ENTREVISTA

"O Estado está dando a resposta ao 8/1", diz vice-presidente do TJDFT

Ao CB.Poder, o presidente do TJDFT, desembargador Roberval Belinati, destacou que os acusados pelos ataques à democracia em 8 de janeiro de 2023 estão sendo julgados pelos seus atos. "O Estado está dando a resposta ao que aconteceu", ressaltou

Desembargador Roberval Belinati, vice-presidente do TJDFT, no programa CB.Poder. Na bancada, as jornalistas Ana Maria Campos (D) e Denise Rothenburg -  (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Desembargador Roberval Belinati, vice-presidente do TJDFT, no programa CB.Poder. Na bancada, as jornalistas Ana Maria Campos (D) e Denise Rothenburg - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Próximo de completar dois anos, os atos antidemocráticos de 8 de Janeiro de 2022 foram tema de entrevista com o desembargador Roberval Belinati, vice-presidente do Tribunal de Justiça do DF e Territórios, durante o programa CB.Poder — uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília — dessa segunda-feira (6/1). Às jornalistas Ana Maria Campos e Denise Rothenburg, ele comentou sobre possíveis falhas de segurança durante os atos antidemocráticos.

Nesta quarta-feira (8/1), completam-se dois anos dos ataques ao Palácio do Planalto, Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF). O senhor acha que a nossa democracia continua ameaçada?

Eu era presidente do Tribunal Regional Eleitoral em 8 de janeiro de 2023. Vivi todos os momentos. Sofri, fiquei apreensivo com a nossa democracia, com as consequências do que havia acontecido. Ninguém consegue esquecer que 4 mil pessoas em passeata se deslocaram para a Praça dos Três Poderes, invadiram as sedes do Congresso, do Planalto e do Supremo e depredaram o que puderam. É um ato que nós temos que reprovar. Não podemos resolver a situação política com confronto, com violência. Devemos resolver com diálogo. Não posso dizer que a democracia não corre mais risco, porque o Brasil tem uma história de tentativas de golpe e de golpes. Eu fiz até uma pesquisa na Wikipédia e ela registra em um artigo que nós tivemos nove golpes. Desde a época do império de Dom Pedro I até hoje, foram nove golpes consolidados e mais de 20 tentativas de golpe. Nós temos que lutar para manter a nossa democracia. Jamais admitir uma quebra, uma interrupção, um fechamento de Congresso. Nós devemos cumprir todas as regras para garantirmos o Estado Democrático de Direito, garantir o cumprimento das leis.

O senhor acredita que pessoas que tenham sido enganadas para participar dos atos estão pagando um preço muito alto, com penas altas, e que elas merecem anistia? 

Muitas pessoas envolvidas conversaram comigo. Eu, como, na época, presidente do Tribunal de Justiça Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF) fui procurado por advogados, pessoas da Igreja e conhecidos que queriam saber a minha opinião. A minha resposta é que cada um deve responder na medida de sua culpabilidade. Pessoas inocentes foram envolvidas. Eu conheço muitas pessoas ingênuas, que foram envolvidas naquela passeata, entraram nos prédios, foram presas, condenadas, algumas estão ainda respondendo a processos criminais do Supremo. Eu acho que essa situação deve ser bem examinada pelo Congresso Nacional. Existem projetos de anistia. Muitos foram realmente manipulados e acreditaram em falsos discursos, em falsas promessas. Não podemos fechar os olhos para essa realidade.

Acha que houve um planejamento para a invasão dos prédios?

Segundo os fatos apurados, 103 ônibus foram fretados para trazer manifestantes à capital da República. Além desses ônibus, muitos caminhoneiros vieram para cá, motoristas com seus carros particulares também vieram para participar desse movimento. Essa manifestação, que, segundo ficou apurado, exigia a intervenção militar para não permitir o governo daquele que tinha sido eleito. Esses fatos são de conhecimento público. Claro que houve (planejamento). Quem é que alugou esses ônibus? Quem é que pagou? Quem é que acomodou, acolheu essas pessoas aqui na capital da República? Isso estava planejado, inclusive, pelas redes sociais. Aqueles que pensavam em fazer uma manifestação pacífica acabaram se envolvendo num movimento muito bem planejado. Com qual finalidade política? 

Juntando a minuta do golpe que foi encontrada, parece uma história que está sendo desvendada, não é? 

Sim, o Supremo está apurando tudo isso. Existem delações premiadas, depoimentos, investigações à Polícia Federal. E essa é a conclusão de conhecimento público hoje, porque o Supremo quebrou o sigilo. Tudo que acontece ele divulga. Acredito que muitos queriam apenas fazer um protesto, só que havia também um grupo extremista que queria outra coisa. Tanto que uma parte se dirigiu ao prédio do Congresso, depois ao prédio do Palácio do Planalto, e em seguida ao Supremo Tribunal Federal. Eles dividiram as pessoas, isso mostra que realmente houve planejamento, que havia alguém coordenando a manifestação. 

