Mobilidade urbana

Greve é suspensa para renegociação e DF começa a voltar ao normal

Circulação de ônibus foi normalizada à 0h de hoje. Negociação entre empresas e categoria deve ser retomada amanhã. Com paralisação de 100% da frota, ontem, população precisou usar transporte pirata, por aplicativo e carona para chegar ao destino

Depois de cerca de 18 horas e muitos transtornos para a população do Distrito Federal, os rodoviários decidiram suspender a greve no início da noite de ontem, em assembleia do Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Terrestres (Sittrater-DF), no canteiro central próximo à rodoviária do Plano Piloto. A decisão, que foi apertada, determinou que quem estivesse em condições voltaria a trabalhar a partir das 19h de ontem e, quem não tivesse, somente à 0h de hoje.

Todos os ônibus ficaram parados nas garagens das empresas, desde a madrugada de ontem, prejudicando milhares de pessoas, principalmente no início da manhã (leia Sem ônibus, dia foi caótico). Vale destacar que os rodoviários não cumpriram os mínimos determinados para uma greve: 70% da frota rodando nos horários de pico e 30% no restante do dia. Além disso, uma decisão da Justiça, que considerava a paralisação abusiva, com multa de R$ 10 mil por hora, também foi descumprida. A sentença determinava que 100% das frotas rodassem entre 6h e  8h30 e das 17h às 19h30.

Houve uma reunião no Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10), no início da tarde de ontem, entre os empresários e a categoria, na tentativa de chegar a um acordo. O Correio apurou que, no encontro, as empresas de ônibus do DF mantiveram a proposta de 5,33% de reajuste dos salários. O presidente do TRT-10, desembargador Alexandre Nery de Oliveira propôs, na reunião, que os trabalhadores suspendessem a greve, além de sugerir que a negociação — entre o GDF, patrões e categoria — seja retomada amanhã, no Ministério Público do Trabalho, pelo prazo mínimo de 10 dias.

Sem condições

O sindicato informou aos trabalhadores presentes na assembleia que o Governo do Distrito Federal (GDF) comunicou, durante a reunião, que não teria condições orçamentárias de arcar com o aumento salarial de 8% pedido pela categoria. Apesar disso, paralelamente ao encontro, o governador Ibaneis Rocha (MDB) sancionou crédito suplementar de R$ 142 milhões para as empresas de ônibus do transporte público do Distrito Federal.

A portaria saiu ontem, em edição extra do Diário Oficial do Distrito Federal (DODF). O projeto foi aprovado na Câmara Legislativa (CLDF), na última semana, e os créditos serão financiados pelo excesso de arrecadação das fontes 161 (recursos de dividendos da CEB) e 178 (recursos decorrentes de juros sobre capital próprio). O texto original do governo citava que o recurso seria destinado a atender despesas com o passe livre para estudantes e a manutenção do equilíbrio financeiro do sistema de transporte público.

No entanto, um parecer da Comissão de Economia, Orçamento e Finanças (CEOF), de 31 de outubro, apresentou uma emenda modificativa do texto citando que a proposta visa, apenas, a manutenção do sistema de transporte público. A mudança causou um clima de desconforto em parte dos deputados, já que os parlamentares não sabiam o que, de fato, estariam votando. Uma reunião chegou a acontecer antes da votação, com a presença de integrantes da Secretaria de Transporte e Mobilidade Urbana (Semob) e de Planejamento com parlamentares. O projeto foi aprovado com 16 votos a favor e cinco contrários.

Repasses

Desde o ano passado, o GDF tem repassado quantias bilionárias às empresas. De acordo com a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), os valores pagos são referentes à manutenção do equilíbrio econômico financeiro do Sistema de Transporte Público (STPC-DF) e à concessão de passe livre para estudantes e pessoas com deficiência. Em 2023, até o momento, foram pouco mais de R$ 1,3 bilhão. O valor é 122,2% maior do que o repassado no primeiro ano do governo Ibaneis, quando foram cerca de R$ 585 milhões (confira Repasses).

