Entrevista

'O foco é acolher pessoas que vivem nas ruas', afirma chefe da Casa Civil do DF

Ao CB.Poder, o chefe da Casa Civil do DF, Gustavo Rocha, destaca plano de ação que será implementado para a população em situação de rua. Entre as medidas estão a capacitação e oferta de emprego por meio do Renova. Projeto é o primeiro do país

O secretário da Casa Civil, Gustavo Rocha, foi o convidado do CB.Poder — parceria entre Correio Braziliense e TV Brasília —, desta quarta-feira (12/6). Na conversa com os jornalistas Ana Maria Campos e Carlos Alexandre de Souza, Rocha apresentou Plano Distrital para Pessoas em Situação de Rua, que começa a ser implementado nesta quinta-feira (13/6). Equipes do Governo do Distrito Federal (GDF) vão às ruas conversar com pessoas em situação de rua para apresentar um leque de opções de acolhimento e cursos profissionalizantes. 

O secretário diz que os governos anteriores falharam ao tentar retirar essas pessoas das ruas da capital. "O foco do nosso plano é justamente o contrário: é o acolhimento dessas pessoas e dar condições para que saiam da situação em que se encontram. A grande maioria dessas pessoas não está na rua por vontade própria, mas por falta de oportunidade", adianta o Rocha. 

Como será o plano para que as pessoas em situação de rua saiam dessa situação espontaneamente e voltem a ter uma vida mais cidadã?

Na verdade, isso não é um problema local, do Distrito Federal, nem nacional. É um problema mundial. Principalmente depois da pandemia, houve um aumento muito grande da população em situação de rua. Ano passado, o ministro Alexandre de Moraes (STF) proferiu uma decisão e suspendeu, no país inteiro, qualquer ação visando tirar essas pessoas das ruas. Ele fez isso aguardando um plano que seria feito pelo Governo Federal. Nós nos antecipamos a essas ações e fizemos o nosso plano local. Eu, pessoalmente, fui conversar com o ministro Alexandre, ao lado do Ministério Público. Nós apresentamos um plano para ele, com a forma que nós queríamos abordar essa questão e ele concordou e nos autorizou a executá-la.  Depois, fechamos um acordo de cooperação técnica com o MP e também com o Conselho Nacional do Ministério Público. A ideia do CNMP é, caso o plano funcione, que é o que esperamos, replicar no país inteiro por meio dos ministérios públicos. Foi uma articulação grande, junto ao Judiciário, Procuradoria Geral da República, Ministério Público e a Defensoria Pública para que pudéssemos apresentar esse plano e que fosse aceito por todos, o que era possível ser feito. 

Se der certo, o DF pode ser um exemplo para o país? 

Nós fomos os únicos que apresentamos, que temos a aval para poder executar, que fizemos esse termo de cooperação com o MP e com o CNMP. 

Qual abordagem vocês propõem? 

Quando a gente fala em pessoas em situação de rua, acham que devemos tirar essas pessoas da rua. O foco, principalmente dos governos anteriores, era esse, mas não davam condições para que elas saíssem efetivamente da rua. Tirava de um local e iam para outro. O foco do nosso plano, por isso levou um tempo para ser maturado, é justamente o contrário: é o acolhimento dessas pessoas, dar condições para que saia da situação em que se encontra. A ideia do plano é dar condições, dar possibilidade para que ela saiam da situação em que se encontram.

Mas isso seria de que forma? 

Várias medidas foram feitas. Primeira: acolhê-las. Aumentou muito o número de vagas no acolhimento. A Sedes (Secretaria de Desenvolvimento Social) publicou edital para aumentar em mais 2 mil vagas o acolhimento noturno. Primeiro é dar local para essas pessoas ficarem, também à noite. Nunca teve e estamos fixando e elaborando essas questões. E, principalmente, o Renova, da Secretaria de Trabalho, que é um programa de sucesso aqui no DF, no qual as pessoas se profissionalizam em uma atividade. No momento em que estão fazendo essa profissionalização, recebem uma bolsa. Após o término do curso (foi publicado um decreto do governador, que reserva, regulamentando uma lei de 2018, que oferece 2% das vagas para todos os contratados do serviço público, para a população em situação de rua), muitas poderão se contratadas. A ideia é preparar essas pessoas, formá-las por meio do Renova e posteriormente aproveitá-las dentro das atividades desenvolvidas no DF. 

Tem um programa do governo, em parceria com as empresas de construção civil, que paga o salário das pessoas por três meses. 

