Pesquisadores e estudantes do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (IB/UnB) estão desenvolvendo um novo fungicida capaz de combater a ferrugem asiática, uma praga que afeta plantações de soja em todo o mundo. Estima-se que essa praga na agricultura brasileira cause a perda de 50% da produção da soja do país. A pesquisa faz parte do Programa Antártico Brasileiro (ProAntar) e busca, por meio de estudos realizados na vegetação antártica, soluções que possam reduzir significativamente as perdas na agricultura.
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São realizados estudos dos musgos da vegetação antártica, que abrigam organismos conhecidos como extremófilos — seres que sobrevivem em condições extremas de frio. A equipe coleta amostras de ar, água, solo, vegetação e neve, para avaliar se suas substâncias podem ser usadas como remédios ou pesticidas. Para testar suas propriedades, os biólogos criam extratos semelhantes a "chás" com os musgos e já obtiveram alguns resultados promissores na criação de um fungicida eficaz.
Um outro fungo encontrado na Antártica vem matando a vegetação local há cinco anos. Esse elemento ainda não foi completamente identificado, e os pesquisadores acreditam que ele pode ser formado por um conjunto de microrganismos que atuam em diferentes fases, causando danos severos à flora antártica. Embora esse fungo não tenha relação direta com o que causa a ferrugem na soja, ele também é foco de estudos devido ao seu potencial impacto ambiental e pode chegar ao Brasil.
Pesquisas
Criado há 43 anos, o ProAntar tem papel fundamental no estudo do continente, com o suporte da Marinha e de diversos ministérios e instituições de pesquisa do Brasil. A UnB participa do programa há 11 anos, desde que seu primeiro projeto foi aprovado em 2013, seguido por outros em 2018 e 2023.
Coordenado pelo professor Paulo Câmara, a pesquisa destaca o potencial biológico do continente gelado para o desenvolvimento de materiais agrícolas e a cura de doenças, além de ser a região de maior riqueza mineral do planeta. "A maior reserva de tudo está na Antártica, e são reservas intocadas. Em um futuro, na minha interpretação, haverá conflitos por esses recursos, caso acabe acabem a água e o petróleo, por exemplo. Por isso, o Brasil precisa manter sua presença lá", aponta o professor.
A professora Micheline Carvalho, professora de Botânica da UnB ainda acrescenta sobre a importância desses estudos no continente Antártico. "É um continente ainda isolado do planeta, com pouca interferência humana. Então, lá nós temos a vida como ela é, as coisas na sua forma mais natural, na sua forma mais pura. Para nós pesquisadores da área da biologia, da vida, é magnífico ter a possibilidade de realizar estudos em um ambiente tão rico", diz ela.
O trabalho também inclui o levantamento da diversidade de plantas e fungos antárticos e a investigação de suas aplicações em áreas como a indústria farmacêutica e química. Entre as frentes de pesquisa estão a elaboração de uma lista de espécies ameaçadas de extinção, a conservação de ecossistemas polares e o estudo de surfactantes biodegradáveis que podem ser utilizados na fabricação de cosméticos e produtos de limpeza.
Outro ponto importante da pesquisa envolve o monitoramento das mudanças climáticas na Antártica, que podem impactar diretamente o Brasil. "Tudo o que acontece lá, afeta a gente aqui, desde o clima até os recursos naturais, como as enchentes e as frentes frias. Elas vêm do sul, mas impactam em todo o território, até mesmo no Centro-Oeste", acrescenta Câmara.
A pesquisa foi uma oportunidade incrível na vida da mestranda em Botânica, Maria Clara Gil, 24 anos. "Ter tido a possibilidade de ter o contato, mesmo que seja só com as amostras da Antártica, é algo muito extraordinário. Quando saí do ensino médio nem sabia que existia isso", cita. Ela também acrescenta como é a experiência de ir para lá e passar 30 dias no navio "Eu fui no ano passado, todo dia é uma coisa diferente. É uma correria muito grande, coletar as amostras, processar as coisas, mas é único", declara.
A graduanda Brenda Emerick, 22, faz parte da equipe e está se preparando para sua próxima viagem. "Nunca tinha vivido nada igual, é uma experiência de outro mundo. Eu não cheguei a ir até lá, parei em Punta Arenas. Fiquei na fase de coletar o ar através da bomba que fica na dianteira do navio. Mas vou em março do ano que vem, já estou me preparando. Precisamos fazer muitos exames, preparar as vestimentas para ir", disse.
O Projeto é financiado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia através do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal (CAPES), do Ministério da Educação e também da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec).
*Estagiária sob a supervisão de Márcia Machado
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