ENTREVISTA

"FCDF está além da ideologia. É a manutenção da capital", diz Celina Leão

Ao CB.Poder, integrante do PP contou que tem feito reuniões com líderes e presidentes de partidos para preservar os recursos do FCDF e reforçou que a proposta do governo federal sobre cortes "é mais um erro de quem não conhece a realidade da capital do país"

Entrevista com a vice-governadora Celina Leão para o CB.Poder -  (crédito: Pedro Santana/CB/D.A Press)
Entrevista com a vice-governadora Celina Leão para o CB.Poder - (crédito: Pedro Santana/CB/D.A Press)

A vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP), disse que tem feito reuniões com líderes e presidentes de partidos para impedir o reajuste e a mudança na forma de cálculo da correção anual do Fundo Constitucional do DF (FCDF). Em entrevista às jornalistas Ana Maria Campos e Denise Rothenburg, no programa CB.Poder — parceria entre o Correio e a TV Brasília —, ela afirmou que o Fundo é "para a contratação direta. Você contrata o profissional, policial, enfermeiro, médico, o técnico de enfermagem e reajusta salários. Tudo é com esse dinheiro.”

Como está sua articulação com os líderes para tentar impedir a aprovação do reajuste do FCDF?

O governador Ibaneis Rocha (MDB) começou a fazer várias ações e visitas, e eu o acompanhei. Continuamos juntos nessa caminhada, porque até isso — o reajuste — ser efetivamente retirado do projeto, não podemos descansar. Não há nenhum descanso para o Governo do Distrito Federal (GDF). E isso não é para nós, que estamos nesta gestão. Estou falando aqui da permanência dessa cidade com governabilidade. É tão sério o que estamos vivendo que, talvez, as pessoas ainda não entenderam o que é o Fundo Constitucional. Isso vai afetar a vida de todo mundo que vive ou que viverá no DF.

A senhora esteve hoje de manhã com os líderes, na casa do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), e discutiu este assunto. Qual foi a resposta dos líderes?

Os partidos que nós visitamos sinalizaram o acordo de retirada dessa parte — a forma de cálculo da correção anual do FCDF — do Fundo Constitucional.

E quais são esses partidos?

Progressistas, o meu partido; o MDB, partido do governador Ibaneis Rocha; União Brasil, PSD e PL. Com esses partidos, teríamos a maioria para irmos para o plenário (barras a proposta). Mas queremos a unanimidade. Esse é um projeto que precisamos de 100% da consciência dos líderes. Não é ganhar (apenas). (...) Isso está além de ideologia partidária e de quem você vai votar em 2026. É a manutenção da cidade, da capital da República.

Para as pessoas que estão nos acompanhando entenderem melhor, o que está em discussão é o seguinte: a mudança na correção do Fundo Constitucional, que ano a ano é calculado e são os repasses da União para o DF, para a manutenção das áreas de saúde, segurança e educação. Atualmente, esse repasse é reajustado de acordo com a receita da União e passaria a ser reajustado pelo IPCA — Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo. Fizemos uma matéria sobre o levantamento da Secretaria de Economia do DF, que mostra que, se esse fundo fosse reajustado dessa forma desde o começo, o DF teria deixado de receber R$ 106 bilhões em 22 anos. É muito dinheiro, não é?

É muito dinheiro. Quando foi criada, a lógica não foi da cabeça do governador à época. Foi de um presidente da República que entendia o que é sediar os Três Poderes, que era Fernando Henrique Cardoso. Ele tinha dimensão e uma equipe econômica de excelência. Teve um legado na parte da economia que colhemos até hoje. Quando o Fundo foi criado, ele estava dentro de uma lógica. Para a população que está nos assistindo, qual era a lógica? Receita corrente líquida. O que é isso? Você pega tudo que recebe de tributos, diminui tudo que terá de gastos, e sobra uma receita. Ele dá um percentual, que é de 2% a 3%, e isso é reajustado em cima desse cálculo. E qual era a lógica disso? Se o Brasil crescer, a capital da República com certeza irá crescer e terá que dar suporte a isso. Se o Brasil economicamente encolher, a capital também teria que dar seus pulos e conseguir segurar a economia local.

A equipe do presidente Lula, impressão que a gente tem, especialmente o ministro da Casa Civil, Rui Costa, compara o Fundo do DF com os outros fundos de desenvolvimento constitucionais, como o do Nordeste e Norte. Qual sua avaliação sobre isso?

