Incêndio

'Dei o último abraço. Parecia uma despedida', diz irmão de homem morto em incêndio

Fogo começou em um apartamento do sétimo andar, no condomínio em Valparaíso de Goiás. Um casal morreu ao pular de uma janela com um recém-nascido e um cachorro para fugir das chamas, que foram controladas por bombeiros de GO e do DF

A cidade de Valparaíso de Goiás, no Entorno do Distrito Federal, foi local de uma tragédia que comoveu o país na manhã dessa terça-feira (27/8). Um incêndio de causas ainda investigadas pela polícia matou uma família no condomínio Parque das Árvores, no bairro Parque Rio Branco: a especialista em alongamento de cílios Graciane Rosa de Oliveira, 35 anos, o marido dela, o garçom Luiz Evaldo, 28 e o filho do casal, Léo, de apenas 19 dias. O cachorro da família também morreu.

O casal pulou com a criança e o cachorro da janela do sétimo andar na tentativa de escapar das chamas, mas eles não resistiram e morreram. A avó de Graciane e um funcionário que prestava o serviço de impermeabilização de sofá também estavam no imóvel e conseguiram escapar com vida. Até as 20h de ontem, o bloco E — onde ocorreu o incêndio — seguia interditado e sem previsão para a liberação.

Quem viu a cena de diz não acreditar e tenta descrever o pânico e a angústia. Por volta das 10h20 de ontem, moradores relataram ter escutado gritos apavorantes de socorro vindos de uma janela do sétimo andar do Bloco E. De um cheiro de fumaça, logo os vizinhos se deram conta da gravidade e presenciaram o alastramento do fogo em segundos. "Corri para a varanda e vi uma moradora gritando 'fogo, fogo'. Mas, antes disso, eu e minha esposa ouvimos duas explosões. O barulho foi tão alto que chegou a tremer o chão", contou Jorge Luiz, 33, um dos moradores. Ele e a mulher desceram às pressas e se depararam com os três corpos ao chão. 

Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Amarildo Castro/Blog do Amarildo -
Amarildo Castro/Blog do Amarildo -
Reprodução/Redes sociais -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press -

O incêndio foi logo em frente ao Bloco F, onde Felipe Ferreira da Conceição, 32, mora. O bancário testemunhou o desespero dos moradores atingidos pelo fogo. "Quando descemos do prédio, vimos o casal na janela, gritando por socorro. Foi tudo muito rápido, questão de segundos, e o fogo os alcançou. Eles não conseguiram aguentar e acabaram pulando junto com o bebê", relatou. Felipe descreveu o clima de desespero entre os moradores, que tentavam ajudar de alguma forma. "Todo mundo estava falando e tentando ajudar, mas o fogo foi muito forte e não houve tempo para nada", disse.

Os bombeiros chegaram ao local cerca de 20 minutos depois do chamado. A força-tarefa de combate envolveu sete viaturas do Corpo de Bombeiros de Goiás (CBMGO) e 11 da corporação do Distrito Federal em apoio, o que foi decisivo para evitar que as chamas se alastrassem pelo prédio, provocando uma tragédia ainda maior. "Chegamos após a explosão, mas não presenciamos. Assim que fomos acionados, nos deslocamos imediatamente", destacou o major Maurício Correia, do CBMGO. Os militares  usaram as escadas de emergência e extintores para conter as chamas. 

Além de Graciane, do marido e do bebê, estavam no apartamento a avó da mulher e um funcionário contratado pelo casal para fazer um serviço de impermeabilização de sofá. As informações foram repassadas ao Correio pelo irmão de Luiz, Elivelton Lima. A avó e o rapaz, que não tiveram os nomes revelados, conseguiram sair a tempo e escapar. Até o fechamento desta reportagem, não havia informações sobre o estado de saúde dos dois. "Ele (funcionário) tirou a senhora, mas o restante não conseguiu, infelizmente", disse Elivelton.

