O domingo em Brasília amanheceu, como o esperado, quente e seco, mas o que os brasilienses não imaginavam, nem nos piores agostos, era um horizonte tomado por fumaça em todas as direções. Ao acordar e olhar pela janela, muitos imaginaram estar vendo o resultado de uma queimada perto de casa, que estivesse acontecendo naquele momento, mas, ao entrar nas redes sociais e portais de notícias, foi possível perceber que todo o Distrito Federal estava do mesmo jeito.
“Quando eu acordei, percebi que estava difícil de respirar, o que foi agravado pelo meu desvio de septo. A garganta arranha”, comentou o empresário Juliano Ribeiro, 45 anos, enquanto passeava na Torre de TV com a mãe e as tias. Em casa, ele aumentou a ingestão de água e manteve o umidificador ligado o tempo inteiro em casa.
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Preocupada com o filho de 6 anos e com a sobrinha de 5, Sara de Araújo Feitosa, 34, resolveu levá-los para passear ao ar livre, no Eixão do Lazer. Mesmo com a secura e o calor, ela preferiu levar as crianças para um espaço aberto, onde ficaram debaixo da sombra das árvores. “A gente amanheceu com bastante dificuldade para respirar, mas estamos bebendo bastante líquido. Viemos praticar atividade ao ar livre e estamos comendo frutas e usando roupas leves”, conta Sara.
Mas qual seria a explicação e de que tamanho precisaria ser um incêndio para cobrir os quase 6 mil quilômetros de extensão da unidade federativa? Ela passa por uma combinação de fatores. Nos últimos dias, a cidade tem experimentado uma sensação quase sufocante com o calor excessivo e a baixa umidade relativa do ar. A meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) Andrea Ramos explica que um ciclone que está atuando na atmosfera traz uma massa de ar seco e quente e a mantém estável, dificultando a dispersão do ar e dos poluentes.
Nesse cenário, os ventos trazem e espalham a fumaça proveniente de incêndios que aconteceram no DF — e em outras regiões do país — ao longo da semana e ela fica retida em nossa atmosfera, resultando no domingo seco e enfumaçado que Brasília experimentou neste domingo (25/8). O Inmet e o Grupamento de Proteção Ambiental (GPRAM) confirmaram que a fuligem e a fumaça que atingiram Brasília vieram, também, de São Paulo e outros estados.
Ocorrências anteriores
A ausência de chuvas, que já assola o DF há mais de 120 dias, também piora a situação. O Corpo de Bombeiros Militar do DF (CBMDF) confirmou que, ontem pela manhã e início da tarde, não foram registrados focos de incêndio e que a fumaça era o resultado das queimadas anteriores. Porém, na sexta-feira, foram atendidas 93 ocorrências em todo o DF, que totalizaram 224 hectares de área queimada.
No sábado pela manhã, o fogo que atingiu uma área de vegetação de 14 mil metros quadrados no Gama causou transtornos na Penitenciária Feminina do Distrito Federal e a fumaça invadiu os espaços de ventilação em diversas celas e algumas detentas precisaram ser encaminhadas para o pátio. As chamas de outra queimada chegaram aos postes e fios de energia no Park Way e, na sexta, em outro incêndio, uma subestação de energia foi atingida em Samambaia.
De janeiro a 21 de agosto deste ano, o CBMDF registrou 5.256 ocorrências de incêndios florestais, aumento de quase 26% em comparação ao mesmo período do ano passado, quando 4.180 ocorrências da mesma natureza foram documentadas. Os dados do CBMDF apontam que, com exceção de agosto, todos os meses apresentaram alta nos registros.
Na rede social X, antigo Twitter, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, alertou sobre o período de seca e calor no DF, que aumenta o risco de incêndios. "Nossa equipe está preparada para agir rapidamente, mas a colaboração da população é essencial. Evite fogueiras em locais não permitidos e descarte materiais inflamáveis corretamente. Se avistar qualquer sinal de incêndio, denuncie imediatamente: ligue 193 para acionar o Corpo de Bombeiros ou envie uma mensagem para o WhatsApp exclusivo do Instituto Brasília Ambiental no (61) 99224-7202, destinado a receber denúncias de incêndios em Unidades de Conservação. Vamos juntos!", declarou o chefe do Executivo Local.