Em relação à renovação dos contratos das concessionárias, a pasta esclareceu que as empresas Piracicabana, Pioneira e Urbi trocaram 100% de suas frotas e a renovação do contrato mostrou-se vantajosa, resultando em impacto econômico-financeiro positivo, com tarifas técnicas em valores menores. Sobre a Marechal e a São José, a Semob disse que o contrato foi renovado para que não haja descontinuidade no serviço, trazendo segurança de atendimento às pessoas que utilizam o transporte público no Distrito Federal nas áreas atendidas por cada companhia e mostrou-se vantajosa para a continuidade do serviço de transporte público coletivo do DF, uma vez que as empresas possuem a estrutura e o conhecimento da área de prestação do serviço.

Em relação à Marechal, o órgão destacou que o contrato foi renovado por até 10 anos e a concessionária assumiu o risco da prorrogação do contrato sob condição resolutiva, até o término do processo de licitação da Bacia explorada pela operadora, que está sob análise no Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). Enquanto à renovação com a São José, a Semob disse que a empresa assumiu o compromisso de renovar a frota e melhorar a prestação de serviço e que o processo de renovação dos coletivos está ocorrendo.

Sem ônibus, dia foi caótico

No dia em que o transporte do DF parou, ônibus piratas e transporte clandestino feito por carros de passeio e vans lucraram não só pelo transporte de passageiros, mas, principalmente, com a cobrança de até duas vezes o preço da passagem. O trânsito ficou caótico e muita gente chegou atrasada ou nem sequer conseguiu chegar ao local de trabalho.

Há quem precisou literalmente suar para chegar ao serviço, como é o caso da auxiliar de limpeza Maria Regina da Silva, 48 anos, que trabalha em Taguatinga Norte. Ela conta que precisou andar a pé de casa até a estação do metrô de Ceilândia Centro, de onde andou novamente, por cerca de 10 minutos, para chegar ao serviço. "Até passei mal, porque (o trem) estava cheio e não costumo andar de metrô", disse.

Morador de Vicente Pires, o auxiliar administrativo Arthur Felipe Sales, 21, chegou de carro, na carona com a mãe, a um ponto de ônibus da Praça do Relógio, no centro de Taguatinga, e foi pego de surpresa com a paralisação total dos rodoviários. Por volta das 7h, ele chegou a esperar 10 minutos por um transporte coletivo, mas desistiu de pegar a condução e de ir ao serviço, na Avenida Hélio Prates. "Avisaram muito em cima da hora a greve", criticou. "Querendo ou não, eles (rodoviários) precisam do reajuste deles, mas eu também precisava chegar no meu emprego", desabafou o jovem.

Segundo o advogado especialista em direito trabalhista Ronaldo Tolentino, no geral, é do empregado a responsabilidade de chegar ao local de trabalho. Mas, em situações excepcionais como esta, se o trabalhador não conseguiu outros meios de locomoção para chegar ao destino final, deverá negociar a falta junto ao empregador. “Não havendo solução para a ida do trabalhador ao local de trabalho, o empregador pode optar por uma compensação da falta com horas extras, trabalho em home-office ou simplesmente aboná-la em razão da greve”, garante o especialista.

Para Ronaldo, a demissão por justa causa não cabe ao caso, uma vez que o trabalhador não deu causa à falta e, ainda que houvesse dado, seria desproporcional. “Ele (funcionário) pode ajuizar uma reclamação trabalhista questionando a justa causa e pedindo a reversão para demissão sem justa causa”, finaliza o advogado trabalhista

Rodoviária

O transporte pirata tomou conta da Rodoviária do Plano Piloto na manhã de ontem. A técnica em enfermagem Patrícia Moreira, 24, é moradora de Taguatinga Sul e saiu às 4h40 de casa para tentar chegar às 8h em Planaltina. "Consegui pegar o metrô até o centro, me espremendo no primeiro vagão que passou", relatou. Até a estação, havia pegado um carro por aplicativo, apesar de os valores estarem mais caros. Para Planaltina, porém, optou por uma lotação clandestina, com o mesmo valor das passagens de ônibus, R$ 5,50. "Sei que não é seguro, mas vou fazer plantão e tenho paciente me esperando", comentou.