A filha de Graciane, uma menina de 11 anos, fruto de um outro relacionamento, morava com a mãe e o padrasto. A menina estava na escola no momento do incêndio e foi pega na instituição de ensino pela avó paterna. O Correio conversou com o pai da criança. Jonathas Silva de Sousa, 33, descreveu os momentos de desespero ao buscar informações sobre a filha. O comerciante relata que soube do incêndio por volta das 11h30, por meio de sua madrinha. "Ela me mandou mensagem dizendo que o prédio estava pegando fogo. No início, não imaginei a gravidade, mas quando ela disse que havia um casal com uma criança envolvidos, entrei em desespero, pensando que poderia ser minha filha", enfatizou Jonathas, expressando o alívio que sentiu após saber que a filha não estava no local.

Dinâmica

As causas do acidente ainda são investigadas pela Polícia Civil e a elucidação depende do resultado da perícia do Corpo de Bombeiros e da Polícia Técnica. Elivelton, irmão de Luiz, relata que o fogo começou na cozinha do apartamento e se propagou em segundos para os outros cômodos. O casal e o bebê estavam em um dos três quartos da casa e ficaram impossibilitados de sair. "Pelo o que me falaram, só sobrou a sacada", disse o irmão de Luiz. 

O major Maurício explicou que a principal hipótese do que pode ter causado o incêndio é um suposto vazamento de gás. Segundo ele, na fase de rescaldo do local, os bombeiros notaram que o encanamento do gás apresentava fissuras. "A Polícia Técnica Científica vai produzir o relatório da situação, mas a princípio essa é a primeira linha de investigação que estamos trabalhando."

O delegado Bruno Van Kuyk, da 1ª Delegacia de Valparaíso, afirmou ao Correio que um inquérito policial foi instaurado para investigar o caso. "Havia uma equipe da PCGO no local, que colheu as informações preliminares. Estou analisando as informações e vou instaurar o inquérito hoje (ontem)."

Interdição

O síndico do condomínio, Anderson Oliveira, detalha que o fogo foi combatido rapidamente com o uso de equipamentos do próprio condomínio, complementados pelo trabalho das equipes do Corpo de Bombeiros. "Somos muito rígidos na questão de segurança e toda a parte de combate a incêndio está em dia. As mangueiras foram recentemente trocadas e são as melhores do mercado, tanto que foram utilizadas pelo Corpo de Bombeiros", afirma.

Em relação à suspeita de explosão de gás, Anderson explica que o condomínio possui uma central de gás encanado, com tubulação de aço que alimenta cada bloco. Ele desmentiu rumores de que houvesse manutenção em andamento no bloco atingido. "No momento da explosão, não havia nenhum tipo de manutenção no bloco. Temos mais de 350 câmeras no condomínio, o que facilita a prova de que nenhuma intervenção estava sendo feita", declara.

Oliveira assegura que todas as normas de segurança do condomínio são rigorosamente seguidas e que novos testes serão realizados nos equipamentos após o incidente. "Vamos analisar todos os equipamentos novamente. O Corpo de Bombeiros já indicou que as mangueiras utilizadas no combate ao incêndio terão que ser trocadas devido ao intenso calor a que foram expostas", conclui. Segundo ele, o condomínio inaugurado em 2012 conta com 528 unidades, distribuídas em seis blocos, cada um com 88 apartamentos. Estima-se que o local abrigue cerca de 2 mil moradores.

Tragédia

Graciane e Luiz mantinham um relacionamento desde 2019 e fruto do casamento tiveram um filho, o pequeno Léo. Nas redes sociais, o casal compartilhou a descoberta da gravidez e os momentos juntos. Pelas redes sociais, Graciane divulgava o trabalho como lash designer (especialista em extensão de cílios), mas o casal também prestava serviço como garçons de eventos há quase 10 anos.

Em prantos, Fabiana Luza, chefe das vítimas, disse não acreditar na tragédia. "Falei com ela hoje (ontem) de manhã. Ela estava passeando com os cachorros e estava tudo bem. Não soubemos o que aconteceu", disse. 

Elivelton esteve com Luiz pela última vez na noite de segunda-feira, quando saiu do trabalho para ir buscar as chaves de casa no apartamento do irmão. Foi a última oportunidade em que os dois se abraçaram, relata o militar. "Última vez que peguei na mão dele. Foi como uma despedida. É algo que eu nunca vou esquecer. Vão faltar palavras para descrever o quanto meu irmão era sensacional." Até o fechamento desta edição, as datas e horários dos velórios não haviam sido informados.

Mais Lidas