Segurança pública

Sensação de insegurança aumenta nas áreas rurais do Distrito Federal

Moradores e comerciantes reclamam do pouco policiamento e demora para atendimento de chamados. PM registrou 5,1 mil casos entre janeiro e setembro, 36% a mais do que no mesmo período de 2022

Gerente de uma distribuidora de bebidas em Brazlândia, Gabriela Alves, 21, presencia brigas e assaltos perto da loja -  (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Gerente de uma distribuidora de bebidas em Brazlândia, Gabriela Alves, 21, presencia brigas e assaltos perto da loja - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
postado em 25/11/2023 06:00

A insegurança nas zonas rurais do Distrito Federal aumentou nos últimos dois anos, segundo relatos de comerciantes e produtores rurais ouvidos pela reportagem. As histórias contadas ao Correio acompanham os dados da Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF), que registrou quase 34% mais prisões de maiores de 18 anos de janeiro a outubro de 2023 em comparação ao mesmo período do ano passado. O salto foi de 269 para 371 detenções. De acordo com a SSP-DF, o Batalhão Rural da Polícia Militar registrou 5,1 mil atendimentos, entre janeiro e setembro deste ano, número 36% superior ao computado nos primeiros nove meses de 2022, quando a corporação atendeu a 3,7 mil chamados.

A maior parte das ocorrências neste ano foi em Brazlândia (1,3 mil). Em seguida, Gama (1,1 mil), Ceilândia (981), Planaltina (639) e São Sebastião (538), conforme a PMDF. Segundo a SSP, os crimes de violência doméstica, ameaça e vias de fato apresentaram queda (veja quadro). Mas isso não minimiza o receio dos moradores. A reportagem percorreu o Núcleo Rural Alexandre Gusmão, em Brazlândia, localidade com o maior número de ocorrências.

Violência doméstica vem em primeiro, com 257 casos de janeiro a setembro deste ano. A sensação de falta de proteção é comum na região, onde Gabriela Alves, 21 anos, trabalha como gerente de uma distribuidora de bebidas. "Na frente da loja, sempre tem briga, assaltos à noite no ponto de ônibus próximo. Tenho receio de ficar sozinha porque aparecem muitos homens, e nunca nos sentimos 100% bem, porque, aqui na região, tem muito disso, de mulheres serem agredidas", conta.

As estatísticas da SSP confirmam o relato de Gabriela. Em segundo lugar, vem o crime de ameaça, com 173 casos. Logo depois, aparecem as vias de fato, 114. Apesar de a Secretaria de Segurança Pública afirmar que os crimes têm diminuído devido ao policiamento ostensivo, a comerciante cita a carência desse serviço na zona rural de Brazlândia. "Quase não fazem ronda aqui, somente de manhã cedo. Uma vez por semana já é muito. A gente tem grade e câmera, mas isso não intimida ninguém. Uma hora temos que sair, até porque vendemos gás e precisamos abrir o portão para entregar", lamenta Gabriela.

Segundo Cristian Glays, 33, balconista de uma loja de produtos agropecuários no Núcleo Rural Alexandre Gusmão, os crimes de furtos e roubos também ocorrem com frequência na região. No ano passado, bandidos entraram pelo telhado da outra unidade da loja, em Brazlândia, e levaram produtos do estabelecimento. "Também roubaram o carro de um funcionário e queimaram o veículo (em uma área de mato)", lembra. Cristian reclama da falta de agilidade da PMDF para atender os chamados. "Deveriam vir mais, porque eles só vêm quando ligamos. E demoram até 40 minutos para chegar", critica o balconista.

Na região com mais casos notificados, o produtor rural Sandro de Souza Silva, 37, relata que sofreu furtos de bomba de alta pressão e de alimentos da horta dele, onde cultiva tomate, morango e pimentão. "O tomate estava com um preço alto e entraram aqui na minha chácara para furtar", assinala. Neste ano, Sandro diz que viu motociclistas com atitude suspeita rondando as chácaras na hora do almoço, quando ele e os demais chacareiros costumam levar os filhos para a escola. "A gente informou a PM, porque é perigoso, e não sabemos quem é. Aqui tem pouca segurança. Vemos polícia uma vez no mês", conta.

O produtor rural mora com os filhos David Luiz, 4, Maria Heloísa, 12, e com a esposa Regina Célia Teixeira, 43, que está grávida de oito meses de Benjamim. A mãe das crianças afirma que os roubos ocorrem normalmente no início da tarde, quando os donos de chácaras vão almoçar e descansar. "Tem alguns casos em que arrombaram a porteira de vizinhos e levaram muitos pertences. Hoje em dia, ficamos preocupados, tanto que ninguém vai para o ponto de ônibus porque houve casos de adolescentes roubando celular das crianças", ressalta.

  • Cristian Glays, balconista, diz que PM leva 40 minutos para atender chamados
    Cristian Glays, balconista, diz que PM leva 40 minutos para atender chamados Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • O produtor rural Sandro Silva e a esposa Regina Teixeira foram vítimas de furto
    O produtor rural Sandro Silva e a esposa Regina Teixeira foram vítimas de furto Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • Cândido Pereira da Silva, 75, e a espoa Antônia Rodrigues da Silva, 67, sofreram furto na chácara onde moram, no Núcleo Rural Alexandre Gusmão
    Cândido Pereira da Silva, 75, e a espoa Antônia Rodrigues da Silva, 67, sofreram furto na chácara onde moram, no Núcleo Rural Alexandre Gusmão Marcelo Ferreira/CB/D.A Press

Efetivo

Em relação ao efetivo policial do Batalhão Rural da PMDF, a equipe é composta por 196 policiais militares. Desses, há 10 oficiais e 186 praças. Na avaliação do presidente da Associação Rural Gabriela Monteiro (Argam), Charles Costa, essa quantidade não é suficiente para atender ocorrências em tempo hábil no Núcleo Rural Alexandre Gusmão, onde há 7 mil moradores distribuídos em 22 chácaras. "A insegurança é muito grande, porque, às vezes, saem para comprar alguma coisa, voltam, e se deparam com furtos", comenta o morador da região.

Charles acredita que o efetivo insuficiente de policiais somado às rondas ostensivas que não dão conta das ocorrências dificulta o combate aos crimes na região. "Podia ter mais investimento no efetivo de policiais militares. Existe o Projeto Guardião Rural, em que colocam placa nas chácaras, mas tem um monitoramento que perde a sua característica por não acompanhar com rapidez. Até viaturas vindas de outras regiões chegarem aqui, o fato já ocorreu. A nossa ideia era de colocar um posto de saúde e policial na entrada da cidade. Mas como colocar se não há um efetivo grande?", questiona.

Os aposentados Cândido Pereira da Silva, 75, e Antônia Rodrigues da Silva, 67, estão entre os moradores que já sofreram com a falta de rondas frequentes no Núcleo Rural Alexandre Gusmão. Há cinco anos, houve uma invasão. Os bandidos levaram roupas, bujão de gás, panela de pressão e uma TV de 52 polegadas, da qual eles ainda não tinham começado a pagar as prestações. "A televisão estava no valor de R$ 3 mil. A gente pagou sem usar", lamenta Cândido.

O casal registrou boletim de ocorrência na Polícia Civil (PCDF), mas a investigação não deu em nada. "É muito complicado, porque os bandidos cometem crimes mais durante o dia do que à noite. Viram que a gente saiu para viajar e, quando chegamos, detectamos o furto. Seria bom fazerem uma ronda para melhorar a sensação de segurança para a gente", pede Antônia.

Mais comunicação

Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Cássio Thyone avalia que a zona rural propicia um isolamento para os moradores, o que facilita crimes patrimoniais. Mas ele pondera que esses cidadãos têm formas mais fáceis de comunicação com a PM. "As pessoas teriam um pouco mais de dificuldade relacionada a esse pronto atendimento se não houvesse os telefones celulares. Esses mecanismos têm colaborado para reduzir o que chamamos de subnotificação dos crimes", analisa.

Apesar desse apoio da tecnologia, Cássio cita que é preciso ter planejamento por parte do policiamento, com patrulhamento aliado ao trabalho de inteligência da corporação. "Se percebe o aumento de uma ocorrência, há como aumentar a ronda naqueles determinados locais, com presença ostensiva no lugar e na hora certos. Sendo assim, cria-se um ambiente em que as pessoas se sentem mais seguras porque estão percebendo a presença da polícia", conclui o especialista em segurança pública.

Atendimento

A SSP-DF informa que o Batalhão Rural da PMDF registrou 5,1 mil atendimentos de ocorrências, entre janeiro e setembro deste ano, quantidade 36% maior do que em relação aos nove meses de 2022, quando foram atendidos 3,7 mil chamados para coibir crimes. Quando acionada, a Polícia Militar atua por meio do Batalhão de Policiamento Rural.

A corporação conta com o Projeto Guardião Rural, criado em 2018 para monitorar propriedades localizadas nas áreas de campo. Entre os menores de idade apreendidos pelo Batalhão Rural da PMDF, houve alta de 3 para 11 jovens de janeiro a outubro de 2023 em comparação com o mesmo período do ano passado.

Em nota, a Polícia Militar explica que o projeto é uma parceria com os moradores e produtores rurais. As áreas monitoradas são identificadas por meio de placas, que fazem uma advertência visual informando que a PM está em constante patrulhamento naquele local e que responderá prontamente a qualquer solicitação.

Além desse reforço, segundo a PM, os donos de imóveis são incluídos em grupos no WhatsApp. Com as informações de cada propriedade, inclusive a localização georreferenciada, há uma maior agilidade no atendimento de emergências. A PMDF acrescenta que o Batalhão Rural é estruturado em três unidades, localizadas em Planaltina, Ceilândia e Gama, e a corporação também conta com o Batalhão da Polícia Militar Ambiental (BPMA).

Estatísticas

Crimes (janeiro a setembro)

Violência doméstica
2023: 257 casos
2022: 268 casos

Ameaça
2023: 173
2022: 199

Vias de fato
2023: 114
2022: 131

Ocorrências por região

Brazlândia - 1,3 mil
Gama - 1,1 mil
Ceilândia - 981
Planaltina - 639
São Sebastião - 538

Efetivo do Batalhão Rural da PMDF

196 policiais militares
10 oficiais
186 praças

Canais de denúncia

Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)

Disque 190

Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF)

Denúncia on-line: www.pcdf.df.gov.br/servicos/197

E-mail: denuncia197@pcdf.df.gov.br

Telefone: 197, opção 0 (zero)

WhatsApp: (61) 98626-1197

 

 

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