Crime organizado

Contradição e invenção: veja o que disseram os presos por ataque a caminhão

Justiça determina que quatro suspeitos de terem envolvimento com bando da facção criminosa Comboio do Cão, que matou vigilante em tiroteio, terça-feira, em um posto na BR 070, deixem DPE nos próximos dias

Traficantes que planejaram ataque a caminhão passam por custódia e vão para a Papuda -  (crédito: Material cedido ao Correio )
Traficantes que planejaram ataque a caminhão passam por custódia e vão para a Papuda - (crédito: Material cedido ao Correio )

Quatro homens, acusados pela polícia de serem traficantes e de envolvimento na tentativa de assalto a um caminhão de carga, que terminou com um vigilante assassinado, no posto Nova Colina, em Taguatinga, — na terça-feira — tiveram prisões preventivas decretadas pela Justiça, ontem. Cleomar Marcos da Silva, 41, motorista do veículo; Francisco de Assis Bispo de Jesus, 40; José Eraldo Dutra Bezerra, 36; e Sidney Cardosa Passos, 35, foram indiciados por latrocínio (roubo com morte). A preventiva foi decretada após audiência de custódia. Eles devem ser trasladados do Departamento de Polícia Especializada (DPE), nos próximos dias, ao Complexo Penitenciário da Papuda.

Conforme o Correio divulgou, com base em informações dadas por fontes da área de segurança pública, o grupo teria agido em conjunto para abastecer o Distrito Federal com mais de 400kg de skunk — que vinha na carreta. A droga é conhecida como "supermaconha" pelo alto teor de Tetrahidrocanabinol (THC), substância presente na Cannabis — planta da maconha —, que pode causar alterações psíquicas em quem a consome. As autoridades disseram que o entorpecente seria entregue à facção criminosa Comboio do Cão, organização à qual o quarteto, supostamente, está faccionado.

  • Mais de 400kg de skunk, a
    Mais de 400kg de skunk, a "supermaconha", estavam entre caixas de televisores carregadas em um caminhão vindo de Manaus (AM) Material cedido ao Correio
  • raficantes que planejaram ataque a caminhão passam por custódia e vão para a Papuda
    raficantes que planejaram ataque a caminhão passam por custódia e vão para a Papuda Material cedido ao Correio
  •  10/12/2024. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF. Caminhão que foi alvo de assalto na Br 070 transportando maconha chegando a sede da Polícia Civil na DPE.
    10/12/2024. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF. Caminhão que foi alvo de assalto na Br 070 transportando maconha chegando a sede da Polícia Civil na DPE. Minervino Júnior/CB/D.A.Press

Segundo investigadores, a transação não foi concluída devido à ação de dois vigilantes armados. Eles acompanhavam o caminhão, onde acreditavam haver apenas televisores, e, aparentemente, ignoravam que junto aos eletrônicos em outras caixas havia droga. Há indícios de que a quadrilha — que testemunhas do atentando afirmam portava fuzis — não esperava uma reação firme da segurança, feita pelos funcionários de uma empresa contratada pelo dono das televisões, e composta por só duas pessoas sem armas potentes. A polícia não considera, até o momento, que prestadora do serviço de entrega e o dono dos aparelhos soubessem do skunk.

Depoimentos prestados pelos quatro investigados na Coordenação de Repressão aos Crimes Patrimoniais (Corpatri) apontaram inconsistências e aumentaram as suspeitas dos investigadores contra esses acusados.

Contradições

A conduta que mais chamou a atenção, até agora, foi a do motorista. Cleomar Silva. Ele foi contratado para dirigir o caminhão partindo, há poucos dias, de Manaus (AM) rumo ao destino final: o município de Serra (ES). No último domingo, quando passava pelo estado de Tocantins, Silva ligou para a transportadora informando ter sofrido uma tentativa de assaltado, história que a polícia do DF considera ser falsa. No dia desse contato telefônico, informado do ocorrido, o dono das televisões contratou uma equipe de escolta para acompanhar os produtos e garantir a entrega em segurança.

