Muito além de um incômodo visual e olfativo, se inaladas, as fumaças provenientes de queimadas podem ser prejudiciais ao sistema respiratório. Anualmente, na época da seca, o número de incêndios registrados na vegetação do Distrito Federal sobe exorbitantemente. Em 2024, o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) registrou 3.826 ocorrências de janeiro a 15 de julho. Além de serem um risco à biodiversidade, as queimadas são uma ameaça à saúde.
Tosse, falta de ar, irritação da mucosa nasal, ardência na garganta e dor de cabeça são alguns dos sintomas que podem ser vivenciados após a inalação da fumaça oriunda de queimadas. Segundo Eduardo Cartaxo, pneumologista da Oncoclínicas Brasília, ela possui uma grande quantidade de monólitos de carbono e de partículas de fuligem que, quando em contato com as vias respiratórias, podem provocar crises de doenças respiratórias, como rinite, sinusite e asma. "A fumaça é deletéria a todo o organismo e pode levar até mesmo à descompensação de doenças cardiovasculares", ressaltou.
A especialista Gilda Elizabeth, pneumologista do Hospital Brasília Águas Claras, explicou ao Correio que qualquer pessoa pode sofrer danos respiratórios quando em contato com a fumaça, mas destacou que pacientes com quadros de rinite, bronquite e asma são mais suscetíveis a crises, especialmente se o contato for constante. "Toda fumaça é prejudicial: as de queimadas de mato, de folhas, carvão, incêndio. Mas se o contato for sem proteção, diário e por mais tempo, os danos são mais expressivos, principalmente em extremos de idade, como as crianças e os idosos, além daqueles que têm doenças crônicas como asma e enfisema", pontuou.
Aflição
Na sala de espera da emergência pediátrica do Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib), a reportagem do Correio acompanhou de perto a aflição dos pais que buscavam atendimento para as crianças que apresentavam sintomas de doenças respiratórias.
A dona de casa Mônica Gonzaga, 29 anos, moradora da Estrutural, é mãe de três filhos. A mais velha, Ana Vitória Ribeiro, 7, tem asma e anualmente apresenta crises, especialmente quando a seca bate à porta. Sentada ao lado da mãe, enquanto aguardavam ser chamadas ao consultório, demonstrava dificuldade para respirar. Mônica explicou que a criança está sempre medicada, mas que às vezes as crises apresentam-se mais fortes e a única saída é buscar ajuda no hospital. "Nesta época, minha preocupação aumenta demais, ela tem muitas crises, sofre muito", lamentou a mãe.
A estudante Marinete da Silva Conceição, 38, moradora de Valparaíso de Goiás, buscava atendimento para a filha Maitê Conceição, 3. Ela explicou que na região onde moram há muita fumaça e poeira, o que provoca crises de tosse na menina. "O médico acha que ela está com laringite, as amígdalas ficam inflamadas e a medicação não está resolvendo. Onde eu moro tem poeira demais", explicou. Em casa, a mãe não mede esforços na luta contra as doenças respiratórias. Para enfrentar a seca deste ano, comprou umidificador e inseriu a nebulização na rotina diária da menina, mas continua preocupada.
No caso da cozinheira Paula Gabriela Rabello, 33, e de seu esposo, Rodrigo Martins, 37, bombeiro civil, a preocupação é em dobro. Pais de duas crianças, Pedro Leni Rabello, 1 ano e 4 meses, e Melina Rabello, 4 meses, o casal, que mora em Brazlândia, contou que as crianças sofrem com problemas respiratórios desde que nasceram. "O tempo piora tudo. O mais velho tem bronquiolite e a mais nova, apesar de não ter diagnóstico, apresenta os mesmos sintomas. Neste tempo, eles ficam tossindo e com as vias respiratórias congestionadas", relatou a mãe. Os pais declararam que, geralmente, as crises duram até o fim da estação e que sentem-se fragilizados ao observar as crianças doentes.
Com umidades entre 20% e 12%, Distrito Federal recebeu alerta laranja de baixa umidade ontem. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a capital federal está no período de estiagem. Hoje, o DF completa 92 dias sem chuvas.
Além das queimadas, a combinação de clima seco e tempo frio potencializa as doenças respiratórias. Isso porque as vias aéreas costumam ficar ressecadas, tirando a proteção natural da mucosa nasal e facilitando a entrada dos vírus. A perda dessa proteção natural causa a proliferação de germes virais e bacterianos.
A Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) informa que a hidratação é a melhor maneira de prevenção das enfermidades respiratórias. Tanto a hidratação oral, com ingestão de bastante líquido, quanto a hidratação das vias aéreas nasais, com soro.
Cuidados
O pneumologista Eduardo Cartaxo aconselhou que pessoas que moram em locais próximos a ambientes onde há muitas queimadas devem tratar suas doenças crônicas de forma contínua, além de manterem-se hidratadas, com uma alimentação saudável e com as narinas sempre lavadas. Gilda Elizabeth sinalizou como positiva a atitude das mães de administrar nebulizações e fazer lavagens nasais com soro fisiológico, mas lembrou que todo tratamento é individualizado.
A SES-DF alerta que uma das formas de prevenção das doenças respiratórias é a vacinação contra a gripe, que evita a disseminação das doenças. Além da influenza, que é a principal, a pasta oferece a vacina antipneumocócica, que previne a pneumonia e é recomendada para idosos e pessoas com asma grave, doenças crônicas pulmonares, com infecções respiratórias de repetição, imunocomprometidas e com doenças hematológicas graves. O imunizante está disponível em Unidades Básicas de Saúde (UBS).
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