A 80km de Brasília, na zona rural do município de Corumbá de Goiás, um santuário abriga 25 felinos resgatados de situações de perigo, como incêndios florestais, atividades de caça ou que estão inaptos a serem reintroduzidos na natureza. Há 24 anos, o Instituto Nex No Extinction luta pela preservação desses animais no Brasil. Atualmente, vivem no local 24 onças e uma jaguatirica.
A última a chegar foi a onça-pintada Itapira, resgatada dos incêndios que atingem o Pantanal. Ela ficou famosa nas redes sociais após um registro fotográfico mostrar Itapira e outras onças se refugiando do fogo em manilhas de escoamento de água. "Ela tem ferimentos de queimaduras de segundo grau nas quatro patas, mas vai ser possível voltar para a natureza", conta Thiago Luczinski, médico-veterinário responsável técnico pelo Nex.
Itapira foi resgatada na região de Miranda (MS). Como foi avaliado que na região não havia estrutura suficiente para tratar as lesões da felina, ela foi transportada por 1,2 mil quilômetros até o Nex, onde chegou em 15 de agosto. Desde então, a cada 48 horas, a equipe de veterinários do instituto seda o animal, para possibilitar a limpeza dos ferimentos e a aplicação do medicamento para controlar a infecção e estimular a cicatrização, além do tratamento de ozonioterapia, que acelera o processo.
A onça resgatada tem apenas dois anos de vida e acabou de entrar na idade reprodutiva. É possível saber a idade de Itapira porque a mãe dela já era monitorada por especialistas. É preciso mais de uma pessoa para retirar a felina de 55 quilos do cambiamento e levá-la para a mesa onde os procedimentos são feitos.
Referência
Itapira não é a primeira a ser resgatada dos incêndios no Pantanal e levada para o Nex. Em 2020, o instituto recebeu outras duas onças feridas devido ao fogo que consumia o bioma naquele ano. Desde então, o local virou referência na recuperação de animais resgatados de incêndios.
"Uma delas permanece no Nex, a Amanci, pois não pode voltar para a natureza devido às sequelas das queimaduras. Outra foi devolvida para o Pantanal: é um macho de nome Ousado, que sempre aparece em vídeos caçando jacarés", conta o veterinário.
Luczinski ainda explica que o instituto nasceu com o propósito de abrigar os felinos que não podiam mais retornar à natureza e que não serviam para zoológicos, como é o caso dos animais deficientes. Mas, com o tempo, foram desenvolvidos projetos de conservação, o que abrange reprodução, reintrodução e soltura.
O Instituto Nex No Extinction tem 164,5 hectares e 18 recintos para acomodar os animais. Rogério Silva de Jesus, gerente tratador do Nex, conta que as histórias mais comuns dos felinos que chegam ao santuário envolvem filhotes sob posse de caçadores e de pessoas tentando criá-los como pets. "A onça é um animal solitário. Enquanto é filhote, você consegue manejar. À medida que cresce, as brincadeiras vão ficando muito pesadas e perigosas para quem está cuidando", alerta o tratador.
Está sob os cuidados da equipe do Nex Sansão, o mais antigo no santuário, e a onça mais velha em cativeiro do mundo. Ele tem incríveis 24 anos, enquanto a expectativa de vida desse tipo de animal, em cativeiro, é de 15 a 20 anos. Originário da região amazônica, Sansão chegou ao local no início dos trabalhos do instituto. A catarata nos olhos e a pouca agilidade em se movimentar confirmam a longevidade do felino.
Já Merlin é um exemplo dos danos da ação humana sobre a vida silvestre. "Vivia solta na natureza, no Maranhão, até que levou um tiro na cabeça. A bala partiu da arma de um caçador. Teve uma retina queimada e o outro olho foi perfurado. Está há cinco anos no Nex", conta Rogério, que acredita que o tiro tenha sido de uma arma não-letal para animais daquele tamanho, como as que usam chumbinho como munição.
O instituto também abriga algumas onças-pardas, conhecidas como suçuaranas. Durante a visita ao local, a equipe do Correio teve a oportunidade de presenciar o momento em que a onça-parda Lana estava no cio. "Ela é uma suçuarana experiente, está no cio e o seu companheiro de recinto, o Pio, de apenas 2 anos, é um adolescente que não sabe direito o que fazer", explica o tratador. Lana perseguia o companheiro pelo recinto, esturrando sem parar, mas o esforço da fêmea em chamar atenção não parecia comover o jovem Pio.
A fêmea Mati, por sua vez, é uma estrela de novela. Apesar de ser uma onça originária do Cerrado, era ela que fazia o papel de Juma Marruá, quando a personagem se transformava em onça, no remake de Pantanal, que foi ao ar em 2022 na TV Globo.
O bioma de onde vem cada um dos espécimes define algumas especificidades do comportamento do animal. Como vem do Pantanal, a onça-pintada Marruá tem a maior piscina no seu recinto, uma forma de enriquecimento ambiental para que o local lembre ao máximo o ambiente natural.
Sobrevivência
O Instituto Nex No Extinction não recebe apoio do governo para desenvolver o seu trabalho. A entidade consegue se manter por meio de doações e pelas visitações que ocorrem aos fins de semana. No link na bio do perfil @nex_noextinction, no Instagram, é possível agendar a visita e ter acesso à Vakinha On-line para financiar o tratamento de Itapira e à chave Pix do instituto.
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