Para quem desconhece os selos postais, pode soar estranho pensar que, antigamente, um pedaço de papel, colorido e autocolante, tinha o poder de disseminar cultura enquanto ia de um lugar para outro. As imagens da fauna e da flora nativas dos países, as fotografias dos pontos turísticos das cidades e as estampas das moedas percorriam o mundo inteiro por meio das cartas. O que antes servia apenas para comprovar o pagamento do serviço postal, tornou-se veículo de transmissão de cultura e, com o tempo, passou a conquistar admiradores ao redor do mundo.
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Hoje, apesar do envio de cartas ter sido praticamente extinto, ainda há pessoas que se dedicam à filatelia — estudo e colecionismo de selos postais — e guardam relíquias históricas. Reinaldo Macedo, vice-presidente da Federação Internacional de Filatelia (FIP) e presidente da Academia de História Postal e Filatelia do Brasil (AHPFB), informou que atualmente há cerca de 8 mil colecionadores de selos em todo o território brasileiro.
Segundo Macedo, que também é um colecionador, durante a pandemia muitas pessoas retiraram os selos do fundo da gaveta e voltaram a se dedicar às coleções. "A facilidade de comunicação via rede social fez surgir grupos de WhatsApp. Hoje, eu estou em pelo menos 50 grupos de informações filatélicas, trocando conhecimentos. Ou seja, se por um lado a comunicação foi uma vilã, durante o período de pandemia ela ressuscitou a filatelia de forma exponencial", disse.
O Correio conheceu Hubert Cormier, 88 anos, Wady Nagem Vidal, 60, e Beatriz Vasconcelos, 17, que, apaixonados por selos postais, são donos de extensas coleções, cada um com sua própria temática e conexão com a arte da filatelia.
"Eu viajo por meio dos selos"
Nascido no Marrocos, na África, e criado na França, o aposentado Hubert Cormier, 88 anos, morador da Asa Sul, herdou do pai a paixão fervorosa pelos selos postais. Montou a primeira coleção aos 7 anos e a guarda, com muita cautela, até o presente.
O Correio foi à casa do aposentado para conhecer a vasta coleção de perto. Orgulhoso, mostrou detalhadamente os álbuns onde abriga seus quase 40 mil selos postais. De maneira surpreendente e sem muitas dificuldades, Hubert contou a história de cada um dos selos, bastava apontar para a estampilha e a resposta estava na ponta da língua.
"Eu tenho selos do mundo inteiro, todos que aparecem são bem-vindos. Eles são fonte de prazer intelectual. Por meio deles, faço as minhas viagens a todos os países do mundo. Vejo a cultura de cada povo, a beleza dos animais, das flores, das árvores, da natureza. É um passatempo que me toma horas a fio. E durante momentos muito difíceis, são fonte de salvamento psicológico", declarou.
A filha do colecionador, Patrícia Cormier, 55, contou que o pai passa praticamente 24 horas envolvido com a coleção. Ela destacou que, para além de um hobby, essa é uma maneira dele manter-se ativo, estimulando a mente ao estudar e contar as histórias, além de incentivar a socialização, quando vai às exposições para trocar as estampilhas repetidas. "Ele, inclusive, aprendeu a mexer no computador sozinho para pesquisar as histórias dos selos e procurá-los na internet", disse.
Pai de três filhos, avô de quatro e bisavô de uma, confessou que, infelizmente, os descendentes não herdaram o gosto pelos selos. No entanto, todos fazem questão de sentar para ouvir as histórias que Hubert tem para contar, o que é motivo suficiente para que ele se sinta feliz.
Paixão de infância
O engenheiro Wady Nagem Vidal, 60 anos, morador da Asa Sul, iniciou sua coleção em 1972, quando tinha 8 anos. Ficou encantado quando viu na TV a propaganda dos Correios sobre o lançamento de uma série de selos em comemoração ao sesquicentenário (150 anos) da Independência do Brasil. "No fim daquele ano, nós fomos de férias visitar minha avó em Vitória (ES), então eu fui aos Correios, comprei um dos cinco selos e me intitulei 'colecionador de selos'. Nunca mais parei!", contou.
Atualmente, Wady tem coleções de selos do Brasil, de Portugal e da Inglaterra, além de uma voltada apenas para aves. "Mas, hoje, a coleção a que mais me dedico é à do oCorreio Aéreo no Brasil, de 1925 a 1945. Essa coleção acabou de obter 90 pontos na exposição mundial EFIRO 2024, o que significa medalha de ouro", disse orgulhoso. Apenas com essa coleção, o engenheiro já conquistou três medalhas de ouro. "A filatelia significa, para mim, amizades, estudos, cultura, viagens. Muitas das minhas amizades foram forjadas graças à filatelia, às reuniões nos clubes filatélicos, feiras e exposições", declarou.
Jovem
A estudante Beatriz Vasconcelos, 17 anos, conheceu a filatelia por meio de um curso ofertado na escola. Em 2016, o Colégio Mackenzie Brasília, onde a menina estudava, à época com 10 anos, organizou um clube de filatelia aos alunos interessados. Ela, que amava adquirir novos hobbies, não pensou duas vezes antes de se inscrever.
"Quando conheci os selos postais, achei muito interessante porque era um jeito diferente de contar histórias. Eu sempre gostei muito de coisas antigas também, então eu vi ali uma coisa que misturava tudo que eu gostava e que eu podia escolher o tema que eu queria", contou.
Hoje, oito anos depois do primeiro contato, Beatriz é dona de uma extensa coleção sobre animais do Ártico e da Antártida e participa da classe expositiva dedicada à filatelia juvenil, onde já conquistou diversos prêmios.
A mãe da estudante, Vivianne Vasconcelos, 53, explicou que é muito importante o incentivo da filatelia, mas que as crianças interessadas precisam do apoio dos pais. "A filatelia é trabalhosa, não é fácil achar os selos que se encaixam no tema, é necessário pesquisar, há uma sequência exata e por isso, no caso das crianças, é necessário o apoio dos pais, até porque os selos não são tão baratos. Dá para montar, sim, uma coleção com selos mais em conta, mas dependendo do tema há uma dificuldade", informou.
Saiba Mais
Curiosidades
O primeiro selo postal foi o “Penny Black”, criado na Inglaterra, em 1840.
O Brasil foi o 2° país a lançar um selo. A primeira emissão postal brasileira, chamada de Olho de Boi, aconteceu no dia 1° agosto de 1843.
Explicando os termos
Colecionadores - pessoas que guardam selos como objeto de recordação/admiração.
Fiilatelistas - pessoas que, além de colecionarem, estudam as histórias dos selos.
Expositores - colecionadores, filatelistas, que organizam as coleções e expõem mundialmente, conquistando, inclusive, prêmios
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