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Bancada do DF mantém foco na preservação do Fundo Constitucional

Líderes partidários se reúnem para definir votações prioritárias na Câmara dos Deputados. Ministério da Fazenda defende a inclusão do fundo no arcabouço fiscal, mas deputados do DF tentam manter os recursos da capital do país

A semana de retomada das atividades na Câmara dos Deputados, após o fim do recesso parlamentar, começou agitada. Líderes partidários se preparam para uma reunião, nesta terça-feira (1°/8), ao meio-dia, com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Na ocasião, serão definidas as prioridades a serem colocadas em votação no plenário. Enquanto isso, o Ministério da Fazenda se posicionou favorável à inclusão do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) no teto de gastos instituído pelo arcabouço fiscal, o que poderia gerar sérios prejuízos à capital do país. A bancada de deputados federais do DF segue em defesa da manutenção do texto aprovado no Senado, onde ficou determinada a retirada do FCDF do arcabouço fiscal.

Até o momento, o posicionamento do governo federal com relação ao Fundo Constitucional havia sido externado pelo ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que garantiu à deputada brasiliense Érika Kokay (PT) o apoio à retirada do FCDF do teto de gastos. No entanto, na última semana, o Ministério da Fazenda se mostrou favorável à reinclusão do FCDF no arcabouço. A alteração foi inserida inicialmente no texto do arcabouço pelo relator, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), mas foi derrubada no Senado Federal. Atualmente, o FCDF é corrigido anualmente pela variação da Receita Corrente Líquida (RCL) da União. Em seu relatório inicial, aprovado na Câmara, Cajado pretendia corrigir o repasse a partir de 2025 de acordo com a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e ganho real da despesa primária do Poder Executivo, limitado a 2,5%.

Para o cientista político André Pereira César, é preciso sincronia entre Câmara e governo federal para se chegar a um ponto de entendimento com relação ao arcabouço fiscal. "É uma negociação econômica, mas também política. A matéria é complexa. O DF não é São Paulo, nem Bahia nem Minas Gerais. O DF não é estado, é um ente federativo que depende do governo, da União. Há outras maneiras de acertar as contas. Se o Fundo Constitucional do DF for mesmo incluído no teto de gastos, seria preciso repensar o papel do DF na Federação", analisou o especialista. "O Distrito Federal precisaria ter menos responsabilidades, já que o crescimento do valor do repasse da União diminuiria significativamente", acrescentou.

Apesar da indefinição quanto ao posicionamento oficial do governo federal sobre o FCDF, o governador Ibaneis Rocha (MDB) defende a luta da bancada para que a situação seja resolvida na Câmara dos Deputados. "Vamos trabalhar para manter o texto do Senado", afirmou o emedebista.

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A deputada Érika Kokay reagiu aos posicionamentos de representantes do governo com relação ao Fundo Constitucional do DF. "O DF não é um estado. Nenhum estado sedia os Três Poderes, as embaixadas ou os órgãos da administração federal. Essas são atribuições de Brasília e de mais ninguém. O segundo equívoco é o de achar que Brasília pode ser considerada cidade-dormitório dos integrantes da República. Brasília é a capital do Brasil e deve ser tratada como tal. Na maior parte dos países, a União contribui para o financiamento da sua capital e aqui não deve ser diferente", declarou a petista.

Bia Kicis (PL) também reagiu aos questionamentos com relação às peculiaridades do DF. "Tem que tratar todo mundo igual? Mas o DF não é igual aos estados da Federação. O DF é a capital da República. A segurança de todas as pessoas, de todos os estados, inclusive autoridades nacionais e estrangeiras, é atribuição do DF e é paga pelo fundo constitucional. Há mais de 20 anos é assim. Não há estudos que embasem essa mudança (no cálculo do FCDF)", ponderou Bia.

O deputado Reginaldo Veras (PV) lembrou que Brasília também abriga mais de 100 embaixadas. "Como capital federal, Brasília tem custo extra para garantir a segurança do governo federal e de todas as representações diplomáticas", pontuou Veras.

Minervino Júnior/CB/D.A.Press - Políticos e a bancada do DF seguem em defesa da manutenção do FCDF

Para o deputado Paulo Fernando (Republicanos), a unidade da bancada do DF será importante no processo de convencimento dos demais parlamentares na votação que define o futuro do Fundo Constitucional do DF. "Achar que o DF é igual os outros estados é ter uma visão distorcida do papel e da relevância da capital de todos os brasileiros. Provavelmente, o arcabouço fiscal entrará na pauta semana que vem. Enquanto isso, a bancada do DF permanece unida. Estamos trabalhando para que aqueles (parlamentares) que não votaram na primeira votação na Câmara, entendam a importância do FCDF não só para a nossa população, mas principalmente para todo Brasil", disse.

