No Brasil, um país historicamente marcado pelo acolhimento a migrantes e refugiados, o caminho para a dignidade humana dessas populações sempre foi longo e difícil. Refugiados que fogem de guerras, perseguições políticas e crises humanitárias encontram aqui um abrigo, mas também enfrentam desafios diários, como a burocracia para a regularização de sua situação e a adaptação a um novo contexto social e econômico.
É nesse cenário que surge uma figura determinante: a religiosa e advogada Irmã Rosita Milesi, de 79 anos, vencedora global do Prêmio Nansen de 2024, concedido pela Organização das Nações Unidas (ONU). O prêmio é um reconhecimento ao seu trabalho incansável em prol da defesa e acolhimento de migrantes e refugiados no Brasil, ao longo de quase 40 anos de atuação. A religiosa é a segunda brasileira a receber essa distinção, seguindo os passos do cardeal Paulo Evaristo Arns, que foi laureado em 1985.
Ao longo de sua carreira, a também diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), no Varjão, organização que fundou em 1999, ajudou pessoalmente milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade, garantindo-lhes acesso a abrigo, alimentação, saúde, além de lutar pela integração social e a regularização de documentação no Brasil.
Trajetória
Nascida em uma cidade rural do Rio Grande do Sul, Rosita Milesi aprendeu, desde cedo, o valor da generosidade e do trabalho. Sua mãe, profundamente religiosa e solidária, oferecia ajuda a moradores de rua e imigrantes que passavam pelas estradas próximas à sua casa. Essa educação baseada na fé e na solidariedade guiou sua trajetória de vida e, posteriormente, seu trabalho com os refugiados.
Um dos grandes marcos da carreira da religiosa foi sua contribuição para a criação da Lei de Refugiados de 1997, que ampliou os direitos das pessoas forçadas a deixar seus países de origem. Seu trabalho junto ao Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) da ONU e ao governo brasileiro resultou na criação de uma estrutura legal para acolher essa população, garantindo proteção e inclusão para milhares de refugiados ao longo das últimas décadas.
"O Brasil não tinha uma lei nacional e eu já estava envolvida com o tema, pois havia colaborado nos anos anteriores com a acolhida aos angolanos. Não foi difícil incorporar profundamente a proposta da primeira lei de refugiados do Brasil e enfrentar todos os desafios em busca de aprovação", afirma Irmã Rosita.
Entre os maiores desafios que enfrentou está a construção de um hospital sem nenhuma experiência na área, além de prestar assistência a estrangeiros presos em situações de extrema precariedade. O impacto de sua atuação foi especialmente significativo durante a crise de refugiados angolanos nos anos 1990, quando o Brasil recebeu mais de 2.300 pedidos de refúgio. Para Rosita, a maior satisfação em seu trabalho é ver essas pessoas retomando suas vidas em segurança e dignidade. "Ver uma pessoa que fugiu de uma guerra ou de uma situação de violência extrema reconstruir sua vida é uma alegria que não tem preço".
O prêmio será entregue em 14 de outubro em Genebra, na Suíça. Além da religiosa, outras quatro mulheres foram premiadas regionalmente. Dentre elas, a ativista africana Maimouna Ba, que ajudou a reintegrar crianças deslocadas à escola, e Jin Davod, uma refugiada síria na Europa que criou uma plataforma de suporte de saúde mental para refugiados.
*Estagiária sob a supervisão de Patrick Selvatti
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