O Distrito Federal apresenta um alto número de desaparecimentos e acende o alerta para uma realidade preocupante e desafiadora para as autoridades. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), entre janeiro e julho deste ano, foram contabilizadas 1.033 pessoas desaparecidas, contra 1.228 casos no mesmo período de 2023. Apesar da redução, de 15,9%, a capital segue no ranking nacional de maior taxa de desaparecimento do país, com uma média superior a 92 casos por mil habitantes no ano passado, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Entre as cidades do DF, a que apresenta o maior índice de desaparecimentos é Ceilândia, onde foram registrados mais de 15% dos casos dos últimos seis anos. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostra que 35% das ocorrências de desaparecimento envolvem homens de 31 a 50 anos.
Os boletins registrados na Polícia Civil por desaparecimento são classificados em três tipos: o voluntário, comum na fuga de crianças e adolescentes por conflitos familiares, violência doméstica, uso de drogas, perda por descuido e/ou desorientação, sendo que a maioria alega que somente passou alguns dias na casa do namorado ou amigos; o involuntário, no caso de acidentes de trânsito, incêndio, distúrbios mentais ou homicídio; e o forçado, que envolve vítimas de crimes com restrição da liberdade e sequestro.
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Protocolo
Quando uma pessoa desaparece, cada segundo vale ouro para a elucidação do caso. Para facilitar o processo de denúncia e difundir a informação, a Polícia Civil utiliza algumas ferramentas, como o novo Protocolo Integrado para a Busca de Desaparecidos, lançado recentemente pelo o Governo do Distrito Federal (GDF). Esse método, que estabelece o sinal de busca imediata, visa agilizar a localização de desaparecidos. No novo sistema, informações sobre desaparecidos são compartilhadas com 31 órgãos do GDF assim que o caso é registrado.
Outra iniciativa foi desenvolvida pelo laboratório de representação facial humana do Instituto de Identificação (II/PCDF), em que é feita uma simulação de progressão de idade. O resultado mostra como seria a aparência atual de uma pessoa após um grande período do sumiço. A técnica de crescimento e envelhecimento facial é aplicada em imagens de pessoas que tenham desaparecido há pelo menos três anos, quando se trata de crianças, ou há cinco anos, quando os desaparecidos são adolescentes ou adultos.
O mecanismo mais utilizado no mundo em relação a casos de desaparecimento também é muito usado no DF: o Amber Alert. O sistema de alertas urgentes estabelecido nos Estados Unidos e adotado pelo Brasil é ativado em alguns casos de rapto ou sequestro de crianças. A plataforma dispara publicações nas redes da Meta, como Facebook e Instagram, no raio de até 160 km do local do fato, para anunciar a descrição da criança sequestrada, além de informações sobre qualquer indivíduo suspeito de envolvimento no crime.
Responsável pelo núcleo de desaparecidos do MPDFT, a promotora Polyanna Silvares afirma que o desaparecimento de pessoas é um grave fenômeno que atinge a sociedade brasileira, constituindo-se uma violação de direitos humanos. Ela cita iniciativas no Ministério Público que têm o intuito de contribuir para a localização de pessoas desaparecidas. O órgão aderiu, por exemplo, ao acordo de cooperação técnica celebrado entre o Conselho Nacional do Ministério Público e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, passando a integrar o Sistema Nacional de Localização e Identificação de Desaparecidos (Sinalid).
"Para que a sociedade e os serviços parceiros possam noticiar os casos de desaparecimento ou de possível localização, disponibilizamos um formulário on-line para preenchimento com informações e características físicas do desaparecido ou possível encontrado. Os dados são alimentados no sistema em banco de dados nacional, em até 24 horas", completa.
O Governo do Distrito Federal (GDF), por meio da Secretaria de Segurança Pública do DF, lançou no início do mês o protocolo Sinal de Busca Imediata de Desaparecidos. Esse protocolo é inovador no país e visa, entre outras ações, regulamentar e melhorar a eficácia na divulgação de dados e fotos de pessoas desaparecidas, assim que o boletim de ocorrência for registrado. “Estamos fortalecendo e ampliando essa rede de busca por desaparecidos, utilizando tecnologias e processos de gestão que nos permitam oferecer uma resposta mais efetiva nas primeiras 24 horas após o desaparecimento. Com a colaboração de órgãos públicos e da sociedade civil, pretendemos expandir a comunicação e fornecer um suporte humanizado aos familiares”, destacou o secretário de Segurança Pública, Sandro Avelar.
Dor
Há mais de três meses, David Musialowski, 43 anos, procura pelo pai, Josias José de Oliveira, 85. O idoso saiu de casa em 13 de maio com a esposa, na QNL 2, em Taguatinga. A mulher, que também é idosa, perdeu o marido de vista e ele nunca mais foi visto. Em uma força-tarefa, David se uniu aos irmãos e a outros familiares na busca pelo familiar. Visitaram hospitais, regiões administrativas e chegaram a receber informações de que seu Josias teria sido visto no centro de Taguatinga, em Ceilândia e em Samambaia. No entanto, nada foi confirmado.
"Fazemos buscas em locais onde disseram tê-lo visto. Além disso, a gente recorre aos órgãos públicos. Tem sido uma angústia enorme para nós e é uma sensação de impotência, porque a gente não tem notícia, não sabe o que aconteceu com ele, se ele saiu do DF ou está em outro estado", desabafa o filho.
O idoso foi visto pela última vez em uma gravação feita por câmera de segurança na QNL 4, na manhã do mesmo dia em que desapareceu. Ele usava uma camiseta, bermuda, boné e sandália pretos quando saiu de casa pela última vez. Josias sofre de mal de Parkinson e vinha tendo episódios de mudança de humor e mania de perseguição, além de dificuldade para se locomover. David diz que quer uma solução para o desaparecimento do pai. "Não queremos ouvir que ele está morto, mas precisamos acabar com essa angústia. Principalmente minha mãe, que tem 54 anos de casada."
Esperança
A dona de casa Ana Cleide não perde a esperança de encontrar a filha desaparecida desde 16 de janeiro de 2022. Aos 14 anos, Sara Morais saiu de casa, em Taguatinga, dizendo para a mãe que iria a um shopping próximo, mas nunca apareceu no local nem voltou. As investigações da Polícia Civil (PCDF) apontam para um possível caso de homicídio, mas o corpo nunca foi encontrado. "Ainda acredito que ela vai entrar por essa porta. No meu coração, eu sinto que ela está viva. Nada me tira isso da mente", desabafa Ana.
No ano passado, os policiais chegaram a prender um homem por suposto envolvimento no desaparecimento de Sara. Meses antes do sumiço da garota, ele a estuprou, segundo consta nos processos judiciais. Pelo abuso sexual, Jailton foi denunciado e condenado pela Justiça. O desaparecimento da adolescente é um mistério para a polícia: não há imagens ou vídeos de câmeras de segurança nem testemunhas.
*Estagiário sob a supervisão de Eduardo Pinho