Ao Correio, investigadores revelaram, que, enquanto estava em Tocantins, o condutor teria despertado a atenção dos vigilantes ao ser flagrado conversando com dois homens de modo suspeito. Eles seriam Sidney Passos e José Bezerra. À polícia, Passos disse ser primo de Silva e que foi ao encontro dele, acompanhado de Bezerra, para prestar assistência. Esse familiar, segundo as investigações, ainda teria sido informado pelo parente da tentativa de assalto e que os criminosos o obrigaram a usar drogas.

Por sua vez, Bezerra teria negado, em seu depoimento, envolvimento com qualquer ação ilegal. Confirmou que acompanhou Passos a fim de ajudar Silva e que, após encontrá-lo, pernoitaram em Uruaçu (GO), entre a última segunda-feira e ontem, quando se deu o ataque no DF. Assegurou que se mantiveram em território goiano, saindo da cidade onde dormiram rumo a Pirenópolis (GO), por volta das 6h da manhã, para encontrar a esposa. Bezerra, em suas declarações, teria destacado que no caminho, ele e Passos foram abordados por militares do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e conduzidos à Corpatri. Mas, para o Correio, policiais asseguraram não ter dúvidas do envolvimento dos dois no delito.

Plano frustrado

Autoridades ligadas ao caso contaram que a facção, mesmo ciente da escolta armada, não recuou e se posicionou no posto Nova Colina, na BR-070, para esperar a carga. O plano era passar a droga do caminhão para os carros em que estavam.

Quando o veículo chegou ao local, em Taguatinga, por volta das 4h da última terça-feira, os dois seguranças viram a movimentação e reagiram a disparos feitos pelo bando que os aguardava e, supostamente, integra o Comboio do Cão, segundo a polícia. O vigilante Ronivon Lima Dias, 41, morreu na hora, atingido por balas. O outro segurança — que não teve o nome divulgado — encontra-se internado, em estado grave, no Hospital Regional de Ceilândia (HRC).

Após o tiroteio, forças de segurança foram mobilizaram para localizar os agressores e outros suspeitos. A operação, além da prisão do motorista, localizou dois automóveis que, supostamente, foram usados pelo grupo criminoso: um HB20 — encontrado carbonizado, em um terreno baldio, no Sol Nascente— e um Zafira, conduzido por Francisco de Assis Bispo, próximo ao Jóquei Clube, na região da Estrutural. Ele disse que foi contratado para "dar fim" ao carro".

 


Facção x armas

"O poder de destruição de armas de grosso calibre coloca grandes quantidades de pessoas em risco uma vez que possui um alcance muito maior do que revólveres e pistolas, inclusive criando uma barreira e um distanciamento das forças policiais normais, ou seja, grupos que não têm treinamento ou equipamento que façam frente a esses agressores. Nesse caso falamos de mais de 90% dos profissionais de segurança que atuam na proteção da população. Junto a isso, são armamentos utilizados para grandes operações do crime organizado, como roubos a banco, ataques a carro-forte e roubo de carga, crimes com maior possibilidade de lucro.

Essas armas ingressam pela grande fronteira seca do Brasil com outros países do Mercosul ou por intermédio de regiões portuárias, onde o narcotráfico e facções criminosas se valem do seu grande poder econômico para aliciar grupos envolvidos nesse tipo de contrabando. Esse esquema ilícito sofre impacto, primordialmente, a partir de investimento em inteligência, onde forças estaduais e federais de segurança ainda carecem de maior investimento. Outros pontos de atenção ficam no esvaziamento da economia do crime, dando um golpe no que financia a aquisição desse material bélico; e adicionalmente em melhorias nos investimentos direcionados a inovação tecnológica para a segurança pública , capacitação, treinamento, conexão e intercâmbio Entre as forças de segurança nacionais e internacionais."

Leonardo Sant'Anna, especialista internacional em segurança e ex-subsecretário de Segurança do DF

 

Darcianne Diogo
postado em 12/12/2024 06:00
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