O Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT) redistribuiu um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) contra o ex-delegado-chefe Robson Cândido e outros agentes da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). O caso, agora, é investigado pelo Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial (NCap), que mira outros possíveis crimes cometidos pelo ex-número 1 da corporação.
O Correio apurou que o PIC instaurado é antigo, mas foi redistribuído dentro do Ministério Público apenas nesta semana. Entre os investigados pelo NCap, estão outros integrantes da PCDF que já foram alvos do Ministério Público Federal (MPF) no âmbito de uma investigação que mirou o doleiro Fayed Antoine Traboulsi.
Há citação de que o delegado Anderson Espíndola, chefe da 4ª Delegacia de Polícia (Guará), é uma das vítimas da trama orquestrada por Cândido. Nesse procedimento do MP, não se sabe o teor dessa investigação.
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O procedimento, agora conduzido pelo NCap, ocorre após o escândalo envolvendo o ex-diretor geral da PCDF, preso desde 4 de novembro por monitorar e perseguir uma ex-namorada. Além dele, a operação, deflagrada pelo MP no mês passado, mirou o também delegado-chefe da 19ª Delegacia de Polícia (P Norte) Thiago Peralva — afastado das funções por determinação da Justiça por incluir o número de telefone da vítima em um grampo ilegal, a pedido do chefe.
Crimes
Antes de ser procurada pelo MP para relatar aos promotores os crimes cometidos por Robson Cândido, a ex-namorada, que manteve relacionamento com ele de janeiro de 2022 a abril deste ano, buscou o governador Ibaneis Rocha (MDB) para relatar o que vinha sofrendo nas mãos do então chefe da PCDF. A informação consta no pedido de prisão formulado pelo MP contra o delegado, aposentado em meio ao escândalo.
Em 28 de agosto, a vítima trocou mensagens por WhatsApp com Ibaneis. Na conversa, explicou que estava sendo perseguida pelo então titular da corporação. "Ele me persegue utilizando viaturas descaracterizadas, já tentou abrir a porta do meu carro no meio do trânsito, utiliza celulares corporativos da PCDF e de outros delegados para me mandar inúmeras mensagens (...) Ele ameaça tirar meu emprego, me coage, pega no meu braço com força e já me deu empurrões", escreveu a vítima ao chefe do Executivo local. "Minha integridade física está em risco com o que ele está fazendo e a única pessoa que ele respeita é você", completou a jovem.
Em resposta, o governador a orientou a procurar a delegacia. Ao Correio, Ibaneis confirmou a história de que a vítima o procurou. No processo, a vítima diz que, naquele mesmo dia, Cândido parou com as perseguições diretas, mas que ele tentou contato algumas vezes por ligações de número oculto.
Na denúncia do MP apresentada contra Cândido, elencando sete crimes cometidos pelo então delegado-chefe, mostra que, a partir do mês de agosto, o então número 1 da corporação começou a perseguir a vítima pelo trânsito, usando viaturas descaracterizadas, principalmente nas ruas de Águas Claras. O ex-diretor geral da PCDF também utilizou indevidamente um sistema do Departamento de Rodagem (DER-DF) e Departamento de Trânsito (Detran-DF) para monitorar a vítima.
Violência
No boletim de ocorrência que provocou a exoneração de Robson Cândido do cargo, a vítima contou que se relacionava com o então delegado-geral, mas que quando decidiu se separar, ele ameaçava prejudicá-la no trabalho — ele era uma pessoa influente dentro da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô-DF), tendo sido ele quem conseguiu o emprego para ela. O caso foi revelado pelo Correio e pela TV Brasília.
A vítima ainda contou aos delegados plantonistas que estava bastante abalada com o histórico de perseguição sofrido. No formulário de avaliação de risco, ela preencheu os campos onde já sofreu violências físicas, como apertos no braço, além de ter sido forçada a fazer relações sexuais contra sua vontade com o ex-delegado-chefe. A jovem também sinalizou que teria sido proibida de visitar os familiares ou amigos, além de comportamentos de ciúme excessivo cometidos pelo ex-número 1 da PCDF. Ela também contou aos delegados que Cândido faz uso de bebida alcoólica e medicamentos, além de ter relatado que as agressões começaram a se intensificar quando ela já não demonstrava sentimento por Cândido.
Ocorre que, antes de registrar esse boletim, a vítima chegou a procurar a 27ª Delegacia de Polícia (Recanto das Emas), em 29 de setembro, para registrar B.O contra o ex-diretor da corporação. Nesse caso, a vítima afirmou aos promotores que foi surpreendida por Cândido na delegacia.
A jovem relatou que compareceu à delegacia decidida a formalizar ocorrência contra Cândido, mas que o encontrou no local. Aos promotores, ela explicou que o então chefe da PCDF gritou e tentou agarrá-la à força. A partir desse momento, ela passou a suspeitar que estava sendo monitorada em tempo real. Especialmente porque sempre encontrava Cândido pelas ruas de Águas Claras.
Denúncia
Cândido responderá por uma série de crimes cometidos contra a ex-namorada, como stalking (perseguição); violência psicológica; descumprimento de medida protetiva de urgência; interceptação telefônica ilegal; peculato, por três vezes; corrupção passiva; e violação de sigilo funcional. Já o delegado Thiago Peralva, afastado da 19ª DP e que cumpre medidas cautelares, como o uso de tornozeleira eletrônica, é réu por stalking, corrupção passiva e interceptação telemática ilegal.
De acordo com a vítima, ao MP, nos primeiros meses do namoro, Cândido solicitava frequentemente para que ela conectasse o WhatsApp dela no celular dele, para que ele pudesse ter acesso a mensagens. O delegado aposentado chegou a presentear a vítima com um "celular espião" para ter acesso à localização da vítima em tempo real.
Para os promotores, a partir de 26 de setembro até a operação deflagrada, a participação do delegado ajudante de Cândido na trama corroborou para que Peralva tenha sido denunciado por stalking, isso porque prestou auxílio material e moral a Robson, ao compartilhar com ele dados da localização da vítima.
Os investigadores acusam Peralva de incluir o telefone da ex-namorada do chefe em uma interceptação telefônica em curso na 2ª Vara de Entorpecentes que apurava tráfico de drogas — ato que prosseguiu mesmo após Cândido ter deixado o cargo máximo da corporação. Todo o ato ocorreu em um sistema interno da PCDF chamado de "Vigia", o que levou o nome da operação.
Medidas
Como forma de sanções aplicadas à Cândido e Peralva, o MP pediu a cassação da aposentadoria do ex-delegado-geral e a perda da função pública do ex-chefe da 19ª DP. Os promotores ainda solicitaram que seja fixado o valor mínimo de R$ 50 mil para reparação dos danos sofridos pelos acusados, considerando, também, prejuízos materiais e emocionais causados à vítima.
A aposentadoria de Robson Cândido foi homologada em edição do Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) de 17 de outubro — 15 dias após a solicitação.
A reportagem procurou a defesa dos dois réus, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.
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