O músico João Torvax, 37, destacou que mesmo tomando cuidados, foi praticamente impossível não inalar a fumaça que cobriu a cidade, tanto fora quanto dentro de casa. Para tentar diminuir os efeitos do problema, bebeu muita água e deixou todas as janelas de casa fechadas. "Os efeitos das queimadas criminosas pioram um período em que os brasilienses sofrem com os incêndios florestais. Deveríamos fazer um trabalho de prevenção, principalmente das ocorrências criminosas”, desabafou.
Verde Vivo
Para conter as chamas, a Operação Verde Vivo, que tem como objetivo reduzir e prevenir incêndios florestais durante a estação seca na região, empenha, neste ano, 120 especialistas diariamente. Contudo, a corporação afirma que, caso haja necessidade, o número pode chegar a 300, uma vez que militares que cumprem escala de sobreaviso podem ser acionados.
Segundo o aspirante Ventura, do CBMDF, existe uma tendência natural do aumento dos incêndios neste período do ano, devido a uma combinação de fatores climáticos como a baixa umidade do ar e altas temperaturas. "Este ano foram atendidas mais de 4000 ocorrências de incêndios florestais, sendo que no mês de julho vencemos o dobro de incêndios quando comparado ao mês anterior, ou seja, o CBMDF e os demais órgãos estão preparados para esse aumento brusco no número de incêndios, pois já existe uma operação estruturada que prevê a quantidade de recursos materiais e de recursos humanos que serão necessários para esses combates mais intensos", sinaliza.
O militar ressalta que a participação da população é extremamente importante e comenta que o ideal seria que ninguém usasse o fogo sem necessidade no período mais seco, enquanto não chegam as próximas chuvas. “Esse é um período em que a vegetação está naturalmente mais vulnerável à ação do fogo e a possibilidade de um pequeno foco se transformar num incêndio é maior. Por isso, é importante reforçar que o Corpo de Bombeiros estará sempre atuando em todas as frentes necessárias, mas que a responsabilidade com o meio ambiente é de todos", ensina.
Os relatórios anuais da OPVV, apontam que, anualmente, as regiões administrativas mais atingidas pelos incêndios florestais são, respectivamente: Gama, Samambaia, Brazlândia, Santa Maria, Planaltina e São Sebastião.
*Estagiário sob a supervisão de Patrick Selvatti
Saiba Mais
Resgate de fauna
De amanhã a quinta, a Fundação Jardim Zoológico de Brasília realizará o Curso de Resgate de Fauna em Incêndios Florestais. A iniciativa integra o Plano de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PPCIF/DF), coordenado pela Secretaria do Meio Ambiente e Proteção Animal (Sema-DF). Com carga horária de 20 horas distribuídas em três dias, servidores de diversos órgãos que compõem o PPCIF terão acesso a um treinamento que combina aulas teóricas e práticas.
Ministrado por especialistas do Zoo, o curso formará uma primeira turma composta por 35 brigadistas florestais e servidores do Instituto Brasília Ambiental, do CBMDF e brigadistas voluntários. Uma segunda turma, prevista para o período de 24 a 26 de setembro de 2024, será destinada a servidores e brigadistas florestais do Jardim Botânico de Brasília (JBB), do Batalhão de Polícia Militar Ambiental (BPMA), do Ibama e do ICMBio.
Prevenir é o melhor
A principal medida preventiva é a construção de aceiros (limpeza do terreno numa largura de 4 metros).
Evitar o uso do fogo em lixo, resto de poda, limpeza de áreas agrícolas, e evitar jogar lixo em áreas florestais
É importante também a realização de campanhas de conscientização à população objetivando as ações acima propostas, e fiscalização de ações criminosas quanto ao uso do fogo.
Ao avistar um incêndio florestal , acionar o CBMDF pelo número 193 o mais rápido possível, se identificar e informar corretamente o local da ocorrência, com ponto de referência caso haja possibilidade.
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