FEMINICÍDIO

Feminicídio: 20ª vítima deste ano no DF é morta a facadas em Samambaia

Maria Mayanara Lopes Ribeiro, 21 anos, foi atacada em casa, no assentamento Rosa Luxemburgo. Socorrida pelos vizinhos, ela não resistiu aos ferimentos. Principal suspeito é o companheiro dela, Daniel Silva Vitor, 43, que segue foragido

Mais uma mulher foi brutalmente assassinada no Distrito Federal. A 20ª vítima de feminicídio deste ano, Maria Mayanara Lopes Ribeiro, 21 anos, foi espancada e esfaqueada na noite desta quinta-feira, em casa, no assentamento Rosa Luxemburgo, em Samambaia Norte. O principal suspeito é o companheiro dela, Daniel Silva Vitor, 43, que segue foragido. É o segundo caso desse tipo somente nesta semana. Na segunda-feira, a pedagoga Denise Rodrigues, 30, também morreu, assassinada pelo ex-companheiro, Adriel Teixeira, 29, que tirou a própria vida após o crime. Em 2023, foram registrado 33 feminicídios no DF.

Familiares ouvidos pelo Correio contaram que o casal estava junto havia seis meses. Segundo eles, o relacionamento era marcado por brigas constantes e um sentimento de posse por parte de Daniel. "Ele não deixava ela sair de casa sozinha, só permitia se fosse com ele, e também não deixava ela trabalhar. Era um ciúme doentio", relatou o irmão da vítima, que preferiu não se identificar. 

O irmão de Mayanara relatou que ela vivia com medo constante do companheiro, que teria ameaçado matar membros da família da mulher, caso o relacionamento terminasse. "Minha mãe já tinha pedido várias vezes para ela ir embora, porque eles brigavam constantemente, e isso fazia mal para ela", detalhou.

Noite de horror

A escalada de violência doméstica sofrida pela vítima resultou num crime brutal. De acordo com a família, na noite do crime, Daniel chegou em casa embriagado por volta das 18h e viu Maria falando ao celular com uma pessoa. Num ataque de fúria, teria começado a espancar a companheira. A jovem conversava com a mãe, que, do outro lado da linha, ouviu, impontente, os gritos de desespero da filha. "Minha mãe conseguiu escutar minha irmã gritando por socorro. Foi então que começaram as agressões físicas", contou o irmão de Mayanara.

Temendo pela segurança dos filhos — um menino de 1 ano e uma menina de 3 —, a jovem ainda tentou empurrar o agressor para fora da residência. O suspeito, no entanto, teria continuado a esfaqueá-la no rosto e pescoço. Os vizinhos do casal testemunharam toda a ação e tentaram impedir o ataque, mas Daniel já teria desferido os golpes fatais. 

Ele fugiu antes da chegada da polícia e segue foragido. Maria foi socorrida por vizinhos e levada ao posto do Corpo de Bombeiros (CBMDF), na BR-060, mas não resistiu aos ferimentos e morreu, antes mesmo de chegar ao hospital.

Nascida em Tangará, no Rio Grande do Norte, há um ano a vítima se mudou para o assentamento, onde conheceu o agressor. Ele mantinha um barraco na região e, segundo moradores, apresentava comportamento violento.  

A Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) isolou o local e realizou patrulhamento para tentar localizar o suspeito, sem sucesso. A 32ª Delegacia de Polícia (Samambaia Sul) investiga o caso como feminicídio e busca capturar o suspeito do crime.

Passado violento

Segundo documentos judiciais obtidos pelo Correio, Daniel carrega um histórico de violência. O suspeito do assassinato de Maria Mayanara foi alvo de medidas protetivas solicitadas pela ex-mulher, Sara Santana da Silva, em razão de ameaças, ofensas e agressões físicas durante os três anos em que viveram juntos. Apesar dos frequentes ataques, ela nunca procurou a polícia por medo do agressor, que possui diversas passagens policiais, inclusive, por homicídio. A mulher relatou que ele era usuário de drogas e álcool.

