A defesa do ex-delegado-geral da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) Robson Cândido, ao anexar o pedido de revogação da prisão preventiva do cliente, argumentou que o caso não se reveste de gravidade excepcional. De acordo com a defesa, os depoimentos da ex-namorada de Robson Cândido mostram que o ex-delegado, “apesar de insistente, nunca a agrediu fisicamente ou verbalmente”.
Robson Cândido está preso desde 4 de novembro, após ser alvo de uma operação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). No documento solicitando a revisão da prisão, os advogados citam que os áudios e gravações que a vítima apresentou aos promotores contra Cândido mostram que as “conversas (entre a vítima e o delegado) sempre se deram em um tom de voz calmo e sem nenhum ato que pudesse, de alguma forma, intimidá-la ou ameaçá-la”.
“A manutenção da medida extrema não mais se justifica, sobretudo à luz do critério da proporcionalidade. A um, porque o postulante não ocupa mais nenhum cargo público que possa, de alguma forma, permitir a continuidade dos atos apontados pelo Ministério Público de rastreamento da vítima (...) Como mencionado, do que há de todo o conteúdo probatório produzido pela vítima (vídeos, gravações, áudios etc.), não há nenhuma ação agressiva por parte do postulante, a não ser, de fato, a insistência para reatar o então relacionamento", assinala o texto.
O MP foi contrário à liberdade de Robson Cândido. A manifestação dos promotores foi acolhida pelo juiz Frederico Ernesto Cardoso Maciel, do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Águas Claras, na manhã desta segunda-feira (27/11). O magistrado reforçou que há um acervo probatório que sinaliza envolver violência contra mulher cometida pelo ex-delegado-chefe e, por isso, o ex-número 1 da corporação deve permanecer preso.
MP no encalço
O MPDFT redistribuiu um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) contra Robson Cândido e outros agentes da PCDF. O caso agora é investigado pelo NCap, que mira outros possíveis crimes cometidos pelo ex-delegado geral da corporação.
A reportagem apurou que o PIC instaurado é antigo, mas foi redistribuído dentro do Ministério Público apenas na semana passada. Entre os investigados pelo NCap, estão outros integrantes da PCDF que já foram alvos do Ministério Público Federal (MPF) no âmbito de uma investigação que mirou o doleiro Fayed Antoine Traboulsi.
Há citação de que o delegado Anderson Espíndola, chefe da 4ª Delegacia de Polícia (Guará), é uma das vítimas da trama orquestrada por Cândido. Nesse procedimento do MP, não se sabe o teor dessa investigação.
O procedimento, agora conduzido pelo NCap, ocorre após o escândalo envolvendo o ex-delegado-chefe da PCDF, preso desde 4 de novembro por monitorar e perseguir uma ex-namorada. Além dele, a operação, deflagrada pelo MP no mês passado mirou o também delegado-chefe da 19ª Delegacia de Polícia (P Norte) Thiago Peralva — afastado das funções por determinação da Justiça por incluir o número de telefone da vítima em um grampo ilegal, a pedido do chefe.
Violência
No boletim de ocorrência que provocou a exoneração de Robson Cândido do cargo, a vítima contou que se relacionava com o então delegado-geral da PCDF, mas quando decidiu se separar, ele ameaçava prejudicá-la no trabalho — ele era uma pessoa influente dentro da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô-DF), tendo sido ele quem conseguiu o emprego para ela. O caso foi revelado com detalhes pelo Correio e pela TV Brasília.
A vítima ainda contou aos delegados plantonistas que estava bastante abalada com o histórico de perseguição sofrida. No formulário de avaliação de risco, ela preencheu os campos onde já sofreu violências físicas, como apertos no braço, além de ter sido forçada a ter relações sexuais contra sua vontade com o ex-delegado chefe. A jovem também sinalizou que teria sido proibida de visitar os familiares ou amigos, além de comportamentos de ciúme excessivo cometidos pelo ex-delegado da PCDF. Ela também contou aos delegados que Cândido faz uso de bebida alcoólica e medicamentos, além de ter relatado que as agressões começaram a se intensificar quando ela já não demonstrava sentimento por Cândido.
Ocorre que, antes de registrar esse boletim, a vítima chegou a procurar a 27ª Delegacia de Polícia (Recanto das Emas), em 29 de setembro, para registrar B.O contra o ex-diretor da corporação. Nesse caso, a vítima afirmou aos promotores que foi surpreendida por Cândido na unidade policial.
A jovem relatou que compareceu à delegacia decidida a formalizar ocorrência contra Cândido, mas que o encontrou no local. Aos promotores, ela explicou que o então chefe da PCDF gritou e tentou agarrá-la à força. A partir daquele momento, ela passou a suspeitar que estava sendo monitorada em tempo real, especialmente porque sempre encontrava Cândido pelas ruas de Águas Claras.
Denúncia
Cândido responderá por uma série de crimes cometidos contra a ex-namorada, como stalking (perseguição); violência psicológica; descumprimento de medida protetiva de urgência; interceptação telefônica ilegal; peculato, por três vezes; corrupção passiva; e violação de sigilo funcional. Já o delegado Thiago Peralva, afastado da 19ª DP e que cumpre medidas cautelares, como o uso de tornozeleira eletrônica, é réu por stalking, corrupção passiva e interceptação telemática ilegal.
De acordo com a vítima, ao MP, nos primeiros meses do namoro, Cândido solicitava frequentemente que ela conectasse o WhatsApp dela no celular dele, para que ele pudesse ter acesso a mensagens. O delegado aposentado chegou a presentear a vítima com um "celular espião" para ter acesso à localização da vítima em tempo real.
Para os promotores, a partir de 26 de setembro até a operação deflagrada, a participação do delegado ajudante de Cândido na trama corroborou para que Peralva tenha sido denunciado por stalking, isso porque prestou auxílio material e moral a Robson, ao compartilhar com ele dados da localização da vítima.
Os investigadores acusam Peralva de incluir o telefone da ex-namorada do chefe em uma interceptação telefônica em curso na 2ª Vara de Entorpecentes que apurava tráfico de drogas — ato que prosseguiu mesmo após Cândido ter deixado o cargo máximo da corporação. Todo o ato ocorreu em um sistema interno da PCDF chamado de "Vigia", o que levou o nome da operação.
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