A primeira prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi aplicada ontem em todo o país. Neste ano, o Distrito Federal registrou 74.366 inscritos. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 100% dos estudantes da capital que concluem, neste ano, o ensino médio em escola pública inscreveram-se para a prova, enquanto no ano passado, o dado ficou em 68,8%. Até o fechamento desta edição, o Inep não havia divulgado os dados de abstenção por estado.
Neste ano, por meio do Pé-de-Meia, o governo prometeu pagar aos estudantes que comparecerem aos dois dias de prova do Enem a quantia de R$ 200. Em coletiva de imprensa na manhã de ontem, o presidente Lula afirmou que "quanto mais pessoas forem aprovadas, melhor". O ministro da Educação, Camilo Santana, enfatizou em diversos momentos o aumento expressivo do número de inscritos no exame e relacionou o crescimento ao programa.
A reportagem do Correio percorreu alguns dos principais pontos onde o exame foi aplicado. No Centro Universitário de Brasília (Ceub), na Asa Norte, no Centro Universitário Planalto do Distrito Federal (Uniplan), em Águas Claras, e na União Pioneira de Integração Social (Upis), Asa Sul, o movimento foi intenso.
No fim da tarde, o clima de tensão deu lugar ao alívio na saída dos candidatos que realizaram a primeira etapa do Enem 2024. À medida que os estudantes deixavam o local, era possível ver expressões variadas — alguns pareciam aliviados, enquanto outros demonstravam cansaço e preocupação, discutindo as questões e a tão esperada redação.
A publicitária Adriana Mello, 57 anos, fez a prova pela primeira vez e a classificou como cansativa e complexa. "Estou fora do ambiente escolar e achei muito difícil. Quando falamos de língua portuguesa, não cai nada sobre verbo ou pronome. É muito texto e é preciso vasto conhecimento e estudo para desenvolver as questões. Apesar de não estar confiante, não vou desistir. Se não for desta vez, tentarei no próximo ano", afirmou.
O Correio conversou com o servidor público Raul de Lima, 47, antes e ao término da prova. Ele encarou o Enem com o objetivo de completar um ciclo em sua jornada acadêmica. Com graduações em administração, pedagogia e um curso de matemática em andamento, ele busca concluir ciência da computação, curso que iniciou na juventude. "Quero fechar esse ciclo. Sempre sonhei em terminar esse curso, mas não pude quando era jovem. Agora é a hora", afirmou. Lima achou a prova muito extensa e preferiu iniciá-la pela redação.
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Milhões de estudantes tiveram de construir uma redação dissertativa-argumentativa sobre Desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Geovani Fama, professor de língua portuguesa do Colégio Maple Bear, analisou que o tema segue o padrão dos que foram impostos em edições anteriores. "Como de costume, o Inep abordou uma temática que gera reflexões sociais de nível nacional e requer uma proposta de intervenção que procure motivar os futuros estudantes de ensino superior a dirimir questões sociais que ainda carecem de plena abordagem social. O intuito do Instituto não é resolver o problema. Longe disso! O objetivo é que percebam as persistentes adversidades sociais brasileiras e procurem perspectivas de reduzir suas consequências", ensinou.
A professora de língua portuguesa Tatiana Soares Vidal, do Colégio Maple Bear, observou que o Enem tem apresentado cada vez menos autores clássicos da literatura. "Este ano, houve uma questão sobre São Bernardo, de Graciliano Ramos, e uma sobre Senhora, de José de Alencar. No entanto, eram questões extremamente fáceis, com trechos para interpretação que não exigiam um conhecimento mais profundo das obras. Vejo isso como um problema, pois acaba desestimulando o aluno a ler esses livros", avaliou.
Professor de geografia, Gibrailto Soares da Silva avaliou as questões da matéria. "Havia uma forte presença de temas ambientais e do desafio do Brasil em lidar com as questões climáticas. A prova também abordou temas relacionados a grupos minoritários, ou seja, teve um viés social bastante evidente. Tudo foi tratado de maneira clara, sem ambiguidade, com questões objetivas e de abrangência interessante", explicou.
O professor de filosofia e sociologia Patrick Saldanha relata que em filosofia, caiu filosofia antiga e filosofia contemporânea. "Eu acho que despencou a filosofia contemporânea. Então, para os alunos que estavam fazendo o terceiro ano agora, eu acho que foi uma prova mais tranquila, porque o assunto ainda estava fresco. De sociologia, caiu muita questão sobre democracia e sobre movimentos sociais", avaliou.
Já o professor Fred Rosenthal avaliou que, no âmbito da disciplina de história, a prova fugiu do tradicional. "Não teve questões ligadas a guerras e eventos históricos e eu esperava que caísse mais sobre Brasil República e contemporâneo, sobre ditadura militar, mas não. Os alunos tiveram dificuldade de reconhecer as aulas nas questões por conta da fuga da tradição."