Após se separar, Sara voltou a encontrar o homem, no início deste ano, vivendo em situação de rua, na região do cemitério de Sobradinho, local onde ele costumava dormir. Ela, então, o ajudou a encontrar abrigo no assentamento Rosa Luxemburgo. 

Apesar do auxílio, quando a encontrou novamente no acampamento,  em 14 de setembro, por volta das 12h, Daniel passou a ofender a ex-companheira. Segundo Sara, sem motivo aparente, ele se exaltou e disse que a mataria caso ela voltasse ao local. Além das ameaças, ele teria proferido ofensas, como "gorda escrota".

Amedrontada pelas ameaças, a mulher deixou o local e não retornou mais. Ela teria alertado Joana, mãe de Mayanara, sobre o perigo que a filha corria ao conviver com Daniel, mas não foi ouvida. 

Ciclo de ódio

A defensora pública e ativista pelos direitos das mulheres Verônica Acioly de Vasconcelos destaca que os casos de feminicídio possuem causas complexas, envolvendo fatores culturais, estruturais e profundamente enraizados em nossa sociedade. "Entre eles, podemos citar a desigualdade de gênero, a cultura patriarcal perpetuada pela mídia e pela sociedade, a reprodução de padrões estereotipados no ambiente familiar e o avanço de uma pauta conservadora que reforça a inferiorização da mulher", aponta Verônica.  

Para enfrentar o aumento da violência de gênero, a defensora enfatiza que a solução começa pela educação desde a primeira infância. "É fundamental introduzir disciplinas que promovam uma perspectiva de gênero igualitária, além de políticas públicas que não se limitem à repressão, mas que também utilizem psicologia e assistência social para promover reflexões nos agressores. É igualmente necessário fortalecer as instituições, garantindo que elas adotem uma cultura verdadeiramente igualitária em sua atuação", defende.  

A advogada e especialista em violência doméstica Andréia Limeira Waihrich reforça que o aumento nos casos de feminicídio tem raízes complexas e multifacetadas, exigindo uma análise profunda para compreender suas origens e desenvolver soluções eficazes. "Não estamos lidando com eventos isolados, mas com o reflexo de uma cultura enraizada na desigualdade de gênero e na naturalização da violência contra a mulher. Entre os fatores que agravam esse cenário estão o machismo estrutural, os padrões culturais que subordinam a mulher ao homem, a banalização da violência doméstica, a dificuldade de acesso à Justiça e a falta de suporte efetivo às vítimas", explica.  

Andréia também destaca que a impunidade em casos anteriores contribui para um ciclo de violência que precisa ser interrompido. "A prevenção do feminicídio exige uma abordagem multidisciplinar e ações em diferentes frentes. A educação tem um papel crucial na desconstrução de estereótipos de gênero e na promoção de relações igualitárias desde cedo. Campanhas de conscientização abrangentes, que alcancem todos os segmentos da sociedade, são igualmente essenciais. Além disso, é indispensável fortalecer os mecanismos de denúncia, garantindo acolhimento e proteção às vítimas, e investir em programas de reabilitação para agressores", conclui.

 

Mais Lidas

Material cedido ao Correio - Daniel Silva Vitor, 43, autor de feminicídio em Samambaia
Material cedido ao Correio - Maria Mayanara Lopes Ribeiro, 21. Vítima de feminicídio em Samambaia

Vítimas da violência

1- 10/01: Tainara Kellen, no Gama;

2- 15/01: Diana Faria, em Ceilândia;

3- 17/01: Antônia Maria da Silva Carvalho, no Recanto das Emas;

4- 25/01: Milena Rodrigues, em Santa Maria; caso, inicialmente, foi registrado como homicídio;

5- 05/02: Erica Maria de Jesus, no Paranoá;

6- 13/05: Simone Santos Ribeiro, no Itapoã;

