Favela no centro

Valores da favela são divulgados em evento na capital do país

Expo Favela 2023 traz para o Sesi Lab as soluções, inovações e vitórias da periferia do Brasil, numa programação variada

O valor da favela ocupa o centro de Brasília e, consequentemente, do Brasil este fim de semana. Artistas, artesãos e empreendedores participam do Expo Favela Innovation Brasília 2023, evento que objetiva apresentar a importância de soluções encontradas por moradores de favelas de todo o país que se destacam constantemente. A feira, que tem continuidade hoje, está montada no Sesi Lab e tem entrada gratuita.

Em espaços internos e externos do Sesi Lab foram montados estandes, dois palcos, uma praça de alimentação e um camelódromo para que fossem realizadas trocas entre o público, os palestrantes, os expositores e os empreendedores que fazem parte da exposição. O evento conta com debates e shows e faz um tour pelo que há de mais atual na cultura das favelas, sem abrir mão das raízes da periferia.

Entre os convidados estão nomes como o rapper e ativista MV Bill; o rapper Japão, do grupo Viela17; Preto Zezé, presidente global da Cufa; a cantora Bell Lins e a dramaturga Christiane Sobral; entre outros. A intenção é apresentar uma visão global da favela e provocar diálogos entre perspectivas diferentes de periferias diferentes, assim como mudar, também, a o entendimento sobre o que a favela produz. "Mesmo com tudo dando errado, com poucos motivos para acreditar, esse lugares possuem uma produção cultural e de empreendedorismos muito fortes", afirma MV Bill em entrevista ao Correio. "A Expo Favela é uma oportunidade muito grande para a sociedade. Para o pessoalentender que a favela não é apenas produtora de conteúdo ruim e violento, que isso é o mais mostrado desses locais por conta do abandono do Estado", completa.

Ousadia e poder

O rapper aponta coragem e importância na iniciativa. "A Expo Favela é muito feliz e assertiva quando junta toda a potência destes lugares e a traz para um ponto que não fica dentro de uma única favela. É preciso destacar a ousadia e o poder de pegar a lanterna e colocar luz para as coisas que estão sendo feitas nesses lugares", avalia.

A ideia, desde o princípio, é que o evento conecte pessoas de lugares diferentes para que todos aprendam juntos, de mãos dadas. "Trata-se de uma via de mão dupla. Quem está empreendendo está no mercado e pode ensinar muito, mas quem está fazendo como pode, sem muita informação e recursos, também tem o que transmitir. Aqui é um ambiente de troca onde ambos aprendem juntos", conta Bruno Kesseler, presidente da  Central Única das Favelas no Distrito Federal (Cufa/DF), que mostra um outro olhar sobre o trabalho dentro das favelas.

"Grande parte dos moradores de favela hoje são empreendedores, muitos não por escolha, mas pela falta delas. Mesmo com o termo empreendedorismo sendo pouco utilizado, alguns chamam de 'corre', outros de 'bico', mas no final é a mesma coisa", analisa.'

Segundo Kesseler, outro ponto relevante da iniciativa é a possibilidade de mostrar todo esse valor das margens para o centro". "A gente tem a oportunidade de ocupar esse espaço com um público que muitas vezes não teria a oportunidade nem o ímpeto de vir até aqui", pontua.

"Os museus, em geral, são frequentados pela elite. Para a gente enfrentar esse desafio de democratizar o acesso ao conhecimento, nós buscamos a Cufa para uma parceria bem ampla. A realização da Expo Favela aqui só inaugura esse processo", pontua Cândida Oliveira, gerente de Desenvolvimento Institucional do Sesi Lab. ela lembra que, conforme estudos do próprio espaço, os maiores frequentadores do local são do Plano Piloto e, por isso, é tão importante a iniciativa. "Muito além de compartilhar com eles o conhecimento que a gente tem e a experiência que a gente oferece, temos muito a aprender com essas comunidades", exalta. "Ficamos muito felizes de ver o museu ocupado por pessoas que são muito potentes. A realização de um evento desses aqui é extremamente relevante", complementa.

Vencedores do cotidiano

No painel de abertura, ontem, uma criança chamada Joaquim pediu o microfone para fazer uma pergunta para MV Bill. "Como você se sente sendo um vencedor na vida?", questionou Joaquim. Essa pergunta fez com que o rapper convidasse a criança para o palco e falasse que ela era vencedora só de perguntar, mas também ditou o que parece ser a mensagem do evento. "As próprias crianças já são vencedoras só de terem pensamentos futuristas, é uma coisa que eu não pude ser e não via `a minha volta na minha época", afirma MV Bill.

Khalil Santos/CB/D.A Press - MV Bill e o menino Joaquim no palco do Expo Favela conversam sobre o futuro

A tônica do evento é poder se enxergar olhando para cima, exaltar as conquistas da favela. "É uma farsa pensar que a periferia, a quebrada, é um espaço só de carência, violência, tiro e escassez. Isso não é verdade. Existe muito potencial na quebrada", destaca Meimei Bastos, poetisa, atriz e arte-educadora. Ela foi convidada para o evento, entre outros motivos, para falar sobre o lançamento do livro A menina que bebeu água de chocalho. "Eventos como esse ajudam a quebrar o estereótipo negativo", elogia.

Só de estar entre pessoas que parecem com ela, Meimei relata que já sente que há algo de muito positivo na Expo Favela. "É emocionante. Me sentir vencedora é estar aqui em um evento no centro, em que eu não me sinto desconfortável, que eu posso transitar tranquila, sem a preocupação dos olhos me avistando, tudo isso é muito bom. Meu corpo é comum porque estou entre os meus", diz. "Ver corpos tão parecidos com o meu transitando aqui hoje, é vencer", acrescenta.

Esses corpos que Meimei cita são de moradores de cidades como Ceilândia, Sol Nascente e Cidade Ocidental, entre outras do DF. Mas também são o de MV Bill, Preto Zezé e tantos outros que ali subiram ao palco ou expuseram nos estandes. E tudo chega a Joaquim, um representante dessa novíssima geração que já nasce acreditando que há como vencer. "Quero continuar fazendo coisas que me levem para as escolas, feiras literárias, a ter contato com a juventude. Para isso tenho sempre que prestar atenção no Joaquim, qualquer coisa que eu fizer preciso lembrar do Joaquim, saber para quem estou falando e servindo de espelho", clama MV Bill.

Correio está lá

Ed Alves/CB/DA.Press - Estande montado no evento pelo Correio Braziliense

Para quem estiver de passagem pela Expo Favela Innovation Brasília 2023, um estande especial é o do Correio. Fotos e matérias relembram momentos e pessoas das periferias do DF ao longo dos anos da Capital

 

Khalil Santos/CB/D.A Press - MV Bill e o menino Joaquim no palco do Expo Favela conversam sobre o futuro
Ed Alves/CB/DA.Press - Estande montado no evento pelo Correio Braziliense

O Correio está lá!

Para quem estiver de passagem pela Expo Favela Innovation Brasília 2023, um estande especial é o do Correio. Fotos e matérias relembram momentos e pessoas das periferias do DF ao longo dos anos da Capital