O ex-delegado-chefe da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) Robson Cândido tirou a tornozeleira eletrônica na última terça-feira (27/2). O delegado utilizava o aparelho desde novembro do ano passado, após ficar quase um mês preso na carceragem da polícia.
Cândido compareceu ao Centro Integrado de Monitoração Eletrônica (Cime), da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), onde ocorreu a retirada do equipamento. A medida ocorreu baseada no prazo de monitoramento estipulado pelo governo, que é de três meses.
Apesar disso, a ex-namorada de Cândido informou à Justiça, nesta sexta-feira (1°/3), que tem interesse que o ex-delegado-chefe da corporação continue utilizando a tornozeleira: "Me sinto insegura e em um mês, ele descumpriu as medidas protetivas três vezes, só que não há mais registros, pois devolvi o aparelho", disse ela.
O aparelho que a vítima cita foi devolvido por ela, no mês passado, após ela demonstrar insatisfação com o programa de proteção do governo do Distrito Federal (GDF). Cândido é réu, desde janeiro deste ano, por crimes, como stalking (perseguição); violência psicológica; descumprimento de medida protetiva; peculato, por três vezes; corrupção passiva, por três vezes; e intercepção telefônica ilegal, por duas vezes.
O ex-chefe da PCDF também responde por ter usado o sistema OCR do Departamento de Estrada e Rodagem (DER-DF), por 30 vezes; uso do sistema OCR do Departamento de Trânsito (Detran-DF); violação do sigilo funcional do sistema OCR do Detran; uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Falso Policial, por 96 vezes; e uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Alcatéia, por 58 vezes.
Além de Cândido, o delegado Thiago Peralva, suspeito de auxiliar o então delegado-chefe, responde pelos crimes de stalking (perseguição); corrupção passiva, por três vezes; intercepção telefônica ilegal, por duas vezes; uso do sistema OCR do Departamento de Estrada e Rodagem (DER-DF); e uso do sistema Vigia, da PCDF.
A denúncia que levou a dupla a se tornar réu revelou que, além da vítima ter tido o número colocado em uma interceptação telefônica na 2ª Vara de Entorpecentes — amplamente divulgado pelo Correio, a dupla “plantou” antes o número da jovem em uma investigação encerrada que tramitava na 1ª Vara Criminal de Ceilândia.
Peralva plantou o número da vítima no sistema Vigia, a mando do ex-chefe, no âmbito da Operação Falso Policial, que investigava crimes de extorsão em Ceilândia. A operação durou de 13 a 28 de setembro, sendo finalizada coincidentemente no dia após a vítima procurar a 27ª Delegacia de Polícia (Recanto das Emas) para relatar os abusos que sofria.
Para o MP, a jovem não tinha nenhuma relação com os crimes e a única intenção era saber os passos da vítima, além de saber com quem ela falava e os lugares que frequentava. Ao todo, Peralva — que manuseava do acesso ao sistema — fez consultas diárias e por diversas vezes, totalizando nada menos que 96 acessos.
Porém, segundo as investigações, Peralva incluiu o número da vítima, em 26 de setembro, em uma outra interceptação telefônica em curso, agora na 2ª Vara de Entorpecentes que apurava tráfico de drogas, no âmbito da Operação Alcatéia. O ato prosseguiu até 31 de outubro, quando Cândido já havia deixado o cargo máximo da corporação. Nessa, ao menos 58 vezes a vítima foi monitorada pelo ex-chefe da delegacia de Ceilândia, a mando do chefe.
OCR
Entre o período de 6 de agosto a 22 de setembro, Cândido utilizou indevidamente o sistema OCR administrado pelo DER-DF, por meio de demandas dirigidas à Divisão de Inteligência Policial (DIPO) da corporação, para localizar a placa da vítima. A ferramenta é utilizada para ler com mais clareza placas dos veículos e ajudar a monitorar motoristas que estão em situação irregular, além de ser um aparelho em que ajuda as forças de segurança.
O ex-delegado-chefe da corporação, em 6 de agosto, com o propósito de descobrir onde a ex-namorada se deslocava, acionou a inteligência da corporação para verificar uma “situação supostamente criminosa” envolvendo um veículo.
Para explicar o porquê da consulta, Cândido enganou um dos delegados e contou que o carro estava sendo envolvido em um “esquema de estelionato relacionado a leilões”. Ocorre que o veículo era da ex-namorada dele. A mesma situação ocorreu, ao menos, em outras cinco vezes. Em todas, o ex-delegado-chefe era municiado de informações colhidas pela DIPO com o sistema OCR do DER.
Não satisfeito, o ex-delegado-chefe também solicitou as informações de OCR a Peralva. Os promotores citam que, ao todo, Peralva acessou 30 vezes o sistema para obter informações sobre o deslocamento da vítima, principalmente na região onde ela residia, em Águas Claras.
O intuito era diminuir os pedidos de Cândido à inteligência, a fim de evitar exposições. O ex-chefe só conseguiu acesso ao sistema por meio de uma conta de outro policial civil, entre 20 e 29 de setembro. Dos 30 acessos, 24 foram realizados na própria residência de Peralva — sendo repassadas todas as informações da localização da vítima ao chefe.
Pesquisas
Um dos pontos revelados pelo MP na denúncia são pesquisas que Robson Cândido buscou na internet. No Google, o ex-delegado-geral pesquisou “crime de stalking”, “localizar ERB (Estação de Rádio Base) de celular”, “pesquisar OCR de carro”, “interceptação telefônica”, “uso de viaturas improbidade” e “passo a passo de processo de violência contra mulher”.
Os dados foram encontrados no aparelho apreendido do ex-chefe da corporação. Para o MP, as buscas “traduz-se em uma verdadeira confissão dos delitos já denunciados e expõe o nível de obsessão nutrido por Robson em relação à vítima e demonstram que os atos criminosos por ele praticados foram minuciosamente premeditados”.
Cândido está solto, assim como Peralva. Recentemente, o MP teve um pedido de prisão contra o ex-delegado-chefe da PCDF negado.
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