A ex-namorada do ex-delegado-chefe da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) aceitou a oferta do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Águas Claras para ter acesso a um dispositivo de segurança. A vítima encaminhou um documento contando que, após ler a notícia de que Robson foi solto, teve uma crise de pânico, ansiedade e insônia.
“Atualmente, ele ganhou a liberdade e eu virei prisioneira, pois estou sem sair de casa, com medo de ser assassinada”, escreveu a jovem.
O documento foi encaminhado ao juiz Frederico Ernesto Cardoso Maciel, do Juizado de Águas Claras, no início da noite desta quinta-feira (30/11). Ele propôs o dispositivo de segurança à vítima após Cândido ter tido a prisão preventiva convertida em medida cautelar, pelo desembargador Waldir Leoncio Cordeiro Lopes Junior, da 3ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT).
Na manifestação, a vítima narrou que Cândido é extremamente vingativo e que não aceita ser contrariado. Por ele ter sido preso, ela desconfia que o ex-número 1 da PCDF tente descontar toda a raiva nela.
“O índice de feminicídio aumentou no DF e existem várias campanhas direcionadas ao combate da Violência contra a Mulher, porém, de nada adianta as mulheres denunciarem se o agressor não for devidamente punido desde o início, com base em provas concretas (como é o meu caso)”, escreveu a jovem (leia a manifestação abaixo).
A vítima contou que quando foi prestar depoimento com a esposa do ex-delegado-chefe da PCDF, ela revelou que o ex-chefe da 19ª Delegacia de Polícia (P Norte), Thiago Peralva, já havia contado a Cândido o novo endereço dela.
“As perseguições no meu trabalho não dependem de mecanismos da PCDF, as perseguições no trânsito não dependem necessariamente de viaturas da PCDF (podem ser feitas em qualquer veículo), as ligações podem ser realizadas de qualquer aparelho telefônico”, desabafa.
Ao fim, a vítima agradece ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e ao próprio juiz Frederico Ernesto, pedindo a proteção proposta pelo juizado. Na assinatura do documento, a vítima escreveu “atenciosamente, uma sobrevivente da violência contra a mulher”.
Leia a carta na íntegra:
Diante da intimação solicitando minha manifestação de interesse no DMPP, gostaria da oportunidade para apresentar alguns fatores que devem ser apreciados.
Após receber a notícia de que Robson foi solto, tive uma forte crise de pânico, choro, ansiedade e insônia. Atualmente, ele ganhou a liberdade e eu virei prisioneira, pois estou sem sair de casa, com MEDO DE SER ASSASSINADA. Não sei como serão meus próximos dias, pois tenho que comparecer ao meu trabalho, queé minha única fonte de sustento, pois sou absolutamente sozinha em Brasília, minha família é do interior de Minas Gerais e não estão cientes do que está acontecendo (não quero preocupá-los).
Penso que, Robson estava preso com a finalidade manter a minha integridade física intacta, mas se eu morrer, talvez seja considerado o entendimento de que a liberdade dele não interfira mais na ordem pública.
Morei com o Robson, entre idas e vindas, de junho/2023 até agosto/2023, convivíamos o tempo todo juntos e sei que ele é extremamente vingativo e não aceita ser contrariado. Como ele ficou preso, teve tempo suficiente para pensar e talvez planejar como iria descontar sua raiva em mim. Estando em liberdade, além de o próprio poder fazer algo comigo, ele também pode se comunicar com pessoas e mandar alguém vir fazer.
Ressalto que, ao contrário do que a defesa alegou, como já manifestei em meus depoimentos, já fui agredida com empurrões e apertos no braço quando eu me recusava a entregar meu próprio celular tentando evitar que ele invadisse minha privacidade. Então, Robson me agredia para impedir que eu conseguisse pegar meu próprio celular de volta. Só não há registros desses episódios, pois era impossível filmar as ações sem estar com meu aparelho em mãos.
Após ler a Decisão presente no HC, onde diz que “... o fato de ele não mais ocupar qualquer cargo público, pois se aposentou quando os fatos ora em análise vieram a público, indica ausência de perigo concreto gerado pelo seu estado de liberdade, considerando que dificilmente ele terá acesso aos bens e aos sistemas corporativos para novos atos de perseguição contra a mulher...” Entendo que, com todo respeito, esse argumento não se sustenta, pois um dos 9 crimes em que ele é RÉU, é o de DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA, medidas essas que foram deferidas por este Juízo após Robson deixar o cargo de Diretor-Geral da Polícia Civil e se aposentar. Levando em consideração também que, muitos servidores da PCDF foram nomeados ainda na gestão de Robson, inclusive, o atual Diretor-Geral, José Werick, que é um amigo íntimo e era seu chefe de gabinete.
Destaco que, as invasões a domicílio não dependem de mecanismos da PCDF e, segundo o que a esposa dele me informou, Thiago contou a Robson meu novo endereço, as perseguições no meu trabalho não dependem de mecanismos da PCDF, as perseguições no trânsito não dependem necessariamente de viaturas da PCDF (podem ser feitas em qualquer veículo), as ligações podem ser realizadas de qualquer aparelho telefônico e Recebi um SMS do número particular de Robson em 11 de outubro desrespeitando as medidas protetivas impostas por este Juízo.
Ademais, o índice de feminicídio aumentou no DF e existem várias campanhas direcionadas ao combate da Violência contra a Mulher, porém, de nada adianta as mulheres denunciarem se o agressor não for devidamente punido desde o início, com base em provas concretas (como é o meu caso). Os fatos onde eu configuro como vítima tomou grande repercussão na mídia, e se o RÉU em 9 crimes permanecer em liberdade após vários indícios de delitos, várias mulheres irão se desencorajar a formalizar denuncias e os agressores terão estímulo e convicção da impunidade.
Agradeço imensamente o acolhimento e a atuação do Ministério Público e agradeço também ao Excelentíssimo Dr. Frederico Ernesto pelas providências que tomou em prol da minha segurança.
Diante do exposto, manifesto interesse e aceito o monitoramento que será realizado através da Diretoria de Monitoramento de Pessoas Protegidas – DMPP.
Brasília/DF, 30 de novembro de 2023
Atenciosamente,
Uma Sobrevivente da Violência Contra a Mulher
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