Já Edivânia Alves, 30, veio do Riacho Fundo 2 e, até a estação de metrô, conseguiu uma carona, mas o trânsito estava intenso e mais lento que em outros dias. Necessitando chegar ao trabalho às 9h, onde é auxiliar de classe, na 308 Norte, pediu um transporte por aplicativo, cujo tempo de espera era longo, devido à grande demanda de corridas. Sobre a greve, opinou: "É complicado, pois tem tempo que os rodoviários não paralisam, então imagino que, agora, seja por um motivo compreensível. Ao mesmo tempo, nós, trabalhadores que dependem dos coletivos, saímos prejudicados."

Escolas públicas

Em nota, a Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF) disse que acompanhou o impacto da greve dos rodoviários nas aulas da rede pública e assegurou que o estudante que não compareceu às aulas de ontem terá a ausência justificada e não sofrerá nenhuma perda pedagógica. A pasta, por meio de suas unidades escolares, disponibilizará atividades indiretas.

A Secretaria acrescentou que oferta o transporte escolar de modo suplementar ao transporte público. Mensalmente, são atendidos mais de 63 mil estudantes. Entre eles, 55,8 mil são de ensino regular; 6,3 mil, de educação integral; e 1,7 mil de ensino especial. "Dessa forma, quanto aos estudantes que são atendidos pelo transporte escolar, informa-se que não houve prejuízo ao acesso às escolas nesta segunda-feira", confirmou a SEEDF.

Em publicação nas redes sociais, a Universidade de Brasília (UnB) comunicou que, em virtude da greve dos rodoviários, recomendou aos professores que não realizassem avaliações ou outras atividades obrigatórias enquanto o sistema não voltar à normalidade. A nota foi assinada pelo vice-reitor, Enrique Huelva Unternbäumen.

Repasses bilionários

2019 — R$ 585 milhões
2020 — R$ 642 milhões
2021 — R$ 189 milhões
2022 — R$ 1,4 bilhão
2023 — R$ 1,3 bilhão

Fonte: Semob

Segundo o advogado especialista em direito trabalhista Ronaldo Tolentino, no geral, é do empregado a responsabilidade de chegar ao local de trabalho. Mas, em situações excepcionais como esta, se o trabalhador não conseguiu outros meios de locomoção para chegar ao destino final, deverá negociar a falta junto ao empregador. “Não havendo solução para a ida do trabalhador ao local de trabalho, o empregador pode optar por uma compensação da falta com horas extras, trabalho em home-office ou simplesmente aboná-la em razão da greve”, garante o especialista.


Para Ronaldo, a demissão por justa causa não cabe ao caso, uma vez que o trabalhador não deu causa à falta e, ainda que houvesse dado, seria desproporcional. “Ele (funcionário) pode ajuizar uma reclamação trabalhista questionando a justa causa e pedindo a reversão para demissão sem justa causa”, finaliza o advogado trabalhista.


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Minervino Júnior/CB/D.A.Press - A população se arriscou no transporte pirata, que lucrou com a greve, cobrando, em algumas linhas valores acima da passagem normal
Minervino Júnior/CB/D.A.Press - As plataformas da Rodoviária do Plano Piloto ficaram vazias ontem, por conta da paralisação
Minervino Júnior/CB/D.A.Press - Maria Regina disse que passou mal no metrô lotado, por não estar acostumada a utilizar o serviço
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press - Na volta para a casa, ainda sem ônibus, passageiros também recorreu ao transporte alternativo
Minervino Júnior/CB/D.A.Press - Nas primeiras horas da manhã, algumas pessoas chegaram a ir até as paradas, na tentativa de conseguir um ônibus
Pedro Marra/CB/D.A. Press - Auxiliar administrativo Arthur Felipe Sales, não foi ao trabalho por falta de ônibus

Sem ônibus, dia foi caótico

No dia em que o transporte do DF parou, ônibus piratas e transporte clandestino feito por carros de passeio e vans lucraram não só pelo transporte de passageiros, mas, principalmente, com a cobrança de até duas vezes o preço da passagem. O trânsito ficou caótico e muita gente chegou atrasada ou nem sequer conseguiu chegar ao local de trabalho.