Na questão do Renova, a Secretaria de Trabalho abriu um módulo exclusivo para pessoas em situação de rua. As equipes do GDF estão na rua desde a semana passada, conversando com essa população, apresentando o que pode ser feito, ofertando qualificação e a possibilidade de trabalho futuro. Estamos fazendo o cadastramento dessas pessoas para que a gente possa iniciar esse programa. 

Existe alguma medida para aqueles que estão passando por problemas de vício em drogas? 

A Secretaria de Saúde desenvolveu equipes específicas para atender as pessoas em situação de rua, por intermédio de consultórios móveis. Estão indo aos locais onde as ações serão implementadas para conversar com essas pessoas, para verem as demandas de saúde e ver qual é o melhor encaminhamento, seja para a rede de saúde, seja para as comunidades terapêuticas que são vinculadas à Secretaria de Justiça. 

Como o senhor falou, é um problema nacional. À medida em que o DF acolhe essas pessoas, a capital tende a atrair mais pessoas. Como vocês enxergam essa possibilidade? 

Hoje, quase 50% do nosso atendimento na área de saúde vêm do Entorno. É um problema que existe e que enfrentamos. A gente não acha que isso vá aumentar por conta dessa política. Mas, caso isso aumente, vamos adequando para que possamos assumir essa demanda. 

Tem algum diagnóstico de quantas pessoas estão em situação de rua hoje, no DF?

Pela primeira vez, foi feito um censo, em 2022. Vai ser feito outro agora, em 2024. Tinham quase 3 mil. Hoje, o número é visivelmente maior. A gente vai ter esse dado agora, em novembro. 

Muita gente reclama da violência e do uso de drogas por parte dessas pessoas e se queixam do governo. Como explicar que o governo não pode retirar essas pessoas da rua?  

Importante frisar que existe uma proibição nacional para que não se faça essa retirada. Foi uma decisão do STF. Isso acarretou na sensação de que o número aumentou e não possibilitou que a gente avançasse nessas questões. Agora, com a implementação do plano, que é multidisciplinar, a área de segurança também é prioritária. 

Quais são os próximos passos? 

Fizemos fizemos duas ações-piloto, uma no Centro Pop da Asa Sul e outra em Águas Claras. Foram muito bem-sucedidas. O acordo com o MP era fazer essas duas ações e ver o que dava ou não certo e implementar ou modificar o plano. Fizemos isso. Apresentamos o diagnóstico para o MP, que fez a análise e inúmeras considerações das quais todas foram acolhidas. Isso fez com que assinássemos o termo de cooperação. A partir de amanhã (hoje), nós vamos retomar essas ações, sempre com muito cuidado, lembrando que o foco não é retirada das pessoas, e sim dar acolhimento e dar condições para essas pessoas saírem. Durante a semana passada e esta semana, as equipes do GDF estarão circulando nas região onde terão essas ações, conversando com as pessoas, explicando o leque de opções que o governo tem para oferecer para elas, para que elas possam sair desses locais. A gente vai começar pelo Eixão Norte, onde há uma concentração grande por conta do Eixão do Lazer, e na Avenida das Nações. Nós não vamos em locais com concentrações maiores porque estamos indo com muito cuidado e cautela. Estamos percorrendo locais onde todos os serviços do GDF podem ser oferecidos e não faltem opções para essas pessoas. A partir disso, a gente vai ganhando corpo nas ações e aumentando os locais de atuação. 

Como lidar com as pessoas em situação de rua que não querem sair das ruas? 

Buscar a conscientização dessas pessoas, mostrar para elas a oportunidade. Nós temos casos de pessoas em situação de rua que fizeram o Renova; hoje estão profissionalizadas e trabalhando regularmente. 

Há muitas crianças em situação de rua também. 

É uma ação multidisciplinar, então os conselhos tutelares e a Secretaria de Educação atuam. É o governo inteiro atuando. O governador criou um comitê específico para isso para que todas as secretarias possam atuar em conjunto para a solução desse problema. Não é fácil, mas a gente está disposto a enfrentar. 

Essas pessoas não pagam nos restaurantes comunitários. Muita gente não sabe disso. 

São gratuitos em todos os restaurantes comunitários. Está sendo implementado em seis restaurantes café, almoço e jantar gratuitos, nos outros serão implementadas as três refeições até o ano que vem. Isso já é um sucesso, tem uma procura muito grande pela população em situação de rua. A secretária de Desenvolvimento Social, Ana Paula, está desenvolvendo um restaurante itinerante, para que possa ir nesses locais para levar o alimento para essas pessoas.   

Como ter acesso a isso? 

Basta fazer o cadastramento na própria Sedes. 

Assista o CB.Poder na íntegra

 

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