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Idosos realizam sonhos da juventude e mostram que nunca é tarde para viver

O Correio conta histórias de pessoas que viram na terceira idade uma oportunidade de concretizar projetos cultivados ao longo da vida. Praticar musculação, voar num paratrike, fazer a primeira tatuagem: eles mostram que nunca é tarde para se arriscar

No século passado, era comum pensar na terceira idade como um momento para desacelerar, encerrar projetos e recolher-se à tranquilidade da aposentadoria. No entanto, o cenário atual é diferente. Muitos têm enxergado no início do ciclo uma oportunidade para desbravar novos caminhos, com o propósito de realizar sonhos ou descobrir hobbies jamais imaginados nas fases anteriores. 

O Correio conheceu histórias que, com suas peculiaridades, perpassam o mesmo caminho: a descoberta. Aos 68 anos, Pedro Santos descobriu-se amante das atividades físicas, especialmente da musculação; Marília Godoy apreciou, aos 90, a vista mais bela que seus olhos já puderam testemunhar - no céu de Brasília, voou de paratrike; no caso de Epifânia Maria de Jesus Mendes, mais conhecida como "vó Pifa", a aventura foi rabiscar a pele: fez a primeira tatuagem aos 98 anos e hoje, com 107, coleciona quatro artes marcadas em seu corpo. A filha de vó Pifa, Eunice Mendes, 71, seguiu os passos da mãe e teve a primeira arte desenhada na pele aos 69 anos. Confira as hisórias dessas personagens, que são a prova de que sempre é tempo de realizar os sonhos.

À flor da pele

Nascida no Piauí em 1917, Epifânia Maria de Jesus Mendes, 107 anos, mais conhecida como "vó Pifa", chegou a Brasília para participar da construção da capital. Antes, morou em Goiânia, onde fixou residência em 1935, apenas dois anos após a inauguração da cidade. Durante quase toda a vida, foi obrigada a deixar a personalidade forte de lado, calar-se diante de situações hoje classificadas como injustas, como quando as mulheres não podiam votar, direito que obtiveram somente em 1932. Embora vaidosa, também não era totalmente livre para escolher o que usar e como se vestir. Por muito tempo, admirou tatuagens de longe, sem cogitar fazê-las.

Ela teve 14 filhos — dos quais oito morreram —, 39 netos, 43 bisnetos e 11 tataranetos. Eunice Mendes, 71, uma das filhas mais novas de Vó Pifa, contou que a mãe sempre dizia que, se pudesse nascer outra vez, com certeza seria uma jovem de corpo inteiramente tatuado. Ao longo da vida, a vontade de ter artes desenhadas em sua pele nunca passou. Foi aos 90 anos que Epifânia finalmente concretizou o desejo de se tatuar. "O neto mais velho sempre a levava para viajar para a Bahia e lá fazia tatuagens de henna nela, porque ela gostava muito. Então, no aniversário de 90 anos, ela disse ao meu filho que queria uma tatuagem de verdade", conta.

A primeira foi uma coroa de flores. A segunda, foi feita aos 98 anos, um beija-flor. A terceira, com 101, e a última, aos 105. "Minha mãe começou a fazer muito sucesso, porque sempre vestia saias com cortes de lado, para que as tatuagens pudessem ser vistas. O pessoal adorava, ela foi parar na TV, fomos ao programa do Rodrigo Faro", lembra Eunice. 

Influenciada pelos passos da mãe, Eunice, que nunca se interessou por tatuagens, mudou de ideia após a chegada da terceira idade. Aos 69 anos, quando vó Pifa fez a última, decidiu que faria uma igual. Hoje, tem dois desenhos iguais aos da mãe, e disse ao Correio que deseja fazer outro na panturrilha, mas que ainda não sabe qual arte escolherá. "Estou esperando encontrar alguma que eu ache bonita para não me arrepender", confidencia. Quando perguntada se o ciclo com as tatuagens foi encerrado, vó Pifa prontamente responde: "Se o tempo não para, por que vou parar?". 

Ed Alves/CB/DA.Press - ... e hoje, com 107 anos, coleciona quatro artes marcadas no corpo

Desejo radical

Com 91 anos recém-completados, Marília Godoy emana carisma e deixa transparecer a paixão pela vida. No Dia das Mães, colocou em prática um desejo que cultivava há muito tempo: desbravar o céu de Brasília em um paratrike.

Descrita pelo filho Henrique Godoy, 56, como "mulher muito arrojada", Marília está na capital federal desde 1972. Cursou jornalismo no Ceub, e atuou como empreendedora por anos. À época, criava grinaldas e buquês para casamentos. Sempre foi amante da costura e do bordado, mas o contato com a atividade se intensificou após a morte do marido, em 2019. Desde então, tem experimentado novas vivências.

O encontro com o paratrike ocorreu há cerca de um ano, quando o filho e o neto passaram a pilotar paramotores. Logo que soube do esporte radical, Marília ficou deslumbrada. Há dois meses, então, a família preparou a surpresa para o Dia das Mães. Foi no aeródromo do Balão do Periquito, na região do Gama, que a aventura aconteceu.

Relembrando os momentos em que observava a paisagem de cima, Marília relata que, naquela ocasião, apreciou o pôr do sol mais bonito de toda sua vida. E adianta: havendo novas oportunidades, certamente, voará outra vez. O filho explica que o passeio foi feito com muita segurança. O piloto responsável tem mais de oito anos de prática, o que deixou Marília e seus familiares tranquilos. "Nessa oportunidade, voamos eu, meu filho e a minha mãe, foram três gerações no ar", conta Henrique.

Mas a família não se contenta apenas com o paratrike. Henrique e a mulher têm um motorhome no qual viajaram para diversos lugares da América do Sul. Nos próximos meses, Marília pretende se juntar ao casal e conhecer novos territórios. 

Arquivo pessoal - ... e realizou o sonho de voar de paratrike há dois meses

Resistência

Foi aos 68 anos que Pedro Santos, 70, descobriu o gosto pela musculação. Com a rotina de afazeres durante a vida, nunca havia tido oportunidade de praticar exercícios. Há dois anos, passou a frequentar a academia por, pelo menos, cinco vezes na semana. "Levei um tempo para começar, mas jamais penso em parar, pretendo continuar enquanto houver possibilidade", garante. Apesar das dificuldades enfrentadas no início, quando mal sabia manusear os aparelhos, afirma que os benefícios são notáveis e o fazem querer traçar novos objetivos. 

Pai de capoeirista, contou que admira todos os esportes, mas tem receio em se arriscar. Por isso, optou pela musculação. Para o futuro, planeja fazer natação. "Agora que tenho tempo, estou aproveitando, porque tempo é uma coisa que não se deve desperdiçar", declarou. 

Para a família, Pedro tornou-se um grande exemplo. Os filhos seguiram suas dicas e começaram na musculação. Agora, nos almoços, a diversão é analisarem os ganhos de massa muscular uns dos outros.

Letícia Guedes - Pedro Santos descobriu o apreço pela musculação aos 68 anos

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Ed Alves/CB/DA.Press - 26/06/2024 Credito: Ed Alves/CB/DA.Press. Cidades. Nunca é tarde para começar. Novas praticas na terceira idade. Na foto Dona Epifania Maria de Jesus - Vo Pifa.
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