7- 25/05: Daniella Di Lorena Pelaes, no Jardim Botânico;

8- 31/05: Zely Alves Curvos, de 94 anos, em Águas Claras;

9-15/06: Jania Delfina de Assis, na Estrutural;

10- 17/07: Fernanda dos Santos Pereira, em São Sebastião;

11- 06/08: Rosemeire Campos, no Gama;

12-12/08: mulher de identidade ainda não confirmada morre carbonizada na Estrutural; caso, inicialmente, foi registrado como homicídio;

13- 20/08: Juliana Barboza Soares, no Gama;

14- 25/08: Daíra dos Santos Rodrigues, no Itapoã;

15- 28/08: Thaynara Iorrana da Silva Matheus, em Ceilândia;

16- 30/09: Paloma Jenifer Santos Ferreira, em Vicente Pires;

17- 20/10: Fabiane Araújo, em Taguatinga;

18- 27/10: Jucelia dos Santos da Silva, no Sol Nascente;

19- 11/11: Denise Rodrigues de Oliveira, em Vicente Pires;

20- 14/11: Maria Mayanara, em Samambaia.

Onde pedir ajuda

Ligue 190: Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). Uma viatura é enviada imediatamente ao local. Serviço disponível 24h por dia, todos os dias. Ligação gratuita.

 

Ligue 197: Polícia Civil do DF (PCDF)

E-mail: denuncia197@pcdf.df.gov.br

WhatsApp: (61) 98626-1197

Site: https://www.pcdf.df.gov.br/servicos/197/violencia-contra-mulher

 

Ligue 180: Central de Atendimento à Mulher, canal da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres. Serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes, além de reclamações, sugestões e elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento. A denúncia pode ser feita de forma anônima, 24h por dia, todos os dias. Ligação gratuita.

 

Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher (DEAM): funcionamento 24 horas por dia, todos os dias.

DEAM 1: previne, reprime e investiga os crimes praticados contra a mulher em todo o DF, à exceção de Ceilândia.

Endereço: EQS 204/205, Asa Sul.

Telefones: 3207-6172 / 3207-6195 / 98362-5673

E-mail: deam_sa@pcdf.df.gov.br


DEAM 2: previne, reprime e investiga crimes contra a mulher praticados em Ceilândia.

Endereço: St. M QNM 2, Ceilândia

Telefones: 3207-7391 / 3207-7408 / 3207-7438

Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

Whatsapp: (61) 99656-5008 - Canal 24h

 

Secretaria da Mulher do DF

Subsecretaria de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres (Subev)

— Subsecretária: 3330- 3109

— Assessoria: 3330-3118/3105


Subsecretaria de Promoção das Mulheres (SUBPM)

Telefone: 3330-3116 / 3148


Casa da Mulher Brasileira

— Recepção, térreo: 3371-2897

— Acolhimento e Triagem, 1º andar: 3371-2637

— Empreende Mais Mulher, 2° andar: 3373-1120/ 98199-1146

— Coordenação da Casa da Mulher Brasileira, 3º andar: 3371-0212


Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT)

Promotorias nas regiões administrativas do DF

https://www.mpdft.mp.br/portal/index.php/promotorias-de-justica-nas-cidades



Núcleo de Gênero

Endereço: Eixo Monumental, Praça do Buriti, Lote 2, Sala 144, Sede do MPDFT

Telefones: 3343-6086 e 3343-9625— Defensoria Pública do DF


Núcleo de Assistência Jurídica de Defesa da Mulher (Nudem)

Endereço: Fórum José Júlio Leal Fagundes, Setor de Múltiplas Atividades Sul, Trecho 3, Lotes 4/6, BL 4 Telefones: (061) 3103-1926 / 3103-1928 / 3103-1765

WhatsApp (61) 999359-0032

E-mail: najmulher@defensoria.df.gov.br

http://www.defensoria.df.gov.br/nucleos-de-assistencia-juridica/