Trabalho

Maioria entre os servidores do DF, mulheres continuam sofrendo preconceito

As mulheres são maioria entre os servidores públicos do DF e, mesmo assim, sofrem com constrangimentos e preconceito

Coronel Ana Paula Habka:
Coronel Ana Paula Habka: "Nosso principal desafio foi mostrar para o homem que as mulheres têm a mesma competência" - (crédito: Divulgação/CCS PMDF)

Maioria absoluta no serviço público do Distrito Federal, seis a cada 10 servidores ativos são do sexo feminino, de acordo com dados do Painel de Pessoal da Secretaria de Economia (Seec). Enquanto as mulheres ocupam 63,58% do quadro efetivo do Governo do Distrito Federal (GDF), os homens representam 36,42% de um total de 107.847. Essa vantagem numérica, porém, não impede que essas profissionais passem por algum tipo de preconceito ou constrangimento em razão do gênero. E nem mesmo a segurança pública escapa dessa realidade com nuances misóginas, seja em relação ao contato direto com a comunidade seja dentro da própria corporação. 

A agente do Departamento de Trânsito (Detran-DF) Luciana Machado Beier está na autarquia há 10 anos e destaca que o pior momento, em 10 anos de carreira no Detran-DF, ocorreu coincidentemente no Dia Internacional da Mulher deste ano. "Um advogado quase me bateu aqui. Nunca tive tanto medo quanto naquele dia. Também acho que foi a vez em que vi o maior preconceito em uma abordagem", detalha. "Isso tudo ocorreu porque o carro dele foi apreendido com quase R$ 10 mil em multas. Só estávamos agindo conforme a lei", acrescenta.

Para Luciana, sempre há quem tente diminuir as mulheres. "No meu caso, principalmente, porque minha parceira de rua também é uma mulher. Isso costuma acontecer quando fazemos as abordagens", comenta. "São casos em que a gente tem certeza de que, se fosse um homem abordando, a forma de tratar seria diferente. Até hoje, esse tipo de comportamento me causa nervosismo", lamenta. "Isso acontece tanto nas abordagens quanto dentro da autarquia. Só que costumo ficar tranquila com isso. Para quem tenho que provar meu valor, eu provo", afirma.

 

Alta patente

Na Polícia Militar há 19 anos, a coronel Ana Paula Barros Habka conta que um dos lugares em que a diferença de tratamento se dá é nas promoções dentro da corporação. "Na época em que entrei, as mulheres só iam até a patente de capitão. Tive alguns colegas de farda que zombavam de mim, dizendo que, por mais que eu me esforçasse, eles iriam mais longe do que eu", recorda a comandante-geral da PMDF, cargo alcançado em janeiro deste ano.

"Lutamos muito para mudar isso, e conseguimos em 1998. O principal desafio foi mostrar para o homem que as mulheres têm a mesma competência", observa a coronel. "Muitas vezes, a mulher tem que fazer mais do que o homem, para ser vista como uma profissional capaz", lamenta. A coronel da PMDF afirma que, como mulher, o principal desafio é ter que se dividir entre outras funções. "Temos que ser esposa, mãe e, ainda, não deixar o cuidado pessoal de lado", pontua.

Sem medo

Designer organizacional, Érica Coelho reflete que os desafios que as mulheres vivem em relação à vida profissional ainda são consequência da cultura construída ao longo da história. "A diferenciação de gênero atribui as grandes coisas para os homens e as menores para as mulheres. E essa mesma lógica repercute também no mercado de trabalho", lamenta. Ela pondera, no entanto, que houve grandes avanços. "Pessoas se dispuseram a se indispor com a lógica vigente e tomar medidas com a intenção de trazer melhor equilíbrio. Habilidade, talentos e propósito independem de gênero", avalia. 

A comandante-geral da PMDF acredita que, apesar de ainda existirem episódios isolados de preconceitos e constrangimentos, atualmente, a situação está muito melhor. "Dentro da PM, pelo menos, acho que as mulheres conseguiram conquistar o respeito e o espaço merecido. O medo faz parte, mas a preparação é o melhor caminho para criar desenvoltura e encarar a profissão escolhida, seja ela qual for", destaca Ana Paula Barros Habka.

Luciana Beier comenta que é preciso acreditar em si mesma. "Nós, mulheres, precisamos mostrar que somos capazes e, muitas vezes, até melhores para algumas funções. Temos que botar a cara e mostrar nosso valor, independente de cargo vamos ocupar", aconselha.

Luta por igualdade

A Secretaria de Educação do Distrito Federal é um dos órgãos com maior número de mulheres na folha de pessoal. Hoje, após mais de uma década com gestão masculina, a pasta é comandada, desde 2021, por uma delas. Servidora da pasta desde o início dos anos 2000, a atual secretária, Hélvia Paranaguá, conta que a inspiração para a carreira veio dos pais educadores e, desde muito cedo, descobriu que tinha vocação para ser professora. "Lutamos muito pela igualdade, principalmente, no serviço público. Em todos esses anos de carreira, as conquistas foram significativas, percebemos muitas mulheres no GDF, principalmente em cargos de poder", avalia.

Hélvia é direta ao aconselhar mulheres que temem sofrer preconceito por causa da profissão escolhida: "Não abaixe a cabeça nunca nem permita que te banalize pela sua escolha. O preconceito existe contra todos. Todo trabalho tem seu grau de importância para a sociedade, desde garis, passando por vigilantes, merendeiras etc. A gente não quer roubar espaço do homem, apenas dividir."

Servidores ativos

Mulheres — 68.571 (63,58%)

Homens — 39.276 (36,42%)

Total — 107.847

Fonte: Painel de Pessoal da Seec

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postado em 01/09/2024 06:00
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