Na Vila Cauhy, as recentes chuvas fortes no DF trouxeram destruição a lares nessa comunidade. Móveis e alimentos ficaram estragados. Roupas, materiais escolares e instrumentos de trabalho perdidos para sempre. Os temporais deixaram apenas o desalento para moradores que perderam o pouco que tinham. A situação também foi parecida no Sol Nascente.
Era madrugada de quarta-feira (3/1), quando Sirleia dos Santos, de 43 anos, despertou com o barulho da tempestade. Em pouco mais de uma hora, a lama e a água do esgoto tomavam conta da cozinha e do quarto. Apressadamente, conseguiu colocar a cômoda com as roupas do neto, de 2 anos, sobre a cama. Isso foi o que sobrou.
"A gente já passa por tantas necessidades. Somos humildes. De repente, chuva e lama levaram embora o pouco que temos", desabafou a cuidadora de idosos. Ela, na manhã de quinta-feira (4/1), avaliou os estragos na residência, localizada na vila que fica no Núcleo Bandeirante. Constatou que a geladeira queimou, o colchão ficou inutilizado e os brinquedos do bebê se perderam no barro.
Dos bombeiros, recebeu a recomendação de sair de casa durante os dias mais chuvosos. Mas, ressentida, rebateu: "E vou para onde, sem roupas, sem produtos de higiene e sem esperança? Eu me sinto sem saída". Ainda na tarde de quarta, recebeu marmitas do governo, um alento a quem não tinha mais o que comer.
Caminhando pela Rua da Glória, a reportagem encontrou profissionais do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) recolhendo entulhos e objetos sem utilidade. Enquanto isso a Administração do Núcleo Bandeirante avaliava os estragos das tempestades. "Eita, a chuva começou de novo. Deus tenha misericórdia de nós", ouviu-se de um morador.
A maior
Em uma casa próxima ao córrego Riacho Fundo, que transbordou, o pedreiro Antônio Ferreira, 58, fazia coro a Sirleia: mudar-se não era opção. "Moro aqui há vinte anos, não tenho planos de sair", falou antes de admitir que o alagamento o assustou: "Já vi outras inundações, mas essa cheia foi a maior de todas".
Quando as chuvas mais intensas começaram, ele, a esposa e os três filhos se uniram para colocar o máximo de objetos e móveis sobre a cama. Em pouco menos de uma hora, o chão já estava tomado pela lama. E para não ter a vida em risco, a solução foi correr às casas mais altas, dos vizinhos, onde esperaram a água abaixar.
Valtenci Mesquita, 46, é comerciante. Também concordou que essa enchente foi a maior que presenciou. "Por sorte, estamos na parte mais alta do bairro, onde a chuva não chegou. Mas muitos moradores vieram se abrigar aqui nos momentos mais desesperadores", lamentou. Os produtos de higiene e de limpeza passaram a ser os mais procurados em vista das circunstâncias.
Em torno das 10h de quinta-feira (4/1), a líder comunitária Karol Carvalho, 31, repassava a mensagem, de porta em porta, de que sabão e água sanitária estavam sendo distribuídos aos moradores. Além disso, coletava informações sobre as maiores necessidades das famílias. "Água potável, alimentos, produtos de limpeza e colchões são o que mais precisamos no momento. Nosso ponto de coleta é na prefeitura comunitária da Vila Cauhy", detalhou.
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"Bolsas"
No Trecho 2 do Sol Nascente, a situação é menos pior. Mas nem por isso boa. A falta de nivelamento e asfalto nas ruas resulta em grandes buracos que, regados pelas chuvas, formam "bolsas de águas" e atrapalham o ir e vir dos moradores. "Quando tem tempestade, fica muito difícil passar por aqui. Se há necessidade de sair de casa, o jeito é colocar sacolas plásticas nos pés ou carregar roupas limpas e sapatos secos na bolsa", explicou Yasmin Santos, 28.
Ela, que é foguista – pessoa que cuida das fornalhas nas máquinas a vapor –, afirmou que a Administração já mandou aplanar o local, porém não foi suficiente. "Às vezes, colocamos até pedras nos buracos, para tentar melhorar a situação." Por outro lado, o líder comunitário do lugar, Lourival Lopes, 67, considera que os próprios moradores têm sua parcela de culpa por não ajudarem a manter a região limpa e organizada. "Não falta lixo nas ruas e 'gatos' de água e energia. Além do perigo de choques elétricos, tememos pegar dengue, com o acúmulo de água parada", examinou, enquanto recolhia uma lata de alumínio jogada em frente a uma casa.
Doações
A Comunidade Obra de Maria, que também está na Vila Cauhy onde realiza trabalhos de assistência social, foi bastante prejudicada e teve sua sede alagada. Por isso, além das doações que costuma pedir para levar à frente suas atividades, agora também as necessita para seguir atuando. A entidade solicita cestas básicas, roupas e dinheiro, que pode ser depositado na conta 75974-0, agência 1235-1, CNPJ 15.273.795/0002-60
Sem corte de luz
A Neonergia informou que as chuvas não causaram interrupção no fornecimento de eletricidade ao DF. E que desde agosto do ano passado adotou medidas para enfrentar eventuais dificuldades que pudessem ser causadas pelas chuvas. Em caso de alguma ocorrência na rede elétrica, os clientes têm disponíveis o telefone 116, o WhatsApp (61. 3465-9318) e o aplicativo Neoenergia Brasília.
Alertas
A Defesa Civil disponibilizou uma ferramenta para enviar sinais de alerta à população, como riscos com chuvas fortes, vendavais, excesso de relâmpagos, entre outros. O interessado nesse serviço gratuito tem apenas que enviar o CEP, por SMS, ao número 40199. Sempre que alguma anormalidade for previamente detectada, receberá avisos.