PPCUB

Governador Ibaneis veta pontos polêmicos do PPCUB

Chefe do Executivo local anunciou que retirará, entre outros pontos, a possibilidade de construir hotéis e motéis na W3

O governador Ibaneis Rocha (MDB) vai vetar alguns pontos do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB). A decisão foi tomada após reunião entre o chefe do Executivo e representantes da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh).

"O PPCUB é um projeto discutido por toda a sociedade há mais de uma década. Foi amplamente estudado e aprovado após várias reuniões e debates, contando com a participação dos mais diversos setores da sociedade. Entendemos que existem pontos controversos no Plano e decidimos vetá-los. Eles poderiam atrapalhar o projeto como um todo. Para nós, o mais importante é o desenvolvimento de Brasília e a adaptação necessária para que a cidade cresça junto com a população e acolha a todos com conforto e qualidade. Reitero que todas as intervenções serão pensadas, considerando as necessidades da população. Outros vetos, inclusive, podem ocorrer após a análise detalhada dos técnicos da Seduh", ressaltou o governador nas redes sociais.

Entre as propostas a serem vetadas estão a construção de alojamentos nas quadras 700 e 900 das asas Sul e Norte, incluindo hotéis e motéis; e também a ocupação do Parque dos Pássaros, o que afastará a possibilidade de construção de um camping no local. Ibaneis Rocha anunciou que vetará também a permissão de comércio e prestação de serviços no Setor de Embaixadas. Será vetada ainda a alteração de lotes na W3 Sul. 

"Nos reunimos com o governador para apresentar os aspectos técnicos relacionados a determinadas emendas elaboradas pelos parlamentares, bem como pontos sensíveis do texto aprovado, e o resultado foi a exclusão de pontos que pudessem prejudicar o conteúdo e garantir que o texto reflita exatamente os pontos necessários à preservação e ao desenvolvimento sustentável da cidade", informou o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação do DF, Marcelo Vaz.

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Audiência pública

A aprovação do PPCUB, semana passada, na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), continua repercutindo em diferentes setores da sociedade. Pontos polêmicos do projeto aprovado, e algumas das emendas acrescentadas ao texto, têm causado críticas de especialistas e de defensores do tombamento da capital da República.

Na terça-feira (25/6), uma audiência pública convocada pela senadora Leila Barros (PDT-DF) reuniu especialistas e representantes de diferentes órgãos para debater, no Senado Federal, o teor do projeto, que está sendo analisado pelo Palácio do Buriti.  

Na abertura da audiência, Leila disse que o PPCUB, tal como foi aprovado pelos distritais, abre espaço para especulação imobiliária. "E não contempla os interesses da sociedade do DF", apontou a parlamentar, que sustenta que a preservação não é um obstáculo para o desenvolvimento do DF, mas, sim, "o seu alicerce".

Outro ponto levantado pela senadora, que é presidente da Comissão de Meio Ambiente da Casa Alta, é o fato de que o plano aprovado não aborda o impacto dos eventos climáticos extremos, que, de acordo com a senadora, estão cada vez mais comuns. "A liberação de áreas verdes para atividades econômicas deixa o DF mais vulnerável a esses eventos", afirmou. Leila também demonstrou preocupação com mudanças de parâmetros nos setores hoteleiros Norte e Sul. Hotéis da região, que atualmente têm três andares, passariam a ter permissão para ter 12 pavimentos.

O deputado Fábio Félix (PSol) lembrou que o projeto final enviado pelo Governo do Distrito Federal (GDF) só chegou na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) no início de março de 2024. "Foi um debate absolutamente insuficiente vide o conteúdo aprovado ali", disse o parlamentar. "Há ausência de uma lógica de preservação no projeto apresentado pelo governo", completou.

Presente à audiência, Janaína Gomes, secretária-adjunta da Seduh, buscou esclarecer alguns outros pontos polêmicos do plano. Sobre a emenda que destina áreas livres para a Terracap, Janaína disse que não haveria "cheques em branco" no PPCUB. "Qualquer mudança de parâmetro tem que passar por projeto de lei complementar, tendo que seguir todo o rito (na CLDF)", afirmou. 

O secretário da Seduh, Marcelo Vaz, não esteve no Senado, mas defendeu a destinação. "A Lei Federal 6.766/1979 definiu que, em qualquer loteamento, após o registro dos lotes, as áreas remanescentes passam a ser áreas públicas. Antes de 1979, não tinha nenhuma regra. Alguns lotes foram criados sem a definição do remanescente. O texto garante que a área é de propriedade da Terracap, mas continua sendo área pública. A Terracap não poderia comercializar essas áreas. Qualquer possibilidade de criação de lotes nessas áreas precisaria passar pelo rito legal de parcelamento do solo na Seduh e com a anuência do Iphan", explicou.