Há quem precisou literalmente suar para chegar ao serviço, como é o caso da auxiliar de limpeza Maria Regina da Silva, 48 anos, que trabalha em Taguatinga Norte. Ela conta que precisou andar a pé de casa até a estação do metrô de Ceilândia Centro, de onde andou novamente, por cerca de 10 minutos, para chegar ao serviço. "Até passei mal, porque (o trem) estava cheio e não costumo andar de metrô", disse.

Morador de Vicente Pires, o auxiliar administrativo Arthur Felipe Sales, 21, chegou de carro, na carona com a mãe, a um ponto de ônibus da Praça do Relógio, no centro de Taguatinga, e foi pego de surpresa com a paralisação total dos rodoviários. Por volta das 7h, ele chegou a esperar 10 minutos por um transporte coletivo, mas desistiu de pegar a condução e de ir ao serviço, na Avenida Hélio Prates. "Avisaram muito em cima da hora a greve", criticou. "Querendo ou não, eles (rodoviários) precisam do reajuste deles, mas eu também precisava chegar no meu emprego", desabafou o jovem.

Rodoviária

O transporte pirata tomou conta da Rodoviária do Plano Piloto na manhã de ontem. A técnica em enfermagem Patrícia Moreira, 24, é moradora de Taguatinga Sul e saiu às 4h40 de casa para tentar chegar às 8h em Planaltina. "Consegui pegar o metrô até o centro, me espremendo no primeiro vagão que passou", relatou. Até a estação, havia pegado um carro por aplicativo, apesar de os valores estarem mais caros. Para Planaltina, porém, optou por uma lotação clandestina, com o mesmo valor das passagens de ônibus, R$ 5,50. "Sei que não é seguro, mas vou fazer plantão e tenho paciente me esperando", comentou.

Já Edivânia Alves, 30, veio do Riacho Fundo 2 e, até a estação de metrô, conseguiu uma carona, mas o trânsito estava intenso e mais lento que em outros dias. Necessitando chegar ao trabalho às 9h, onde é auxiliar de classe, na 308 Norte, pediu um transporte por aplicativo, cujo tempo de espera era longo, devido à grande demanda de corridas. Sobre a greve, opinou: "É complicado, pois tem tempo que os rodoviários não paralisam, então imagino que, agora, seja por um motivo compreensível. Ao mesmo tempo, nós, trabalhadores que dependem dos coletivos, saímos prejudicados."

 Escolas públicas

Em nota, a Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF) disse que acompanhou o impacto da greve dos rodoviários nas aulas da rede pública e assegurou que o estudante que não compareceu às aulas de ontem terá a ausência justificada e não sofrerá nenhuma perda pedagógica. A pasta, por meio de suas unidades escolares, disponibilizará atividades indiretas.

A Secretaria acrescentou que oferta o transporte escolar de modo suplementar ao transporte público. Mensalmente, são atendidos mais de 63 mil estudantes. Entre eles, 55,8 mil são de ensino regular; 6,3 mil, de educação integral; e 1,7 mil de ensino especial. "Dessa forma, quanto aos estudantes que são atendidos pelo transporte escolar, informa-se que não houve prejuízo ao acesso às escolas nesta segunda-feira", confirmou a SEEDF.

Em publicação nas redes sociais, a Universidade de Brasília (UnB) comunicou que, em virtude da greve dos rodoviários, recomendou aos professores que não realizassem avaliações ou outras atividades obrigatórias enquanto o sistema não voltar à normalidade. A nota foi assinada pelo vice-reitor, Enrique Huelva Unternbäumen.

Repasses

2019 — R$ 585 milhões
2020 — R$ 642 milhões
2021 — R$ 189 milhões
2022 — R$ 1,4 bilhão
2023 — R$ 1,3 bilhão

Fonte: Semob