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Quadrilheiros mostram importância social dos grupos durante o são-joão

Conheça histórias de pessoas, como José Pereira da Silva, de 75 anos, um dos responsáveis por criar a LINQ-DFE

Para eles, o são-joão é todo ano. Muito trabalho e muita paixão. Conectados fortemente com a tradição, os quadrilheiros organizam, ensaiam, dançam e adotam o movimento como parte de suas vidas. No Distrito Federal, há aqueles que começaram quando o cenário junino mal tinha força, mas ajudaram a construí-lo, e, agora, os mais jovens declaram sua paixão. O Correio conheceu as histórias de participantes das ligas juninas do DF que, independentemente do tempo de atuação, estão unidos pelo amor ao mundo junino. 

Hoje, dançarinos da nova geração que, apesar da diferença de idade, compartilham com os mais velhos do mesmo amor pelo universo junino. Maykon Araújo dos Santos, 20 anos, teve o primeiro contato com a dança aos 3 anos, nas escolas públicas em que estudou na Ceilândia e, desde então, nunca mais parou. 

Na quadrilha Sanfona Lascada, da Federação de Quadrilhas Juninas do Distrito Federal e Entorno (Fequaju-DFE), Maykon atuou como rei, noivo e hoje, além de dançarino, ensaia alunos de escolas públicas para as apresentações juninas que acontecem nessas unidades. "Minha avó era costureira e fazia as minhas roupas de quadrilha junina, que eu usava nas apresentações da escola, desde então a paixão começou. A dança me tira desse mundo caótico que a gente vive hoje. Na dança me descubro como ser humano." 

"Para mim, a cultura salva vidas. O cenário junino me curou muito e me tirou de um mundo que estava me levando para o mal e mostrou que a cultura salva. É isso que faço hoje nas escolas. Muitos alunos falam que eu os salvei quando mostrei o caminho bom", se emociona. 

Raízes juninas 

O piauiense Joanivaldo Pereira, 50, atua como marcador da quadrilha Arraiá Chapéu de Palha, da liga União Junina- DF. De raízes nordestinas, cresceu brincando os festejos juninos desde a infância. Quando chegou à capital, aos 14 anos. Em Samambaia, percebeu que o cenário junino era completamente diferente do que era visto no Nordeste, decidiu participar da cena junina. 

Conta que em 1990 fundou, com dois amigos, a primeira quadrilha da região. Em meio às lágrimas, Joanivaldo relembra que os pais, já falecidos, se alegram em acompanhar as apresentações e define que o São João trata-se exatamente disso. "O objetivo é levar alegria e descontração, porque a gente convive num mundo bastante duro, então a gente busca levar a leveza da coisa para descontrair as pessoas", diz. 

O mascote da liga 

O sobrinho de Joanivaldo, Guilherme Alves tem apenas 8 anos, mas já tem demonstrado com muita veemência o amor pela quadrilha. No ano passado, o menino começou a acompanhar o tio nos ensaios e logo decorou as músicas, as falas do teatro e os passos da dança. Percebendo o talento do pequeno Guilherme, a família resolveu inclui-lo nas apresentações. "Eu vi que ele tinha uma desenvoltura muito bonita, comecei a incentivar e o coloquei para ensaiar com o grupo. Agora ele virou o xodó do grupo. Como é pequenininho, eu o apelidei de 'pouca sobra'", brinca Joanivaldo. 

"Eu acho muito engraçado, eu quis dançar porque eu vi meu tio dançando e senti aquela animação, é divertido, eu entro no coração (da dança), faço algumas graças e o povo gosta", conta Guilherme. 

Letícia Guedes -
Marcelo Cândido/Material cedido -
Kayo Magalhães/CB/D.A Press -
Minervino Júnior/CB/D.A.Press -

Sangue junino

Maguinaldo de Sousa Guedes, 54, é vice-presidente e dançarino da quadrilha Chinelo de Couro, filiada à Liga Independente de Quadrilhas Juninas do Distrito Federal e Entorno (LINQ-DFE). Baiano, declara que o sangue junino corre em seu corpo desde a infância.

Em 1994 fundou, com amigos, a própria quadrilha, à época chamada de Caipiras do Bosque. Oito anos depois, Maguinaldo filiou-se à liga e nasceu, oficialmente, a Chinelo de Couro, que se apresenta até hoje. "Para mim, o São João é alegria, é tudo. Eu me apresentei com a minha filha, eu era o noivo e ela a noiva, transformamos a história do Sítio do Picapau Amarelo em uma apresentação junina. Minhas duas filhas dançam e a minha neta de 10 anos está apenas esperando a idade certa para poder dançar também." 

Além de fazer parte da gestão e atuar como dançarino, Maguinaldo ressalta, empolgado, que também faz questão de costurar os figurinos. "Eu não penso em parar. Até o dia que eu aguentar, vou continuar e depois que parar, alguém fica. Isso me faz feliz, quando fala de quadrilha junina o sorriso automaticamente aparece."  

Conexão 

Os pequenos Maria Sofia Neri da Silva, 8, e Gabriel Ferreira, 12, também fazem parte dessa grande família junina. Os dois formam um dos pares da quadrilha Espalha Brasa, da LINQ-DFE. Neste ano, Gabriel realiza, pela primeira vez, o sonho de se apresentar. No caso de Maria Sofia, será a segunda vez. 

Filha da vice-presidente da quadrilha, Hellem Nere, 42, Sofia faz parte do movimento junino desde que estava na barriga da mãe. Dançarina há cerca de oito anos, a mãe, Hellem, relata que a filha sempre acompanhou as apresentações com muita empolgação e, após perceber que a menina realmente levava jeito, deu então autorização para que ela começasse a participar de algumas apresentações, uma vez que não tem idade suficiente para competir. "Quando assistia às apresentações, sentia uma coisa bem forte no meu coração, sentia mesmo que precisava dançar e, quando tive a oportunidade, fiquei feliz, amei desde a primeira vez", explica Maria Sofia. 

Gabriel descobriu o universo junino por meio das duas tias que também são dançarinas. Elas entraram na Espalha Brasa em 2022 e ele, que fazia questão de acompanhar todos os ensaios, logo expressou a vontade de dançar também.  "Eu sinto felicidade quando danço, não fico nervoso e nem sinto vergonha. Eu fico ansioso querendo ser noivo, eu acho muito legal", afirma ele.  O pequeno Gabriel tem o laudo de Transtorno do Espectro Autista (TEA), mas isso não o impediu de ser escolhido por Hellem para fazer par com Maria Sofia. 

José Pereira da Silva, 75, é gestor de quadrilhas e foi um dos responsáveis por criar a Liga Independente de Quadrilhas Juninas do Distrito Federal e Entorno (LINQ-DFE), por volta de 1998, e a Confederação Brasileira de Entidade de Quadrilhas Juninas (Confebraq), em 2002. Relembra que começou atuar no cenário junino porque tinha 22 sobrinhos e gostaria de encontrar uma atividade que pudesse ser vivenciada por toda a família. 

Confessa que o principal objetivo, desde que passou a atuar na gestão de quadrilhas, sempre foi unificar as entidades de quadrilhas existentes, uma vez que no princípio o cenário era coberto de rivalidade. "Durante esse tempo de atuação, a gente recebeu gente de todos os perfis, traficantes, usuários, brigões e tínhamos que saber como lidar. Hoje, essas pessoas são pais de família, trabalhadores e jamais nos esquecem. A quadrilha junina transforma as pessoas para o bem, é exatamente isso que ela faz", pontua.

 


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