A desconstituição de alguns lotes no Setor Noroeste foi defendida pela representante da Seduh como forma de favorecer a consolidação do Parque Burle Marx e a preservação da reserva indígena que se encontra na região. 

Preocupação

O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, destacolu que as maiores preocupações do órgão são em relação às emendas inseridas no texto original durante a tramitação na CLDF. 

O instituto participou da fase preliminar de elaboração da proposta, dando recomendações, sugestões e orientações a partir da legislação federal (Portaria 166/2016) e da compreensão de possíveis impactos na área tombada, nas escalas e nas paisagens da cidade. "O GDF acatou a maior parte das recomendações do Iphan, com algumas exceções, como exemplo o gabarito dos hotéis que vão sair de três andares para uma altura maior. Outras questões, o GDF compreendeu, a pedido do Iphan, que era melhor deslocar para outros projetos ou leis complementares específicas", contou Leandro.  "A nossa grande preocupação é com as emendas que destina áreas verdes para a Terracap", declarou. 

Setor produtivo 

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Distrito Federal (Sinduscon-DF), Adalberto Valadão Júnior, vê a aprovação do PPCUB como uma dívida histórica da classe política com a cidade. "As legislações precisam acompanhar as mudanças, o crescimento e as evoluções das cidades e pessoas. Ao não fazerem isso, abre-se espaço para crescimento desordenado, ilegalidades, como crescimento desenfreado de invasões, e insegurança jurídica", afirmou. 

Adalberto avalia que o Executivo local fez a sua parte, propondo a lei. "A sociedade civil fez (a parte) dela, discutindo e a aprimorando ao longo de mais de 15 anos. Coube ao Legislativo a aprovação da lei, com responsabilidade, sem ceder a visões parciais e sensacionalistas da lei", analisou. 

Bisneto de Oscar Niemeyer, Paulo Niemeyer esteve presente na audiência pública e questionou o plano. "Eu questiono a necessidade do próprio PPCUB, porque existem muitas leis que já vigoram e protegem a cidade. Hoje, vemos a cidade sendo atacada. Brasília tem singularidades muito específicas que a diferem de outras no Brasil e no mundo. Qualquer mexida precisa ser muito criteriosa", ponderou.

Plano complexo 

A arquiteta e urbanista Vera Ramos acompanha a elaboração do PPCUB desde o início de sua elaboração, há cerca de 15 anos. Ela lembra que o documento do plano, mesmo sem contar com as mais de 100 emendas, é complexo, com 168 artigos e 15 anexos. "Até para técnicos da área é difícil entender, porque é muito grande, e a comunidade não conhece o teor do plano em sua totalidade, porque não houve transparência na elaboração", apontou a ex-presidente do Instituto Geográfico e Histórico do Distrito Federal (IGHDF). 

Ao longo desses 15 anos, Vera diz que o plano mudou algumas vezes, assim como os integrantes da equipe da Seduh que construíram o plano nesse período. "Tem pouca preservação no PPCUB. Não pode ser considerado um plano de preservação, porque faltam instrumentos para essa finalidade, além de prazos, metas e penalidades. O plano define o que é o Conjunto Urbanístico de Brasília (CUB), repete o que são as escalas, e dá diretrizes para a preservação, que são dispositivos mais informativos", analisou a arquiteta. Problemas atuais, como os relacionados à mobilidade e à W3 Sul não são "atacados" de frente, de acordo com a especialista.  

Para a urbanista, a previsão de adensamento em áreas públicas a a divisão de lotes maiores ameaçam as áreas verdes da cidade (escala bucólica). "O PPCUB coloca áreas verdes, que já temos, em risco na contramão na sustentabilidade que vem orientando outras cidades do mundo", lamentou. "Não podemos permitir que Brasília com espaços verdes, céu azul e horizonte, coisas que foram pensadas, seja destruída, tirando o nosso direito, como cidadãos, de manter a qualidade de vida", finalizou.  

O coordenador e professor do curso de Arquitetura e Urbanismo do Ceub, Alberto Faria, participou da reunião e destacou a importância de um plano que contemple questões relacionadas à mobilidade urbana, principalmente de pedestres. "Brasília é uma das poucas cidades no mundo que tem uma via expressa dentro da cidade com uma velocidade de 80km/h, o que dificulta muito ligações transversais e as questões de travessia e continuidade urbana", comentou.

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