'Pais corujas'
Pela manhã, os candidatos chegavam acompanhados de familiares e amigos, carregando o nervosismo e a expectativa da aprovação. O clima, porém, não era somente de tensão. A solidariedade também era compartilhada entre os estudantes, que trocaram palavras de encorajamento e revisões rápidas dos conteúdos antes de despedirem-se para entrar no local de prova.
Preocupados com o desempenho e conforto dos filhos, alguns pais fizeram questão de acompanhá-los. José Brandão, pai de Guilherme Brandão, de 16 anos, que cursa o 2° ano do ensino médio e fez a prova como treineiro, disse que sua presença era fundamental para dar apoio moral ao filho. "Essa geração é muito ansiosa, então é importante ajudar nessa parte", declarou. O jovem declarou que, apesar de ter estudado muito, estava ansioso.
A auditora Alessandra Pinheiro, 47, também acompanhou a filha Fernanda, 16. "Ela vem fazendo o Enem desde o ano passado para ir treinando. Mesmo assim, a expectativa é grande e estamos todos na torcida para que ela vá bem, já que quer fazer medicina", explicou Alessandra. Ela revelou que o pai e os avós de Fernanda ficaram em casa reunidos, aguardando notícias sobre o desempenho da jovem.
Atrasos
A Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) permitiu, ontem, a rotatividade de mais ônibus nas linhas que passam pelas instituições de ensino onde as provas eram realizadas. A frota foi aumentada duas horas antes do início do exame e duas horas após o término.
Apesar disso, Alexandra Feitosa, 49 anos, teve de passar três horas no transporte público para chegar até o local de prova. Ela foi barrada nos portões principais por um atraso de oito minutos. Atualmente desempregada, contou que precisou pegar dois ônibus para sair de sua casa, às 10h10, no setor de chácaras de Pedregal, bairro do Novo Gama (GO), e chegar até a Upis às 13h08.
A mulher disse que faz o Enem anualmente há cerca de três anos e que o local de prova costuma ser em áreas próximas de onde mora, mas que neste ano foi designada para longe sem uma justificativa clara. Seu sonho é cursar o ensino superior. "Se Deus me der condições, um dia eu quero fazer uma faculdade de criminologia", contou emocionada.
A jovem de 17 anos Kesia Magalhães, moradora do Varjão, explicou que chamou um carro de aplicativo para chegar mais rápido, mesmo assim não conseguiu. "Foi complicado chegar aqui. Ninguém aceitava a corrida. Acabou que o carro veio de última hora, e eu vim, mas não deu tempo. Agora só no ano que vem", disse a jovem, que ainda não tem um curso em mente.
Comércio e fiscalização
Comerciantes de itens tradicionais, como canetas, água e doces, afirmaram que a movimentação foi fraca em comparação aos anos anteriores. Rosana Araújo, 72, que acordou às 5h para organizar sua barraca, contou que chegou ao local das provas em Águas Claras às 7h, mas vendeu poucos produtos. "Fico triste, pois sempre trabalhei vendendo nos dias de Enem, e esta foi a primeira vez que quase não vendi nada", lamentou. Apesar do desânimo, ela pretende voltar no próximo domingo, na expectativa de um movimento melhor.
No Ceub, uma senhora que vendia lanches em uma van foi abordada por agentes da Secretaria DF Legal. Diva Carvalho, 57, que há 18 anos oferece seus produtos aos estudantes, foi informada de que não tinha autorização para operar. "É injusto. Trabalhamos na rua não porque queremos, mas porque precisamos", lamentou ela, enquanto fechava a van sob os olhares de pessoas que se mostraram solidárias.
O DF Legal informou ao Correio que realizou fiscalização em sete pontos distintos para combater o comércio ambulante irregular na porta de escolas que teriam a aplicação das provas. As equipes abordaram e orientaram 80 ambulantes irregulares a saírem dos locais que estavam. Nenhuma apreensão foi realizada.
Segunda fase
No próximo domingo, os estudantes terão de responder a 90 questões objetivas de ciências da natureza, que contam com as disciplinas de química, física e biologia, além de matemática. Os candidatos terão cinco horas para realizar a prova, que será iniciada às 13h30.
Quem foi afetado por problemas logísticos durante a aplicação das provas ou faltou devido a doenças infectocontagiosas poderá solicitar a reaplicação do exame entre os dias 11 e 15 de novembro. Os pedidos serão analisados, individualmente, pelo Inep. A previsão é de que os gabaritos das provas objetivas sejam divulgados no Portal do Inep em 20 de novembro. O resultado oficial sairá em 13 de janeiro de 2025.
*Colaboraram Bruna Pauxis e Vanilson Oliveira (Especial para o Correio Braziliense)
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