Fred Linhares (Republicanos) reforça que o FCDF é uma verba da União destinada a áreas importantes para a sociedade. "Somos uma cidade de trabalhadores, onde pessoas saem diariamente de suas casas em busca de segurança, educação e saúde. É preciso olhar para além dos órgãos públicos sediados aqui. Estamos limitados em termos de oportunidades, quando se trata de indústria e agronegócio. E com essas limitações, o cenário só tende a piorar. Brasília merece ter mais investimentos e desenvolvimento. Precisamos oferecer melhores condições aos brasileiros que aqui vivem e trabalham arduamente todos os dias. É urgente garantir segurança, educação e saúde adequadas", destacou.

Próximos passos

Após a reunião de líderes desta terça-feira (1º/8), os deputados terão uma ideia de quando será colocado em pauta no plenário da Câmara o Projeto de Lei Complementar (PLP) 93/2023, que institui o arcabouço fiscal e determina o que entra e o que sai do teto de gastos. O destino do Fundo Constitucional depende desta votação.

Na primeira vez que o projeto foi apreciado pelos deputados federais, em maio, 160 parlamentares votaram a favor da retirada do FCDF do teto de gastos, 316 contrários. O número não foi suficiente e o fundo foi mantido no arcabouço. A situação foi revertida no Senado, e agora a Câmara precisa endossar a mudança. A bancada do DF e representantes do Governo do Distrito Federal (GDF) trabalharam nos bastidores e alterou o posicionamento de alguns partidos que, desta vez, orientarão os deputados que votem a favor da manutenção do FCDF fora do arcabouço fiscal. O Correio apurou que cinco partidos fecharam questão ou proferiram orientação aos deputados para votarem favoravelmente ao fundo: PL, PSD, PSDB, PT e Republicanos. Somadas, as bancadas totalizam 262 dos 513 deputados. Se a previsão se concretizar, o FCDF estará salvo.

Se a Câmara votar para colocar novamente o FCDF dentro do teto de gastos, ainda há a possibilidade regimental de veto por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

É preciso olhar com cuidado para o DF

Por Murilo Viana, economista especialista em contas públicas

É fato que, para o governo federal, quanto maior as despesas da União, maior a dificuldade de cumprir as metas fiscais. O mercado capta uma expectativa de déficit na casa de 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB), o que representa um montante de cerca de R$ 100 bilhões para o próximo ano. O novo arcabouço fiscal, por sua vez, define como meta zerar o déficit primário já no ano que vem. É fato que deixar o FCDF com a regra atual dificulta o cumprimento da regra fiscal, e é esse o olhar do ministro da Fazenda (Fernando Haddad).

O valor do FCDF é definido anualmente com base no valor transferido do ano anterior corrigido pela taxa de crescimento da Receita Corrente Líquida (RCL) da União. A RCL é, grosso modo, equivalente à receita corrente total da União deduzindo-se valores de transferências constitucionais e legais a estados e municípios. A RCL é o dinheiro que de fato fica com a União e tende a evoluir com base no crescimento econômico, na dinâmica das commodities (petróleo, minérios e grãos) e mesmo com a inflação. Se o fundo for incluído no teto de gastos, ele será corrigido, a partir de 2025, de acordo com a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e terá um limite de crescimento de 2,5%. A evolução do recurso teria perda de tração, com crescimento anual bem menor à tendência histórica. Como efeito, o DF teria perdas significativas em médio e longo prazo. O FCDF continuaria crescendo, mas a inclinação da taxa de crescimento diminuiria drasticamente.

A questão do Distrito Federal é bem particular. Existe uma altíssima dependência do DF com relação à União, o que mostra a importância do Fundo Constitucional. O DF não é um município nem um estado. As peculiaridades deste ente federativo o transformam em um misto de União, estado e município. De acordo com o último Censo, o DF conta com uma taxa de crescimento populacional significativa. Além disso, tem a questão do entorno.

Quando tratamos de uma alta dependência de transferência, como é o caso do DF com relação ao Fundo Constitucional, é preciso olhar com cuidado. Mudanças na dinâmica dessa receita podem ter um efeito expressivo sobre a prestação de serviço público e financiamento das políticas públicas de saúde, educação e segurança pública. É uma questão sensível.

Em uma região onde a população está crescendo significativamente, e uma má calibração do FCDF pode resultar em estrangulamento da prestação de serviços públicos pressionados já pela dinâmica populacional do do DF e do entorno. O DF não possui base industrial considerável, nem agronegócio expressivo. A economia do DF é baseada em serviços. Além disso, no DF está a capital do país, que abriga os Três Poderes, as embaixadas e três milhões de pessoas.

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