O STF está investigando os atos antidemocráticos e vai julgar também o que ele próprio investiga. Como é que o senhor vê isso? 

Quem mais está investigando é a Procuradoria Geral da República, o Ministério Público e a Polícia Federal, por ordem do Supremo. Um conjunto de tarefas da Procuradoria e a ação penal cabe ao Supremo Tribunal Federal aplicar a lei ao caso concreto. Cada um deverá responder na medida de sua culpabilidade. De acordo com essas provas, alguns estão sendo condenados a um ano de reclusão, pena substituída por prestação de serviço à comunidade. E o Supremo está até determinando a realização de cursos sobre democracia, para essas pessoas. Outras estão sendo condenadas a penas altas entre 15 e 17 anos, e outras ainda não foram julgadas. As ações ainda estão em tramitação. O Estado está dando a resposta ao que aconteceu, e precisa, porque nós vivemos no Estado Democrático de Direito, nós temos legislação a cumprir. Não podemos fechar os olhos para a destruição do patrimônio público que aconteceu.

O senhor acha que o ex-presidente Jair Bolsonaro teve participação nesse planejamento, uma vez que ele estava fora do país? 

Eu não posso afirmar nada sobre X ou Y, não posso mencionar nomes aqui, porque isso está sendo apurado. Então, seria muito irresponsável se dissesse que fulano é culpado ou é inocente. Estou como juiz, como desembargador e como ex-presidente do TRE-DF, aguardando o resultado final dessa apuração. Tenho convicção de que a nossa legislação vai ser aplicada aos culpados. 

O senhor acha que houve falha na segurança? 

O mês de janeiro era festivo. As pessoas estavam comemorando a posse do presidente, governador e os deputados e senadores se preparando para a posse. O episódio de dezembro (ameaça de explosão no aeroporto de Brasília) realmente preocupou o setor de segurança. Isso era um sinal de que as atenções tinham que ser maiores naquele momento político. A segurança fez um planejamento, mas houve falha. O próprio setor reconhece que houve falha na execução do planejamento. Eu não posso dizer que não houve falha. Se o planejamento tivesse sido realmente executado, não teria ocorrido a invasão.

Inclusive no Batalhão da Guarda Presidencial, que tinha de fazer a segurança do Palácio do Planalto, não é? 

Houve falha em todas as áreas da segurança, isso ninguém nega. Se nós tivéssemos dobrado o número de policiais, se não tivéssemos permitido o acesso à Esplanada dos Ministérios, isso não teria acontecido. A culpa é de quem? Está sendo apurado. Agora eu penso o seguinte: algumas pessoas que trabalharam na segurança não devem ser responsabilizadas por dolo. Eu conheço muitos que trabalharam. E eu não tenho condições de falar que eles agiram de má-fé. Não acredito, porque conheço muitas pessoas honestas ali da Polícia Militar, das Forças de Segurança, que trabalharam corretamente. 

É o caso do coronel Fábio Augusto Vieira, ex-comandante-geral da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)? 

O coronel apareceu na imprensa sangrando, ele foi agredido, jogaram um objeto na cabeça dele. Quarenta PMs ficaram feridos, eles tentaram impedir essa manifestação. Então eu não posso, aqui, jogar a culpa em fulano e afirmar que ele é culpado, que agiu dolosamente. Agora, que houve falha, não posso negar. Se não tivesse ocorrido essa falha, nós não estaríamos falando sobre isso agora. 

Como é que o senhor avalia a atuação do ministro Alexandre de Moraes? Como relator dos inquéritos no STF que tratam do 8 de janeiro, o senhor acha que ele tem muito poder? 

O ministro Alexandre era presidente do TSE e eu presidente do TRE. O compromisso da Justiça Eleitoral era promover eleições transparentes, limpas, corretas, e dar posse ao candidato escolhido pelo povo. Isso foi feito. Não houve prova de nenhuma fraude em urna eletrônica, isso não ocorreu no Brasil. As urnas provaram que fulano foi o candidato eleito, então ele mereceu, teve mais votos. Eu não posso fazer nenhum comentário negativo sobre o trabalho do ministro ou alguma crítica, porque eu acompanhei diariamente o trabalho dele, sempre pensando em fazer o melhor e o correto e o legal para a Justiça Eleitoral brasileira. O ministro Alexandre tem muitos poderes dados pelo Supremo Tribunal Federal. Entendo que ele está cumprindo a obrigação dele, está cumprindo a Constituição, apurando o que aconteceu. É tarefa dele, é missão dele.

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira

Assista à entrevista

Henrique Sucena
postado em 07/01/2025 06:00
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