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Crônica da cidade: Cá com os meus botões

Em tempos de games, a paixão pelo futebol de botão resiste em Brasília com cerca de 60 federados, campeonatos com duas regras e tribos reunidas para brincar e competir

A canção Eduardo e Mônica do Legião Urbana tem um trecho com o qual me identifico. "(...) E o Eduardo gostava de novela e jogava futebol de botão com seu avô". Não, não gosto de novela. Minha predileção é pelo popular "estrelão", pela palheta, o aviso de "prepara", a bolinha de feltro ou chapada e a comemoração de gol — independentemente da regra de 3, 12 toques ou livre no caso específico dos praticantes amadores.

Futebol de botão sempre foi o meu brinquedo preferido. Quando era criança, jogava sozinho no apartamento dos meus pais no Cruzeiro Novo. Transformava cada partida em um espetáculo antes mesmo do advento do padrão Fifa. Tinha um caderno. Nele, escrevia as escalações dos times devidamente numerados. Como sempre admirei a festa das torcidas nas canchas argentinas, fazia chuva de papel picado na entrada das equipes emulando a recepção das torcidas do Boca ou do River em La Bombonera ou no Monumental de Núñez.

Durante a partida, assumia o papel de manipular os dois times. Era técnico, juiz e o principal: narrador. Gritava como se a brincadeira fosse de verdade. Para mim, era. Sim, incomodava os vizinhos. Eles tocavam a campainha para reclamar com a minha mãe Ana ou meu pai Alberto. Um menino estava ultrapassando os decibéis da tolerância.

O cenário das minhas partidas se aproximava do profissionalismo de uma maneira artesanal. Colecionava caixas de creme dental e as recortava para transformá-las em "placas de publicidade" coladas nas bordas do estrelão. Apagava as luzes do quarto e acendia lanterna para transformar o acesso ao campo em show pirotécnico. Ousava, inclusive, fazer o som da galera durante a entrevista dos botões aos repórteres de campo.

Minha paixão pelo futebol de botão passou de pai para filha. Isabela gosta de brincar comigo. Travamos bons duelos em casa. Meus times de botão da infância, todos muito simples, de plástico — os que meus pais tinham condição financeira de comprar para mim à época —, estão preservados. Traves, palhetas, bolinhas, caixas de fósforo improvisadas de goleiro... Tudo guardado dentro de uma caixa velha de tênis batizada por mim de ônibus das delegações.

Um dia desses, perambulando pelo bairro onde moro, descobri a possibilidade de dar um upgrade no hobby da infância e praticar futebol de botão profissionalmente. Eu e a filhota estamos a poucos passos do paraíso. Somos praticamente vizinhos do Águas Claras Futebol de Mesa e Arte (Acafuma). Uma tribo de craques se reúne às quintas-feiras e aos sábados no Maggiore Shopping, Avenida das Araucárias 305, lojas 34 e 35, para amistosos, partidas oficiais e lições supervisionadas pelas feras. Simpáticos, eles até emprestam botões caríssimos para a "pelada" dos visitantes.

A Acafuma é um dos dois endereços clássicos no DF para os apaixonados por futebol de botão. O outro é a Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), no Setor de Clubes Sul. Há pelo menos 60 botonistas profissionais na capital. Conheço os craques Rodrigo Caruso e José Ricardo, ambos referências no assunto.

Em Brasília, joga-se de duas formas: 12 toques (regra paulista), a mais acessível aos leigos; e 3 toques (carioca). Os botões são de acrílico. Há tamanho mínimo e máximo. Não é esculhambado, não, tem que respeitar! Ah, não vale bolinha chapada de WAR, não, ok?! O regulamento exige bola de feltro.

Se você, como eu e o Eduardo da canção do Legião, jogava futebol de botão com seu avô, prepare-se: a Acafuma promoverá torneio aberto 12 toques para iniciantes neste segundo semestre. Mais informações com o Rodrigo Caruso: (61) 99211-6186.

 

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