novacap, o Departamento de Parques e Jardins realizou o levantamento dos resíduos verdes gerados pelo impacto das fortes chuvas, para recolhimento posterior. "Outras atividades, como reformas e manutenções de bocas de lobo, limpeza de redes de drenagem, entre outras atividades, também estão sendo executados conforme cronograma, priorizando as demandas, de acordo com grau de emergência. A Companhia atua diariamente conforme solicitação realizada pelos órgãos competentes e de acordo com a sua capacidade operacional", ressaltou a nota.
Corredor de umidade
A meteorologista Andrea Ramos explicou que a intensidade das chuvas está ligada a um canal de umidade, que está passando pelo DF. Segundo ela, este ano, há presença do fenômeno La Niña, que sempre está associado ao aumento de chuvas nas regiões Norte e Nordeste.
Andrea disse que a previsão para o DF continua sendo de céu com muitas nuvens, junto a pancadas de chuva, trovoadas e rajadas de vento, principalmente à tarde. "As temperaturas devem ficar nos 18ºC, na parte da manhã, e, à tarde, variando entre 27ºC e 28ºC. A umidade relativa do ar será alta, 95% durante a manhã e, à tarde, fica em torno dos 60%", detalhou.
Saiba Mais
Projetos
Arniqueira
A região carece de infraestrutura urbana, como sistema de drenagem e pavimentação adequada. A Secretaria de Obras trabalha na elaboração dos projetos para resolver de forma definitiva a falta de redes de águas pluviais na região. A previsão da pasta é de que a licitação para a contratação de empresa responsável pelas obras de infraestrutura urbana seja realizada ainda neste ano;
Pôr do Sol
O local não tem sistemas de drenagem adequados, o que resulta em sérios problemas de alagamentos e erosão sempre que há precipitação intensa. A Secretaria de Obras está trabalhando na elaboração dos projetos de infraestrutura urbana para a região, com o objetivo de implantar, de forma ordenada, todos os sistemas necessários, como drenagem, pavimentação e saneamento. A previsão é de que a licitação para a contratação da empresa responsável pela execução das obras aconteça ainda neste ano;
Sol Nascente
As obras nos trechos 1 e 3 seguem em andamento. Os serviços de drenagem e pavimentação estão suspensos até a chegada da estiagem. Enquanto isso, máquinas e operários das empresas contratadas seguem com os serviços que podem ser executados mesmo com chuva, como instalação de meios fios, construção de calçadas e abertura de bocas de lobo. Paralelamente, equipes da Secretaria de Obras e da Administração Regional seguem executando ações paliativas para minimizar os impactos causados pela chuva;
Guará Park
O volume atípico de chuvas sobrecarregou temporariamente os sistemas de drenagem, mas, em pouco tempo, a água foi absorvida, retornando à normalidade graças à estrutura existente. Importante destacar, no entanto, que a região se encontra em obras, com implantação de redes de águas pluviais, pavimentação, construção de lagoas de detenção, instalação de meios fios e construção de calçadas.
Fonte: Secretaria de Obras
Arthur de Souza
Repórter de Cidades31 anos, jornalista formado pelo Centro Universitário Estácio de Brasília e MBA em jornalismo esportivo. Repórter do Correio Braziliense desde janeiro de 2022.