Há alguns adjetivos recorrentes quando os amigos de Dad Squarisi se aventuram em descrevê-la. Generosa, leal, altiva, inteligente, sábia, séria e cordial aparecem com frequência. Mas é a combinação de todos eles que denuncia a teia bem amarrada de amizades que Dad soube construir. Amizades de 15, 20, 30, 40 anos são fruto de relações preciosas e amadurecidas, mas a professora era também uma educadora de humanidade, se é que essa disciplina pode ser ensinada, e até os afetos mais recentes sabiam muito bem disso.
Hematologista do hospital DF Star, no qual Dad esteve internada no último mês, Gustavo Bettarello é praticamente um recém-chegado nessa turma de amigos. Ele acompanhou a jornalista durante os últimos sete anos. Nesse tempo, a paciente virou amiga. O médico teve filhos e as crianças cresceram habituadas à leitura dos livros de Dad, sempre autografados. "Por onde andava, exalava alegria. Eu nunca a vi com uma cara triste, desanimada, sempre foi uma pessoa muito altiva, muito boa, e fazia bem para todo mundo estar ao lado dela. Toda vez que eu estava do lado dela, mesmo responsável pelo tratamento, sempre acabava aprendendo alguma coisa. Era inspirador", conta o médico, que acompanhou os últimos momentos de Dad. "Ela estava pronta. Ela falou para mim: 'Dr. Gustavo, fiz tudo na minha vida, não tenho arrependimento, por onde passei fiz amigos'. Ela falava que estava pronta, não temia a morte, não estava desesperada e estava tranquila. Em nenhum momento se mostrou angustiada, sempre confiante."
A morte da amiga abriu uma lacuna sem precedentes, destaca a procuradora aposentada Abadia Alves, 63 anos, amiga de Dad há 30 anos. Ao Correio, ela contou, bastante emocionada, que esteve ao lado da amiga nos últimos instantes de vida. Durante toda a manhã desta quinta-feira, esteve com ela no hospital. "Ao lado de Dad, passei os melhores anos e vivi os mais intensos momentos, como nossas inúmeras viagens, nossas histórias e tantas lembranças de um convívio feliz e único. Até na partida ela foi elegante, como sempre. Nestes últimos dias, despedia-se de cada amigo que chegava dizendo: 'há momentos em que precisamos dar boas-vindas também à morte, com muita fé e resiliência'. Ela nos transmitia leveza, serenidade e sabedoria", diz Abadia.
Sentindo um grande vazio pela perda da amiga, com quem conviveu por 15 anos, a economista Josie Melo Fontes, 53, lembra que foi num domingo, quando voltavam de um almoço, que Dad lhe disse que, no dia seguinte, iria ao dentista e, a partir daí, soube da doença. Desde então, a amiga e vizinha compartilhou com ela todos os momentos em relação ao tratamento, e afirma que nunca viu Dad perder o equilíbrio ao longo dos últimos sete anos. "Minha amiga era a pessoa mais fina e elegante que conheci e tive o privilégio de conviver. Culta, ímpar, irretocável e com uma afabilidade sem igual. Sua partida me dói, mas tudo que vivi ao lado não pode se tornar menor neste momento de tanta dor".
A psicóloga Wanir Aida Braga, 73, também manteve uma amizade de 15 anos com Dad Squarisi e lamenta muito essa perda. "Sou grata por ter aprendido tanto com a Dad, uma referência em sabedoria, inteligência e caridade, que não fazia diferenciações entre pessoas e nem classes sociais. Soube aproveitar todas as oportunidades que a vida lhe ofertou, assim como enfrentou todos os desafios com maestria", destaca.
Íris Borges, uma das idealizadoras da Flipiri e coordenadora da Feira do Livro de Brasília por 20 anos, lembra que conheceu Dad nos encontros de literatura promovidos por Maria da Conceição Moreira Salles. Foi há mais de 20 anos, e ali nasceu uma amizade que nunca arrefeceu. "Ela era muito generosa. Nunca reteve para si o que sabia. Só queria compartilhar. E tinha a maneira como ela lidava com as pessoas. O poder de síntese dela era magnífico, essa ideia de menos é mais", conta Íris. "Era uma professora para nós, tinha um vasto domínio da língua e era muito dedicada. Totalmente dedicada à causa da língua. E com uma sabedoria que é maior que o conhecimento. A gente bebia na fonte. É uma perda irreparável para nós; e no meu caso, perdi uma amiga, mais que uma professora."
A escritora Margarida Patriota lembra que Dad militou numa área fundamental para a completude humana. "Ela batalhou numa área da divulgação da norma culta, que não é só uma questão de elitismo, é entender o que é singular e plural, passado e presente, entender a importância da linguagem como um instrumento do pensar. Não há pensamento sem linguagem", aponta a autora de Elas por elas. Para ela, Dad era capaz de divulgar a escrita ao conseguir colocar essas lições em relação ao noticiário do dia a dia, sempre com alguma graça que tornasse o ensinamento mais palatável. "O legado dela ficará. Ela ajudou muita gente a passar no vestibular, e quem for atrás dos ensinamentos dela vai continuar sendo bem sucedido", garante.
A também escritora Rosângela Vieira Rocha teve Dad como chefe nos anos 1980 e, mais tarde, foi indicada por ela para ocupar o mesmo cargo. "O que eu sinto não é só gratidão por aquele momento, ela era uma das pessoas mais corretas. Ela é uma autoridade da língua portuguesa, muito mais do que uma professora, uma grande amiga. Ela era o tipo de pessoa que, nos piores momentos, as pessoas buscavam por ela. Dad não era o tipo de chefe autoritária, ela buscava colaboração, ela ajudava e queria trabalhar", conta.
O cineasta Vladimir Carvalho, viúvo da professora Lucília Garcez, uma dedicada amiga de Dad, lembra que foram mais de 40 anos de convivência, que vai fazer falta. "Dad deixa ensinamentos e um conhecimento que está à mão para ser sempre consultado. É um lugar comum, mas a perda dela deixa uma lacuna educacional e cultural que é impossível de ser suprida", diz. Ele conta que Dad e Lucília eram colegas de estudos da UnB e formavam praticamente uma irmandade. "Ambas batalharam contra os problemas de saúde.
E, anteriormente, encontravam-se muito no plano dos clubes de leitura. Elas tinham uma linha direta, consultavam-se, quando surgia algum problema relacionado à língua. Existia muita solidariedade. Lucilia ficava bastante preocupada a cada hospitalização da Dad, porque a comunicação era dificultada", lembra Vladimir.
O velório de Dad será nesta sexta-feira (11/8), das 15h às 17h, no Cemitério do Campo da Esperança.
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