A Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP-DF) tem ampliado o uso da tecnologia para combater o crime na capital. Com um estudo extensivo, feito diariamente, a pasta compila dados minuciosos sobre os delitos, como local, data e horário onde ocorreram. Desta forma, detectam as chamadas "manchas criminais" e, com o auxílio de câmeras de monitoramento, policiamento ostensivo e trabalho de inteligência, atuam para reestabelecer a segurança nessas áreas. Atualmente, o Programa de Videomonitoramento Urbano (PVU) da pasta realiza uma ação integrada entre as forças de segurança e outros 31 órgãos, bem como instituições e agências do governo local e federal. São 1.190 câmeras de monitoramento espalhadas em 29 das 35 regiões do DF.
As imagens, transmitidas em tempo real para o Centro Integrado de Operações de Brasília (Ciob), são compartilhadas com os batalhões de área da Polícia Militar (PMDF), do Corpo de Bombeiros (CBMDF), delegacias da Polícia Civil (PCDF), além de outros órgãos de governo. Segundo a pasta, o objetivo é que as câmeras auxiliem em ações de policiamento preventivo e contribuam para maior segurança e melhoria da mobilidade urbana. Os equipamentos são de alta resolução e podem ser utilizados em ações de segurança, trânsito, saúde, prestação de serviço público e fiscalização.
Ao Correio, a secretaria disse que, entre 2023 e 2024, iniciou o programa no Varjão, Jardim Botânico, Paranoá, Lago Sul, Lago Norte, com 148 novos equipamentos. As próximas regiões a serem atendidas pelo PVU, ainda neste ano, são: Vicente Pires, Sol Nascente/Pôr do Sol, Arniqueira e Fercal. Desde 2013, quando teve início o programa, foram investidos R$ 70 milhões na instalação das câmeras de monitoramento. A SSP-DF informou que está em fase de estudos acerca da implementação de tecnologia de Business Intelligence (BI) para a criação de painéis estatísticos, com o objetivo de mapear as manchas criminais.
Alexandre Patury, secretário executivo de Segurança Pública, destacou que o DF trabalha com amplos instrumentos de combate ao crime e citou que o Ciob atua com 70 posições que mantêm contato em tempo integral. "A área de inteligência SSP-DF se conecta a todos os serviços de inteligência, não apenas no âmbito do DF, mas no país inteiro. Há conexão com a PM, os bombeiros, a PF, o Gabinete de Segurança Institucional, e o Supremo Tribunal Federal (STF). A inteligência é muito atuante no DF, apesar de não ser visível, até porque quebraria o próprio conceito de inteligência."
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Queda na criminalidade
Os dados da secretaria apontam declínio da violência na capital. De janeiro a maio do ano passado, foram registrados 10.095 crimes no Distrito Federal. No mesmo período deste ano, foram 8.481 registros. Patury afirmou que o trabalho realizado para identificar as manchas criminais contribui diretamente para a queda.
"Mensalmente, nós fazemos uma reunião com todos os comandos de segurança, em que os dados são expostos e analisados. Fora isso, há várias reuniões mensais em que, baseados na mancha criminal, os comandos decidem onde é necessário empregar mais viaturas, onde precisa de ação investigativa, em qual lugar os bombeiros e o Detran precisam ficar mais atentos", explicou.
Welliton Caixeta Maciel, especialista em segurança pública e pesquisador vinculado ao Grupo Candango de Criminologia, explicou que a iniciativa tem sido adotada em diferentes regiões ao redor do mundo, com algumas ressalvas. "A estratégia adotada pela SSP e pela PMDF se aproxima do que, nos estudos policiais, chamamos de 'Policiamento Preditivo'. Trata-se de um modelo de polícia pautado pela 'tomada de dados de diferentes fontes, sua análise e então o uso dos resultados para antecipar, prever e responder mais efetivamente ao crime futuro'. Vários países adotam esse modelo de policiamento, que se vale do uso de algoritmos e ferramentas tecnológicas para o combate ao crime", ensinou.
Para que o trabalho tenha efeito, porém, é necessário que a população atue junto às forças de segurança. Segundo o secretário executivo, o desinteresse pela denúncia é um problema grave, dado que a entrega dos efetivos é feita com base nos registros de criminalidade em cada região e, quando não há chamados, presume-se que não há problemas na localidade.
"As pessoas são refratárias ao registro, porque elas acham que o boletim sobre um furto de celular não vai dar em nada. Mas isso é terrível, porque todas as estatísticas de mancha criminal dependem do registro. Então, muitas vezes, ligam reclamando que estão com problemas em regiões administrativas específicas e, quando a gente abre o mapa da mancha criminal, não encontramos delitos registrados, é difícil empregar efetivos quando não há registros", alertou. Patury informou que há expectativas de que um painel de monitoramento, semelhante ao Painel de Feminicídio da pasta, seja lançado ainda este ano para disponibilizar à população dados detalhados acerca das manchas criminais.
Obstáculos
Berlinque Cantelmo, especialista em segurança pública, ressaltou que, se bem utilizada, a estratégia de mancha criminal pode servir para a promoção de mapeamento do crime, sobretudo se aplicada paralelamente com georreferenciamento, por meio de ferramentas como geosites e Google maps, além das utilizadas pela segurança pública. O especialista aponta, porém, que há gargalos. Berlinque pontuou que se bem utilizado o sistema é uma excelente ferramenta, mas se houver utilização indevida, serve "simplesmente para um falseamento das estatísticas", declarou.
Vítimas
Marlene Vitória, 18 anos, teve itens do seu veículo roubado no fim do ano passado, no Setor de Clubes Sul. "Fui para um show e deixei meu veículo em um estacionamento pago. Voltando da festa, me deparei que a maçaneta estava arrombada, verifiquei dentro do carro e achei que não estava faltando nada. No meio do caminho, escutei um barulho vindo do porta-malas e parei para ver o que era. Quando fui verificar no porta-malas, o macaco e o estepe haviam sido roubados", lembrou. "Não registrei o boletim de ocorrência porque achei que a polícia não ia conseguir resolver, já que era uma situação complexa de furto", disse.
Damião Mamedes, 50, dono de uma loja de calçados em Ceilândia, também relata que foi vítima de furto. "Arrombaram a porta de ferro que mantinha a loja fechada e roubaram 30 bolsas. Fico muito chateado, a gente trabalha legalmente e não tem o mínimo de segurança nesse país para evitar os roubos", afirmou. "Registrei o boletim de ocorrência e reforcei a segurança, colocando grades de ferro mais resistentes, porém ainda não me sinto seguro", complementou.
*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira