Nos últimos dois anos a quantidade de multas aplicadas no Distrito Federal aumentou. Somente entre janeiro e agosto deste ano, os órgãos de trânsito do DF emitiram 2.042.898 notificações, ou 8.512 por dia, numa frota em torno de quase 2 milhões de veículos. O ano nem terminou e a média diária supera em 22,14% à do ano passado, quando houve 6.969 multas diárias. No entanto, o número de motoristas com a carteira suspensa ou cassada pelo excesso de infração de trânsito caiu drasticamente, o que, na avaliação de especialistas, estimula o sentimento de impunidade e, consequentemente, faz crescer o desrespeito às leis de trânsito.
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Empresário do ramo de confecções, Paulo (nome fictício), 63 anos, diz ter mais de 100 pontos acumulados no prontuário de habilitação. As principais multas são por excesso de velocidade e dirigir falando ao celular. “É inevitável. Tenho muita coisa para resolver o dia todo. Acabo me distraindo e, quando vejo, já passei a 70km/h onde só é permitido dirigir a 60km/h, por exemplo”, relata. Perguntado se não tem medo de ter a carteira nacional de habilitação (CNH) apreendida ou cassada, a resposta é certeira. “Dirijo há mais de 40 anos, sempre levo multa e isso nunca aconteceu. Para dizer a verdade, essa não é uma preocupação minha”.
A pedido do Correio, o Detran informou o número de carteiras de motoristas suspensas e cassadas desde 2019 — apesar do alto número de infrações aplicadas àqueles que desrespeitam as normas de trânsito, apenas 13 condutores tiveram a CNH cassada em 2022, menor número da série histórica pedida pela reportagem. Para se ter uma ideia do cenário, em 2019, 69 motoristas perderam o direito de dirigir por dois anos. Em 2021, foram 506. Também foi neste ano o recorde de condutores com a CNH suspensa: 5.135.
Na Diretoria de Controle de Veículos e Condutores do Departamento de Trânsito do DF (Detran-DF) existem atualmente 50 mil processos esperando para serem analisados para um quadro de apenas 35 servidores. O volume de demanda e pouca mão de obra é uma das razões apontadas pelo diretor do setor, Hugo Fernando Figueiredo Santos, para a demora da punição mais efetiva.
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Pandemia
Além disso, ele explica que, após a pandemia, muitos brasilienses optaram pelo transporte individual de passageiros (para evitar aglomeração), transporte compartilhado ou carros por aplicativos. Isso fez com que aumentasse a quantidade de veículos nas ruas e, consequentemente, o número de infrações. “Desde janeiro, também, uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) permite aos órgãos de trânsito fazer a fiscalização por videomonitoramento. Isso tornou a nossa fiscalização mais eficaz”, cita Hugo.
Ele reconhece que o tempo decorrido entre a notificação e a punição está longe de ser o ideal. Mas justifica também que isso se deve, em parte, aos prazos legais de recursos que vão de seis meses a dois anos, se todos eles forem analisados rigorosamente dentro do prazo legal. Perguntando se há previsão de aumento de servidores para dar vazão à quantidade de processos pendentes, Hugo diz que houve um concurso público, mas ainda depende de homologação e que não há previsão de quando isso acontecerá. “Enquanto isso, damos ênfase à análise de processos de alcoolemia e outras infrações graves”.
Impunidade
O advogado Tiago Romano, avalia que a demora em aplicar a punição faz crescer o sentimento de impunidade no condutor. “A multa não é a principal punição. É só uma delas. Muitos cidadãos acham que pagou, está resolvido, e não está”, alerta Tiago, que é presidente da Comissão de Trânsito de Águas Claras, Riacho Fundo, Recanto das Emas e Samambaia, tesoureiro do Instituto Brasileiro do Direito no Trânsito.
Romano ressalta que, por lei, os órgãos de trânsito têm até cinco anos para abrir o processo de suspensão ou cassação da CNH. Prazo considerado elástico demais pelo especialista, pois a punição pode prescrever nesse período. “Teoricamente, o prazo deveria ser menor. Ao receber uma punição quatro anos depois da infração, a pessoa nem se lembra mais de tê-la cometido. E ainda gera um sentimento de injustiça e a pergunta ‘mas por que tanto tempo depois?’”, cita.
Mauro (nome fictício) tem 47 anos e é representante comercial, com atuação no DF e em municípios de Goiás. Ele relata que passou a ser multado com mais frequência há três anos, depois que passou a viajar pelo Entorno. “Ali, na região de Valparaíso e Luziânia, pela BR-040, você está a 60km/h e, de repente, tem um radar de 40km/h. Toda vez que vou para lá, sou multado. Quando vejo estou em cima do pardal e não consigo frear”, conta.
O representante comercial diz que, só este ano, pagou R$ 2 mil em multas relativas também ao ano passado, que estavam pendentes. “Cheguei a acumular mais de 70 pontos, com certeza. Torço para que não aconteça (a suspensão ou cassação do direito de dirigir). Por que, das duas uma: ou vou dirigir sem o documento e pagar para ver, ou perco o meu emprego”, afirma. Mas especialistas aconselham Mauro a respeitar o limite de velocidade, não usar o celular enquanto estiver dirigindo, respeitar o sinal indicado pelo semáforo, entre outra medidas para o bom motorista.
Texto de Adriana Bernardes
Você sabia?
Suspensão do direito de dirigir ocorrerá sempre que o infrator atingir, no período de 12 meses, a seguinte contagem de pontos:
a) 20 pontos, caso constem duas ou mais infrações gravíssimas na pontuação;
b) 30 pontos, caso conste uma infração gravíssima na pontuação;
c) 40 pontos, caso não conste nenhuma infração gravíssima na pontuação;
Por transgressão às normas estabelecidas neste Código, cujas infrações preveem, de forma específica, a penalidade de suspensão do direito de dirigir.
O período de suspensão da CNH varia de seis meses a dois anos.
Cassação do direito de dirigir
Acontece quando, suspenso o direito de dirigir, o infrator conduzir qualquer veículo;
No caso de reincidência, no prazo de 1 ano, de infrações como entregar a direção a pessoas sem CNH; dirigir sob influência de álcool ou outra substância psicoativa; disputar corrida sem autorização, entre outras.
Quando condenado judicialmente por delito de trânsito
Quanto custam as multas?
Dirigir embriagado: R$ 2.934,70
(Em caso de reincidência em até um ano, o valor sobe para R$ 5.869,40)
Uso de celular ao volante: R$ 293,47
Dirigir acima da velocidade (entre 20% e 50%): R$ 195,23
Dirigir no acostamento da via: R$ 880,41
Transitar sem o cinto de segurança: R$ 195,23