É mais um erro de quem não conhece a realidade do DF e que não conhece realmente a realidade da capital da democracia. Se falam tanto em democracia, precisavam aprofundar nesse tema. Quando eu falo aqui de um fundo de investimento, se ele acontecer ou não, não vou deixar gente morrendo nas filas de hospitais, não vou deixar uma segurança pública que tem que dar, por seu dever, segurança ao corpo diplomático, poderes da República e à capital da República.

É diferente de um fundo de incentivos fiscais, não é?

Sim. O incentivo é para você incentivar o crescimento. O Fundo Constitucional do DF é recurso na veia. Ele é para a contratação direta. Você contrata o profissional: policial, enfermeiro, médico, o técnico de enfermagem e reajusta salários. Tudo é com esse dinheiro. Porque Brasília não tem ainda uma condição econômica de se manter sozinha. A capital da República foi criada com essa vocação, com a União mantendo ela. Desde Guanabara, desde quando a capital era no Rio de Janeiro, que ela é mantida pela União.

Essa discussão é suprapartidária, não é? Mas dependeremos dos partidos para que isso seja votado no Congresso. Porque, pelo andar da carruagem, o presidente Lula não vai retirar a proposta. Porque a cúpula do Palácio do Planalto não deseja que essa proposta saia do pacote de contenção de gastos. Como é que vai ser feito, então? Os líderes partidários toparam? Já têm votos suficientes para derrubar isso no plenário? Quantos votos são necessários para tirar isso do projeto?

Para que a população entenda, houve uma série de pacotes. Tem uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que é um projeto maior. E esse PL, inclusive, é proposto por um deputado do PT, que é o líder do partido (José Guimarães). Em que se fala sobre vários outros artigos. Entramos nesse projeto, até como um "jabuti". É meio estranho a técnica legislativa usada para inserir o DF naquele projeto. Ele deveria ser rejeitado na CCJ — Comissão de Constituição e Justiça — por técnica legislativa, porque a CCJ fala de Constituição, justiça e de técnica legislativa. Esse tema é aleatório. Talvez, pensassem que fosse colocar ali e que ninguém fosse ver, não sei qual foi o entendimento. Porque o projeto começa falando de biometria, fala de Benefício de Prestação Continuada (BPC) e no artigo sétimo chega ao Fundo Constitucional.

Mas já têm os votos para tirar?

Nesse momento, temos a palavra de todos os presidentes desses partidos (citados acima). Eu conheço esses líderes. Quando apalavram algo, é o que vale naquele poder. Mas não queremos algo que seja uma ruptura. Queremos algo que seja consenso, para não voltarmos a essa discussão novamente. Porque você não pode pegar alguém… Com todo respeito ao Rui (Costa), ele foi governador de um estado (Bahia) que é superviolento (defensor da proposta). Mas a Bahia não é a capital do Brasil (para ter o FCDF). A Bahia não hospeda os poderes. Lá não tem Superior Tribunal de Justiça (STJ), Supremo Tribunal Federal (STF). Não tem embaixadas. E não temos aquela praia linda, o turismo e o carnaval. Sem você fazer revanchismos, é necessário você ter uma outra ótica sobre o DF. Brasília é a representação da democracia. É a única cidade moderna tombada do mundo. É uma cidade que precisa ter um olhar especial. Se querem discutir com a gente outras situações sobre a nossa segurança pública, não é retirando o nosso Fundo Constitucional.

Falamos sobre o FCDF e segurança pública. E a PEC da Segurança? A senhora teve uma reunião com o presidente Lula, foi bem contundente na defesa de algumas mudanças também na área de segurança. Como é que a senhora está vendo essa PEC? O que tem de bom e o que precisa ser mudado?

Tive a oportunidade de falar ao presidente Lula. A gente precisa mudar outras leis infraconstitucionais. A PEC não resolveria o nosso problema. Temos uma legislação que é permissiva, ela protege o reincidente. É complicado trabalhar e minimiza, às vezes, valores em pequenos furtos e coloca até com algumas jurisprudências. Isso precisa ser melhorado e ser enfrentado no Brasil de frente. E foi isso que eu falei para o presidente Lula. Ninguém aguenta mais. A Polícia Militar prende 40 vezes e o Judiciário solta.

 

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira

 

Luis Fellype Rodrigues*
postado em 11/12/2024 06:00
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