Dengue

Dengue: pacientes que estiveram nas tendas relatam dor e medo

Moradores do Distrito Federal que foram até os locais de atendimento em Ceilândia e Samambaia contam os dramas, os cuidados e o tratamento que tomam em relação à doença

Com uma média de 250 pacientes acolhidos a cada dia, a tenda montada na Administração Regional de Ceilândia tem servido para desafogar outros instrumentos públicos sob gestão da Secretaria de Saúde (SES-DF), num panorama preocupante, já que a Ceilândia segue, pelos dados do mais recente boletim epidemiológico, como o centro de maior incidência da dengue, com 3.963 casos prováveis.

Coordenador da tenda, o enfermeiro Henrique Queiroz detalha o encaminhamento de cada paciente, que, na manhã de ontem, formavam fila de 50 pessoas. "Depois da triagem, há a notificação da doença (com distribuição do cartão da dengue), e o fluxo segue para a aferição dos sinais vitais do paciente (com uso de oxímetro e o registro da pressão arterial), depois da testagem rápida, vem a prova do laço (exame clínico que sinaliza possibilidade de sangramento, fator que pode indicar a dengue hemorrágica) e daí se segue para o atendimento com médicos e enfermeiros, exames laboratoriais, hidratação venosa (se houver necessidade) e, da farmácia, o paciente vai para casa ou é conduzido para ampliação de recursos", enumera o enfermeiro, que conta estar vivendo rotina puxada e parecida com a da época da covid-19. Dada a gravidade na região, houve abertura de tendas de atendimento no Sol Nascente (na segunda posição de estouro da dengue, com 1.100 casos) e funcionamento prolongado da UBS de Ceilândia Norte.

Com a projeção inicial de 16.079 casos prováveis, a dengue tem interferido no cotidiano de pessoas como Otávio Luis Marson, autônomo de 43 anos, que sentia, pela primeira vez, as dores decorrentes da arbovirose, ainda suspeita. "Trabalho na rua, e, na sexta-feira, me deu uma febre alta misturada com muita dor, geral e ainda localizada, nas pernas e nas costas. Como mexo com reciclagem, então qualquer lugar é propício de trazer focos da doença: cato garrafas e latinhas. Ferro, que tirava de caçamba nas ruas, parei de recolher. Pela época da chuva, teve a orientação do DF Legal (Secretaria de Proteção da Ordem Urbanística) de que fossem recolhidas muitas caçambas", explicou. Para além dos cuidados pessoais, em família, como colocação de areia nos jarros de plantas e água sanitária nos ralos, Otávio ainda zela pelo lixo bem embalado e fechado. "O pessoal da vizinhança é cuidadoso, ajuda muito e são unidos no combate à doença", comentou.

A mesma sorte, de uma vizinhança consciente, parece não ter cercado a aposentada Inês Pereira dos Santos, 73. Ela é a quinta pessoa da família — depois da dengue em três netos e um filho — a encarar a suspeita da doença. "Eles ficaram muito mal, há duas semanas. Quase todo mundo teve dengue, na minha rua. Deve ter é foco do mosquito", apontou a aposentada, que garante não ter visto mosquito em casa — "nem planta eu tenho". Moradora do P-Sul há 36 anos, Inês teve a suspeita endossada pela filha Janaína. "Ao lado de casa, tem uma serralheria, em reforma constante e com áreas que favorecem o acúmulo de água e ainda muito entulho de ferro", disse. As fortes indisposições de Inês começaram na última sexta-feira: febre, dores nas costas e na cabeça. "Nem coberta tampava o frio: fiquei foi esquentando as roupas para poder usar", desabafou a aposentada.

Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -
Ricardo Daehn/CB/D.A Press -

"Muita fraqueza"

Quem partilhava da indignação (com o desleixo de alguns), prestes a ser atendida, na tenda montada na Administração da Samambaia, era Claudia Regina de Oliveira, 52, esposa de um funcionário público da área de saúde, Julio Carlos de Oliveira Neto, 60, igualmente acometido pela dengue. Já amenizadas nele, as dores não davam trégua para Claudia. "Dói demais, tudo. Tenho muita fraqueza: é horrível. Nunca tinha tido. Estou com muita dor de cabeça, calafrios, dores nos olhos. A verdade é que ninguém está de fora. O mosquito é mais forte do que nós, quando se vê a situação de lixo acumulado e as vasilhas de água parada", sublinhou. Com 997 casos, Samambaia figura na quarta posição de locais críticos da dengue, atrás ainda de Brazlândia (com 1.045 casos).

Adepta do uso do repelente de colocar na tomada, a aposentada Luzinete Rodrigues, 63 anos, já planejava a limpeza da calha, na casa em que mora, no Riacho Fundo. Ao lado do filho, o analista de sistema Jonatas Rodrigues, 30, Luzinete aguardava, na tenda montada no Recanto das Emas, pelo diagnóstico do filho. Ainda na incerteza "entre uma infecção" ou a dengue, Jonatas, febril há três dias, resolveu tirar a dúvida, especialmente depois de sentir muitos enjoos. Ele conta que, com umas plantações, nos arredores de casa, pode ter se descuidado com alguma poça de água. A mãe conta que, há cinco anos, por 13 dias ficou baqueada com a dengue. "Foi uma grande luta: era muito enjoo, febre, fraqueza e calafrio", comentou.

Com quase quatro horas de trâmites na tenda de Samambaia Sul, que, às 15h, aglomerava mais de 120 pessoas na fila de espera, a auxiliar de departamento pessoal Priscila Lidia dos Anjos, 31, sentia relativo alívio ao deixar o local. "Não fizeram o teste: disseram que os testes eram para casos mais graves e que, pelas manchas no corpo, e outros sintomas tiveram a certeza do quadro da dengue. Mas tenho que ir ao posto de saúde para encaminhamentos como o do exame de plaquetas. É a segunda vez que tenho, mas está bem diferente: da outra vez, fiquei 15 dias muito ruim e as plaquetas abaixaram muito", disse Priscila, já de posse do kit de remédios: ondansetrona (para o enjoo), paracetamol e o antialérgico loratadina.

Segundo ela, o quadro da sobrinha Luisa, 4, também com dengue, está bem controlado. Em Priscila, as dores e sintomas começaram, na sexta-feira: dor no corpo, forte dor de cabeça e enjoos, ainda que consiga alimentar. "Vou ter que mudar hábitos: sou péssima para beber água! Mas vou modificar", assegurou.

Mais Lidas